Partidos foram a Belém falar de estabilidade, mas revisão constitucional roubou foco mediático
Marcelo acredita ser possível, pelo menos no horizonte mais próximo, estabilidade governativa. Debate sobre alterações à Lei Fundamental ganhou tração com anúncio da IL.
Marcelo Rebelo de Sousa abriu esta semana as portas de Belém para receber a primeira ronda de conversas com os partidos com assento parlamentar sobre os resultados das eleições legislativas antecipadas de domingo, que deram a vitória à AD, uma subida vertiginosa ao Chega e uma derrota histórica ao PS. O foco dos contactos do Presidente da República foi a estabilidade da solução governativa, mas uma eventual revisão da Constituição roubou as atenções.
Na terça-feira, PSD, PS e Chega foram recebidos por Marcelo Rebelo de Sousa, que ao final do dia se mostrou confiante em estabilidade. “Vamos ter estabilidade”, disse o chefe de Estado em declarações aos jornalistas, considerando que “correu bem, qualquer das três” audiências. “Vamos ver, isto continua. Os três [PSD, PS e Chega] continuam para a semana”, vincou.
Se nesse dia Luís Montenegro saiu do encontro sem declarações aos jornalistas, esta quinta-feira, o seu parceiro de coligação, CDS-PP, foi vocal sobre a prioridade em cima da mesa: “A formação do Governo“.
“Portugal não quis instabilidade e crise política e deseja agora estabilidade e um Governo a continuar a resolver os problemas dos portugueses”, afirmou Nuno Melo em declarações aos jornalistas. O presidente dos centristas defendeu que “não há dúvida nenhuma sobre quem ganhou este campeonato” das eleições, apelando à responsabilidade da oposição para que permita ao Executivo prosseguir a implementação de um projeto “irresponsavelmente interrompido”.
O líder demissionário do PS, Pedro Nuno Santos, ainda marcou presença na reunião de terça-feira em Belém, mas a reunião foi sobretudo “de despedida“.
“Desejo que a situação política estabilize rapidamente e que o país possa fazer o seu caminho”, afirmou o socialista à saída do encontro que durou apenas 15 minutos. O Presidente da República espera agora a decisão que sairá da reunião da Comissão Política Nacional do PS no sábado para aferir as condições de governabilidade do Executivo de Luís Montenegro, sem maioria absoluta.
Numa altura em que a AD não assumiu qualquer parceiro preferencial, a “estabilidade” é promessa do líder do Chega, que reclama para si o título de líder da oposição. “O país não precisa de mais eleições, o país não quer mais eleições, o país precisa de um rumo e uma ordem. Procuraremos ser um farol de estabilidade, mas não a qualquer custo”, disse André Ventura, em declarações aos jornalistas à saída do encontro, traçando três linhas.
“A luta contra corrupção é um pilar fundamental da nossa ação política. O combate a um país de portas abertas e a uma imigração descontrolada é um pilar fundamental. E o combate à subsidiodependência que tem destruído grande parte do tecido social, atribuindo subsídios a quem não precisa deles, permitindo que algumas minorias vivam à conta de subsídios e à custa de quem trabalha são linhas que nos separam dos dois partidos principais do sistema português”, elencou.
O tema da estabilidade estendeu-se também ao segundo dia de audiências. Na quarta-feira foi a vez da Iniciativa Liberal (IL) ser recebido por Marcelo Rebelo de Sousa. O partido que durante a campanha eleitoral chegou a sinalizar terem existido contactos com a AD sobre uma eventual coligação pós-eleitoral, acabou por afastar o cenário ainda na noite de domingo, após serem conhecidos os resultados.
À saída do encontro em Belém, o líder dos liberais, Rui Rocha, revelou que não tem mantido contactos com o primeiro-ministro reeleito, Luís Montenegro, e que o partido irá viabilizar as medidas que considere adequadas, mas defendeu que é um partido responsável.

Revisão da Constituição ‘rouba’ cena
Após o encontro com o Presidente da República, Rui Rocha anunciou que o partido irá apresentar um projeto de revisão constitucional, para retirar peso ao papel do Estado na economia, tal como já fez em anteriores legislaturas. “A IL apresentará um projeto de revisão constitucional. Não é um ajuste de contas com a história, é uma oportunidade de futuro para que todos se reconheçam numa Constituição que traz mais liberdade e tem menos pendor ideológico”, afirmou o líder dos liberais aos jornalistas.
Na legislatura da maioria absoluta de António Costa, o Parlamento iniciou um processo de revisão constitucional, interrompido em novembro de 2023 após o anúncio de dissolução do Parlamento. Na ocasião, a IL apresentou uma proposta na matéria com a qual queria retirar “carga ideológica à Constituição”. Para abrir o processo de alteração à Lei Fundamental é necessário dois terços da Assembleia, algo que a direita toda junta agora tem.
O CDS-PP salientou que “quando chegar o tempo” o partido “terá uma posição que será pública, desde logo a partir do seu grupo parlamentar“, mas considerou que “é um direito dos deputados”. No entanto, Nuno Melo recordou que, em 1986, o CDS-PP foi “o único partido que votou contra a Constituição por ser marcadamente ideológica“.
O tema mereceu críticas à esquerda. “Seria muito importante que o senhor primeiro-ministro, ao ser indigitado, e que será, naturalmente, Luís Montenegro, da AD, que desse sinais de que esta legislatura não é uma legislatura para fazer uma revisão constitucional”, disse o porta-voz do Livre, Rui Tavares, em declarações aos jornalistas à saída da audiência em Belém.
“A IL disse para não estarmos com papões e hoje a IL apresentou um projeto de revisão constitucional a seguir a umas eleições extremadas. Já sabíamos que a IL gostava de motosserras, agora percebemos que gosta de mandar gasolina para o fogo com uma Assembleia da República, na qual é possível uma maioria apenas com a direita ou a extrema-direita ao contrário de outras revisões que contaram com o consenso de setores da direita e da esquerda”, argumentou.
Esta quarta-feira, embora admita que “é sempre possível melhorar o texto constitucional”, o secretário-geral do PCP defendeu que “é preciso é que a Constituição todos os dias se concretize na vida das pessoas, no trabalho, na saúde, na habitação, no direito das pessoas”.
“Precisamos de um caminho de uma alternativa deste caminho, não para alterar a Constituição, mas para que seja uma realidade na vida de cada um. Se aqueles que estão tão preocupados e empenhados em alterar a Constituição se empenhassem na sua concretização a vida da maioria dos que vivem no nosso país”, afirmou à saída da reunião com Marcelo Rebelo de Sousa, que durou mais de uma hora.
Ainda à esquerda, o Bloco de Esquerda (BE) também se mostrou contra a ideia. “Venha de um partido como a IL, que quer acabar com os serviços públicos, ou venha de um partido como o Chega, que quer acabar com liberdades individuais, parece-me que temos todos razões para preocupar, porque são as nossas liberdades coletivas e individuais que estão em risco”, disse a líder bloquista à saída do encontro em Belém.
Para Mariana Mortágua, “nenhuma outra resposta que não fechar as portas a uma revisão da Constituição, travá-la, lutar por todos os democratas por todas as pessoas que em Portugal gostam do Estado Social” existe.
O Presidente da República ainda irá receber na sexta-feira o PAN e o JPP, no rescaldo das eleições legislativas. A AD venceu com 32,1% dos votos, a que se somam mais 0,62% dos três deputados eleitos pela coligação PSD/CDS-PP/PPM nos Açores. Quando falta atribuir os quatro mandatos dos círculos da emigração, o PS é o segundo partido mais votado, com 23,38% dos votos, com 58 deputados, os mesmos que o Chega, que tem menor votação, 22,56%.
Segue-se a IL, em quarto lugar, com 5,53% dos votos e nove deputados, e o Livre, com 4,2% e seis parlamentares. A CDU, com 3,03% dos votos elegeu três deputados, enquanto o BE com 2% e o PAN com 1,36% elegeram uma deputada cada. O JPP, da Madeira, entrou no parlamento com 0,34% dos votos em termos nacionais e um parlamentar.
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