Coesão, Economia, Pescas ou Habitação. Em que pastas pode Portugal brilhar mais na Comissão?

Apesar dos rumores, Montenegro tem conseguido manter segredo do nome que será proposto para integrar o colégio de comissários. Além da identidade, resta saber para que pasta será proposto.

Em que pastas pode Portugal brilhar mais na Comissão?

Habitação, Oceanos e Pescas, Economia ou Coesão. Estes são alguns dos pelouros na próxima Comissão Europeia para os quais Portugal poderá estar melhor posicionado para ter um comissário na liderança. O nome ainda não é conhecido. Luís Montenegro e o seu núcleo têm feito questão de não abrir o jogo, deixado até perto do último dia do prazo (30 de junho) definido pela presidente da Comissão Europeia para dar a conhecer um candidato. Um e não dois, tal como von der Leyen pediu.

À semelhança dos restantes Estados-membros, Portugal também deverá ignorar parte do pedido von der Leyen de apresentar uma dupla, reservando apenas a possibilidade de sugerir uma mulher para a corrida em nome da paridade. Mas não é certo que o fará.

Há cinco anos, António Costa cedeu ao pedido de Bruxelas e sugeriu Elisa Ferreira para gerir a pasta da Coesão ao invés da primeira sugestão, Pedro Marques, dado que a líder alemã desejava presidir um colégio paritário. Cumprida uma vez essa promessa, não é líquido que Montenegro queira fazer novamente essa vontade, embora isso possa trazer mais vantagens.

As hipóteses de haver uma candidata portuguesa que tenha boas chances de ter um bom pelouro são maiores face ao desequilíbrio de género na Comissão”, admite Paulo Sande, especialista em assuntos europeus e ex-conselheiro do Presidente da República ao ECO.

Ao gabinete de Ursula von der Leyen, em Berlaymont, já chegaram cerca de 20 nomes que se juntam ao de Kaja Kallas, indicada pela Estónia para a chefe da diplomacia. Deste grupo, três deles são apenas de mulheres — Jessika Roswall da Suécia; Henna Virkkunen da Finlândia e Dubravka Šuica da Croácia — longe da paridade praticamente total alcançada no último mandato.

Este claro desequilíbrio não preocupa, para já, Bruxelas que nas últimas conferências de imprensa tem reservado detalhes sobre o processo negocial que tem sido levado a cabo entre a presidente da Comissão e os 27, assegurando que o processo decorre com normalidade.

Certo é que a indicação dos países não é meramente suficiente para assegurar uma pasta no executivo. Depois de indicados pelos Estados-membros, serão entrevistados por von der Leyen e caso recebam luz ‘verde’ da alemã, segue-se um processo de audições exigente no Parlamento Europeu que deverá ocorrer entre setembro e outubro. Só depois do crivo dos eurodeputados é que a próxima Comissão Europeia é votada em bloco, estando previsto que entre em plenas funções a 1 de novembro.

Qual será o nome português e para que pasta será indicado?

Economia e Finanças

O atual cenário poderá dar a Montenegro mais margem para negociar uma pasta de maior peso. Desde logo, uma económico-financeira que aos olhos do eurodeputado do PS Pedro Marques ganhará “um peso brutal no próximo ciclo” uma vez que será a primeira vez que serão implementadas as novas regras orçamentais, aprovadas na legislatura anterior.

“Estas novas regras dão ainda mais importância à avaliação que deve de ser feita pela Comissão Europeia àquilo que são as trajetórias de sustentabilidade das dívidas públicas dos Estados-Membros. As regras deixaram de ser tão cegas. O comissário para a economia vai ser muito importante”, considera o ex-ministro das Infraestruturas.

Nesta matéria, o nome que tem sido mais falado é o de Maria Luís Albuquerque. A antiga ministra das Finanças do Governo já tinha sido proposta, em 2014, por Pedro Passos Coelho para integrar o colégio de comissários. A sugestão agradou o presidente do executivo comunitário da altura, Jean Claude Juncker. Mas sem uma garantia de um compromisso concreto do luxemburguês quanto ao cargo específico que seria dado a Portugal, Passos recuou e propôs Carlos Moedas que acabou por presidir a pasta da Investigação, Ciência e Inovação.

Além de ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque foi Secretária de Estado do Tesouro e Finanças (2011- 2012) e Secretária de Estado do Tesouro (2012-2013). Nestas funções, seguiu os assuntos do Eurogrupo e do Ecofin substituindo o então Ministro de Estado e das Finanças.Paula Nunes / ECO

Antes de ter sido ministra das Finanças, Albuquerque foi Secretária de Estado do Tesouro e Finanças, acompanhando de perto os assuntos do Eurogrupo e do Ecofin. Agora, a antiga governante volta a estar na calha, podendo as suas competências mais técnicas ter utilidade em Bruxelas na próxima legislatura, sobretudo considerando que von der Leyen pretende concretizar a união de mercado de capitais, tema há vários anos à espera de ser concretizado.

Porém, com António Costa na presidência do Conselho Europeu, mandato que começará a 1 de dezembro, a margem negocial de Portugal fica reduzida, não sendo provável que ao candidato português lhe seja atribuída uma pasta com um pelouro com tanta visibilidade. Afinal de contas, um dos critérios para a escolha de um candidato é o equilíbrio geográfico, político e de género.

Pedro Marques não partilha da mesma opinião, argumentando que “não existe um jogo de equilíbrios entre a validação de pastas e outros cargos”, sobretudo o da presidência do Conselho Europeu que representa outra instituição. Para o eurodeputado, a decisão está “dependente da capacidade de influência do Governo”, mas sobretudo “do perfil do candidato” e das necessidades da futura Comissão.

Ainda assim, o facto de Maria Luís Albuquerque ser das poucas mulheres na lista de candidatos à Comissão Europeia poderá agradar a líder do executivo comunitário que poderá com isso recompensar Portugal, conferindo-lhe uma maior visibilidade política face aos seus pares.

“Se Portugal apresentar uma mulher com esse perfil, podemos sair beneficiados e as hipóteses de termos um bom pelouro aumentam. Von der Leyen pode com isto querer dar um sinal forte aos [Estados-membros] que não cumpriram o pedido que fez”, aponta Paulo Sande.

Oceanos, Pescas e Mar

Durante a campanha eleitoral para as eleições europeias (e para a sua reeleição enquanto presidente da Comissão Europeia), Ursula von der Leyen passou por Portugal para anunciar que pretende na próxima legislatura ter um comissário dedicado à pasta das pescas.

No próximo mandato, terei um comissário só dedicado às pescas para nos certificarmos que estas permanecem um meio sustentável para as gerações futuras”, anunciou a alemã ao lado de Luís Montenegro, num comício no Porto, em junho.

Não é claro que aquando do anúncio, que von der Leyen estivesse a pensar num português para o cargo, certo é que o tema voltou a marcar a agenda durante o encontro entre os membros do Partido Popular Europeu (PPE), em Cascais, no qual esteve presente Ursula von der Leyen.

Mais do que um sinal, o anúncio de Von der Leyen pode ser entendido como um convite para Portugal”, considera o politólogo José Filipe Pinto. “É uma pasta que nos diz muito dada a nossa extensão marítima e temos pessoas com competências”, aponta o professor catedrático de Relações Internacionais pela Universidade Lusófona.

Aliás, de acordo com o presidente da Tiago Pitta e Cunha, a intenção da líder do executivo ter um comissário somente dedicado às pescas resulta de um esforço levado a cabo pela Fundação Oceano Azul e do think tank Europe Jacques Delors que, em julho, apresentaram um manifesto com o objetivo de transformar a indústria dos oceanos na Europa. A iniciativa foi apoiada por 29 personalidades antigos comissários e governantes.

“Deste manifesto, nasceu um pacto que foi defendido pela própria Ursula von der Leyen nas linhas políticas que apresentou no seu discurso de eleição para a presidente. A pasta para as Pescas foi ‘cozinhada’ aqui em Portugal na reunião do PPE”, explica o presidente da fundação ao ECO.

Para o responsável, “um comissário só de pescas é altamente reducionista”, e por isso defende que a pasta tenha “uma visão holística, integrada e abrangente” e que olhe não só para a atividade económica das pescas, mas que combine a sustentabilidade económica, ambiental e social numa só.

Assim, segundo Pitta e Cunha, a ideia será criar uma pasta multidisciplinar que junte as pescas, enquanto atividade económica, à gestão ambiental dos oceanos e do mar. Neste cenário, um nome português poderia ser o mais indicado entre os restantes 27 Estados-membros. Afinal de contas, Portugal conta com um espaço marítimo de cerca de quatro milhões de quilómetros quadrados, conferindo-nos o estatuto de maior Estado costeiro da UE e também um dos maiores do mundo, segundo a Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM).

Neste cenário, nomes como o de Assunção Cristas, antiga Ministra da Agricultura, Mar, Manuel Pinto de Abreu, antigo secretário de Estado do Mar e eventualmente Tiago Pitta e Cunha são apontados para o cargo. Mas partindo do princípio que Montenegro quererá cair nas boas graças da presidente alemã, propondo uma mulher para a Comissão, a governante do CDS-PP e ministra do Governo de Passos Coelho passa a ter maiores chances de chegar a comissária das Pescas, ainda que tenha pouca visibilidade e influência política a nível europeu.

“Foi igual com Carlos Moedas, também não tinha reconhecimento a nível europeu e no final acabou por tê-lo por causa do trabalho que fez”, avalia o politólogo.

Assunção Cristas em entrevista ao ECO - 02SET19
Jurista e docente, com uma carreira académica em áreas ligadas à economia do Mar, Assunção Cristas foi Ministra da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território (2011-2013) e Ministra da Agricultura e do Mar (2011 e 2015).Hugo Amaral/ECO

Coesão

Também não se exclui que Luís Montenegro recorra à opção mais fácil e proponha um nome que procure dar continuidade ao mandato de Elisa Ferreira enquanto comissária para a Coesão e Reformas.

Para um país como nós, que tem sido liderante nas políticas de defesa da Coesão, [esta pasta] é absolutamente prioritária”, considera Pedro Marques, recordando que estará em cima da mesa nos próximos cinco anos a programação de um novo quadro comunitário que poderá, “porventura, já ter inscritas verbas relacionadas com o alargamento”.

Neste caso, o nome de Miguel Poiares Maduro, antigo ministro do Desenvolvimento Regional de Portugal ganha força. Afinal de contas, o governante foi responsável pela execução dos fundos europeus durante o seu mandato e tem experiência política a nível europeu. No entanto, além do facto de ser homem – algo que colocaria Portugal em desvantagem face às exigências de von der Leyen para uma Comissão paritária – o ECO sabe que o próprio não estará a considerar o cargo.

Ministro adjunto e do Desenvolvimento Regional (2013 – 2015), Miguel Poiares Maduro ficou responsável pela execução de fundos comunitários durante o seu mandato. Entre 2003 e 2009 foi Advogado Geral no Tribunal Europeu de Justiça no Luxemburgo.PAULA NUNES / ECO

Habitação

Em 2023, António Costa, ainda primeiro-ministro, enviou para Von der Leyen uma carta na qual pedia ajuda à Comissão Europeia para ajudar a resolver a crise da habitação.

“A falta de oferta imobiliária é um problema em muitas cidades, e os encargos com habitação têm vindo a subir, ocupando já um espaço muito significativo no rendimento mensal das famílias europeias”, escreveu, na altura, o governante. Por isso, “a Comissão Europeia deve estar atenta ao problema da escassez e dos altos custos da habitação”, pedia o primeiro-ministro.

Um ano depois, os europeus foram chamados às urnas e da esquerda à direita o tema marcou a campanha eleitoral. A Aliança Democrática também fez do tema uma das suas bandeiras, chegando mesmo a defender a inscrição do direito à habitação na Carta dos Direitos Fundamentais, no seu programa para as eleições europeias de junho.

Os apelos foram ouvidos. No discurso que proferiu no Parlamento Europeu, antes da sua reeleição, Von der Leyen afirmou que a habitação seria uma questão prioritária para a próxima Comissão. Assim, prometeu nomear o primeiro comissário para gerir diretamente este portefólio e apresentar um plano para aumentar o investimento público e privado na construção de casas em todo o bloco, agilizando também uma revisão das regras dos auxílios estatais uma vez que os Estados-membros podem recorrer de fundos públicos para a construção de habitação social.

Para um país como Portugal, a habitação pode ser interessante, ainda que a União Europeia não tenha competências próprias porque a questão da habitação depende das políticas de cada país“, explica Paulo Sande. “Esta pasta estará focada em desenvolver de políticas de incentivo e desenvolvimento de projetos”, simplifica.

Pedro Marques partilha da mesma opinião, vincando que “o anterior Governo deu muita importância à área da habitação”. “Se o novo [Executivo] tiver essa prioridade, pode lutar por essa possibilidade”, acrescenta o europutado, vincando que embora a pasta “não tenha competências específicas, nem significativas, para já, podem ser construídas dado o grande consenso europeu na área da habitação”.

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