Longa lista de tarefas da Agência para o Clima preocupa setor
O setor questiona a capacidade que a nova Agência para o Clima terá para responder às 39 atribuições que lhe foram conferidas, assim como a capacidade de coordenação com outras entidades.
A extensa lista de atribuições da Agência para o Clima, em conjugação com a necessidade de um número de trabalhadores adequado para levar a cabo os objetivos desta agência, assim como a coordenação da mesma com outros organismos são temas que geram algum ceticismo junto dos setores da energia e ambiente.
A nova entidade surge “para dar resposta aos objetivos mais ambiciosos em matéria de ação climática e para assegurar uma maior capacidade de resposta” aos objetivos inscritos no Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) e à Lei de Bases do Clima, lê-se no decreto-lei que cria a Agência para o Clima, e que foi publicado a 31 de dezembro em Diário da República.
No diploma são enumeradas 39 atribuições que estarão nas mãos desta agência, que vão desde a ação climática à gestão do Mercado Voluntário de Carbono, passando pela economia azul. Na esfera desta agência vão juntar-se pelo menos sete fundos diferentes, entre eles o Fundo Ambiental, o Fundo Azul e o Fundo da Transição Justa (consultar tabela abaixo). A ideia é trabalhar os fundos numa “lógica transversal e multissetorial, pelo que deverá haver estreita articulação com outras instituições”, lê-se ainda no decreto.
“A criação da Agência para o Clima é, sem dúvida, um passo significativo e positivo no reforço da ação climática em Portugal”, entende o CEO da Voltalia em Portugal, João Amaral. O gestor aplaude a abordagem integrada, a qual acredita facilitar o acesso a fundos europeus e melhorar a eficácia das políticas públicas, através de uma melhor coordenação.
No entanto, os restantes representantes do setor mostram-se menos otimistas quanto à conjugação do papel das várias agências. “Não se percebe com que competências e condições é que as entidades existentes vão desempenhar as suas funções e como vão coordenar com a ApC”, considera o ex-secretário de Estado da Energia, e atual consultor da área, João Galamba.
“É essencial clarificar a relação desta nova entidade com os organismos existentes”, defende também o vice-presidente da Marubeni em Portugal e CEO da holding Energy Means Life, Célio Pinto, apontando que é importante que não se acrescente mais um nível de decisão e não seja fonte de “burocracia desnecessária”.
João Amaral vê também como um “desafio significativo” evitar sobreposições de competências com organismos já existentes, como a Agência Portuguesa do Ambiente ou a Direção-Geral de Energia e Geologia.
Depois de o ex-ministro do Ambiente ao qual João Galamba respondeu, João Matos Fernandes, ter criado o Fundo Ambiental, concentrando no Ministério do Ambiente a capacidade financeira para sustentar as respetivas políticas, Galamba vê como uma “derrota” e uma “perda de autonomia” esta consolidação com outros fundos, a qual implica o envolvimento dos ministérios das Finanças e da Economia.
O papel do ministério das Finanças também merece dúvidas por parte da organização ambiental Zero, que interroga na voz do presidente Francisco Ferreira se este será “um elemento facilitador ou um elemento que, com um controlo maior, vai tornar estes apoios menos expeditos”.
Lista de afazeres “assusta”
Olhando às responsabilidades da agência e capacidade de as executar, “é com alguma apreensão que vejo a criação de uma nova estrutura, quando a estrutura existente não foi capacitada”, afirma João Galamba. O mesmo acredita que, antes de ser criada uma nova estrutura, deveriam ser repensadas aquelas já existentes, como a Agência Portuguesa do Ambiente, a Direção-Geral de Energia e Geologia e a Adene – Agência para a Energia.
“Estamos realmente um pouco céticos com esta mega agência. Porque mesmo que tenha várias dezenas de pessoas, aquilo que a agência tem de fazer vai muito para além do clima. É um conjunto de competências absolutamente brutal. E a transição para esta nova estrutura vai ser um desafio”, afirma Francisco Ferreira, presidente da Zero, a quem a abrangência da agência “aterroriza” em termos de operacionalidade. Apesar do reforço que está previsto no número de pessoas, o largo número de atribuições pode significar que se mantêm problemas de execução, entende.
A Agência para o Clima já terá os dirigentes escolhidos, afirmou a ministra do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, numa audição Parlamentar no final de janeiro. Falta apenas anunciar os nomes publicamente. Quanto aos trabalhadores, serão destacados 49 funcionários da Agência Portuguesa do Ambiente e entre 70 a 80 da secretaria-geral do Ambiente. No total, contar-se-ão entre 120 a 130 trabalhadores. O decreto-lei que dita a criação da ApC refere ainda que esta “será dotada de recursos técnicos e financeiros adequados à dimensão do desafio climático”.
O Tribunal de Contas Europeu alertou para o facto de os atrasos na execução dos PRR dos Estados-Membros poderem comprometer a plena absorção dos fundos disponíveis, destaca Célio Pinto. “A cada dia que passa, projetos não vão para a frente como programados e temos prazos. É preciso tomar decisões sobre o redirecionamento desse financiamento”, diz, por seu turno, a organização não governamental Zero.
Na opinião do gestor da Voltalia, o sucesso da nova agência estará dependente do alinhamento da ação com as metas climáticas, da composição da equipa que a irá liderar e da forma como forem geridos os fundos alocados. “Este orçamento representa uma responsabilidade significativa, pois será necessário assegurar que cada euro investido resulte em impactos mensuráveis e sustentáveis”, alerta. Em paralelo, acredita, será fundamental monitorizar e comunicar os progressos alcançados, promovendo uma relação próxima e transparente com a sociedade.
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