“O comércio livre foi sempre o driver da economia mundial”

  • ECO
  • 24 Outubro 2024

Paulo Portas identificou os principais riscos para a economia e deixou um recado aos partidos: o orçamento “é um teste de algodão ao nosso sentido de responsabilidade”.

“O mundo está perigoso”, começou por dizer Paulo Portas, lembrando palavras de um amigo para logo de seguida explicar algumas das razões que justificam o receio. “Nos últimos cinco anos tivemos, basicamente, de navegar no imprevisto. E o imprevisível pode prevalecer”, afirmou o antigo vice-primeiro-ministro esta quarta-feira durante a conferência Mapear o Futuro, organizada pela Allianz Trade com o ECO como media partner.

Depois de uma pandemia, seguida da invasão da Ucrânia, o disparo da inflação e, mais recentemente, o adensar do conflito no médio oriente, Paulo Portas não tem dúvidas de que o melhor conselho que se pode deixar aos empresários é que a instabilidade é uma de poucas certezas que podem ter. Mas esta experiência coletiva desde 2020 deve também ensinar a todos – e, em particular, ao ocidente – que há lições a reter. Uma delas, diz o analista político, é que a Europa está a ficar para trás no que à inovação diz respeito e é preciso agir para inverter a tendência.

Antigo vice-primeiro-ministro Paulo PortasHugo Amaral/ECO

“O alerta vermelho devia ter soado em Bruxelas, em 2016, quando a China ultrapassou, em investimento público e privado, a Europa em aposta na inovação e na investigação e desenvolvimento (I&D)”, critica. Os números confirmam o retrato: o bloco EUA investe 3,5% do PIB em I&D, o Japão 3,3% e a China 2,4%, enquanto a União Europeia (UE) não vai além dos 2,2%.

"Se olharem para as dez maiores companhias de internet do mundo, o surpreendente é não haver nenhuma europeia”

Paulo Portas, antigo vice-primeiro-ministro

“Se olharem para as dez maiores companhias de internet do mundo, o surpreendente é não haver nenhuma europeia”, lamenta Paulo Portas, que pede mais colaboração entre empresas e academia para potenciar a inovação na Europa. O antigo político lamentou ainda as tendências protecionistas que têm tomado conta da economia mundial, que considera perigosas para o crescimento das regiões, e lembrou que “o comércio livre foi sempre o driver da economia mundial”.

Se a nível internacional importa ter em consideração os resultados das eleições presidenciais norte-americanas do próximo dia 5 de novembro, a excessiva dependência do ocidente face à Ásia nas cadeias de abastecimento ou o advento da inteligência artificial, Portas não esqueceu a realidade nacional. “Portugal e Espanha estão a crescer acima da média da Zona Euro”, assinalou, justificando com o peso do turismo, a crescente entrada de investimento estrangeiro, o mix energético sustentável e com a bazuca europeia.

“Não se esqueçam que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) é uma oportunidade única. Ou se executa ou se perde o dinheiro”, disse. Portas considera “grave” a inexistência de um orçamento aprovado e diz que, a acontecer, pode “matar um ano de PRR”. “Diria que é um teste de algodão ao nosso sentido de responsabilidade numa democracia que é hoje fragmentada em todo o lado”, apontou.

Mundo em suspenso à espera dos EUA

Nem otimistas, nem pessimistas. Assim são as previsões económicas da Allianz Trade para este ano e para o próximo, como apresentadas no evento por Ana Boata, responsável de pesquisa económica da seguradora. “O ano de 2025 poderá ser um bocadinho melhor se conseguirmos passar esta incerteza causada pelas eleições dos EUA, ou seja, se não tivermos Trump [eleito]”, perspetivou, lembrando que, independentemente de quem vença, o congresso norte-americano “está dividido e será difícil aplicar o programa” de governo.

Para as previsões, foi considerado um cenário que tem em conta os atuais conflitos geopolíticos em curso (nomeadamente na Ucrânia e no Médio Oriente) e as tensões entre a China e Taiwan, mas em que Donald Trump não vence as presidenciais. “O futuro será complicado para a Europa nos próximos dois, três anos”, aponta, explicando que a situação política na Alemanha e o elevado défice de França, que corre o risco de ficar acima de 6% em 2024.

Portugal deverá manter a trajetória de crescimento modesto, mas acima da média europeia

Apesar de tudo, há boas notícias para as empresas. Desde logo porque Ana Boata antecipa “um ciclo de reposição de bens duráveis”, com particular incidência na Europa durante este ano e o próximo, que tenderá a favorecer negócios ligados aos produtos mais procurados. Há, ainda, boas notícias ao nível da inflação, que continua a descer a par das taxas de juro. Um dos riscos no horizonte prende-se precisamente com a eventual vitória de Trump nos EUA, que pode significar “o aumento das tarifas para 10%”, que “significará maior inflação nos EUA e maiores taxas de juro”.

Portugal deverá manter a trajetória de crescimento modesto, mas acima da média europeia – a Allianz Trade aponta para uma subida de 1,6% este ano – e cenário igualmente positivo nas exportações, cujo principal mercado continuará a ser Espanha. “Há uma previsão de moderação do risco de não pagamento nos principais mercados de exportação de Portugal”, acrescenta Ana Boata.

Segurança nas vendas externas

A conferência Mapear o Futuro contou ainda com um painel de debate moderado por Francisco Botelho, diretor do ECOseguros, em que participaram Carla Martins (CFO da Rangel), Nuno Pires (presidente da Comissão Executiva da Ferpinta), António Isidoro (presidente da Comissão Executiva do Grupo Soja) e Miguel Couto (administrador-executivo da Viagens Abreu).

Perante um mundo em permanente instabilidade, os oradores identificaram as maiores ameaças para os seus negócios: os conflitos geopolíticos em curso, a possibilidade do crescimento do protecionismo nos EUA e na Europa, e a falta de mão-de-obra, atenuada apenas pela onda de imigração dos últimos anos.

Em comum, estas empresas têm a experiência de expandirem os seus negócios para o palco internacional, muito competitivo e com riscos que nem sempre é fácil suportar. “A Allianz tem-nos ajudado a perceber quais são os níveis de crédito que devemos atribuir e quais são os clientes em que devemos apostar mais”, afirmou Carla Martins. António Isidoro não tem dúvidas de que “o seguro de crédito é importantíssimo enquanto ferramenta de gestão”, especialmente quando se tem relações com países onde a transparência financeira não é a melhor.

Nuno Pires diz mesmo que a Ferpinta “não vende sem cobertura de risco e sem a informação que vamos trocando diariamente com a Allianz”. Para Carla Martins, os serviços prestados pela seguradora são mesmo essenciais para o dia a dia da empresa de logística, de tal forma que “é como se a Allianz fosse Rangel na tomada de decisão”.

A conferência organizada esta quarta-feira pela Allianz Trade – a marca que veio substituir a COSEC em junho deste ano – é “o início de uma série de eventos” que a companhia quer ter com os seus clientes e parceiros “em formatos diversos”, explica Nadine Accaoui. A CEO da seguradora em Portugal acredita que a sua missão é “partilhar mais informação para melhor navegarem neste mundo em constante mudança”. Este foi apenas o primeiro de muitos momentos que se seguirão, assegura.

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