O que mudou na privatização da TAP desde a venda aprovada pelo PS
Percentagem a vender encolheu do Governo de António Costa para o de Luís Montenegro. Contas da companhia aérea deterioraram-se desde 2023.
Foi há exatamente 21 meses e 12 dias que o Governo de António Costa aprovou um decreto-lei de reprivatização da TAP, que acabaria inviabilizado por um veto presidencial e a demissão do Executivo pouco tempo depois. A venda esteve quase a avançar ainda com o Governo anterior, mas foi travada pelo chumbo da moção de confiança. Agora, está de novo prestes a sair da forja.
O ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, já veio a dizer há algumas semanas que o decreto-lei de privatização será aprovado “nas próximas semanas”, pelo que deverá estar iminente a ida do diploma a Conselho de Ministros.
Mas muito mudou nos 651 dias que decorreram desde que o ministro Fernando Medina anunciou a aprovação do decreto-lei de reprivatização, em setembro de 2023. Desde logo no modelo de venda.
O Governo socialista de maioria absoluta aprovou a venda de entre 51% e 100% do capital da companhia aérea, com 5% reservados para os trabalhadores. Desta vez, com PS e Chega a oporem-se à venda de uma posição maioritária, é já certo que a reprivatização irá abranger até 49% do capital. “Neste primeiro momento venderemos menos de 50% do capital”, referiu o ministro das Finanças esta semana em declarações à Bloomberg. O que não mudará são os 5% para quem trabalha na TAP, uma exigência da Lei das Privatizações.
A venda de uma participação minoritária permitirá manter um controlo sobre as decisões estratégicas da companhia e deverá evitar um novo veto de Belém. Em outubro de 2023, Marcelo Rebelo de Sousa devolveu o diploma ao Governo pedindo a “clarificação de três aspetos que considera essenciais: a capacidade de acompanhamento e intervenção do Estado numa empresa estratégica como a TAP; a questão da alienação ou aquisição de ativos ainda antes da privatização; a transparência de toda a operação”.
O Governo tem vindo a afirmar que a marca, a sede, as rotas estratégias e o hub no aeroporto de Lisboa terão de estar assegurados. Entre os critérios para a seleção dos candidatos que estarão vertidos no decreto-lei estará também a expansão da atividade da TAP. “Estamos a tentar encontrar um parceiro internacional que nos possa ajudar a desenvolver a empresa, aumentar as rotas, o número de aeronaves e o investimento na empresa e, depois, obviamente, a recuperar parte do dinheiro que os contribuintes puseram na companhia há quatro anos”, acrescentou o ministro das Finanças.
As contas da companhia aérea também mudaram neste período. A TAP registou um lucro de 177,3 milhões de euros em 2023, o mais elevado de sempre. Resultado que caiu substancialmente em 2024, para 53,7 milhões de euros, com as contas a serem penalizadas por perdas cambiais e provisões para os processos judiciais colocados pelos tripulantes. As novas decisões desfavoráveis à companhia podem ainda aumentar o valor a provisionar, com o principal sindicato que representa os tripulantes a referir montantes na ordem dos 300 milhões de euros.
Os últimos números divulgados, referentes ao primeiro trimestre, voltaram a ser marcados por uma deterioração do resultado líquido, com os prejuízos a aumentarem de 90 para 108 milhões de euros. Uma evolução justificada pela administração da TAP com a greve dos pilotos da Portugália e o facto de a Páscoa ter calhado este ano em abril.
A pesar nos resultados da companhia está também o forte aumento das despesas com pessoal, que quase duplicaram no espaço de dois anos devido ao fim dos cortes salariais aplicados no âmbito do plano de restruturação e à negociação de novos acordos de empresa.
Existe também a sombra do diferendo com a Azul, que reclama 177 milhões de euros à TAP SGPS de um empréstimo obrigacionista celebrado em 2016. Aquela holding, cujo nome mudou para SIAVILO, deixou de ter qualquer participação na companhia área, a TAP SA, no final de 2021, mas esta ainda poderá responder em tribunal pelas garantias prestadas no financiamento.
A transportadora portuguesa registou ainda uma redução das receitas operacionais nos primeiros três meses do ano, de 4,5%, para 823,4 milhões de euros. Uma evolução contrária às suas principais concorrentes europeias, que se deveu à quebra de 6% na Europa e Brasil, com a companhia a assinalar um ambiente competitivo mais intenso neste último país, onde tem uma operação muito elogiada pelos grupos interessados na privatização.
Evolução positiva teve a redução da dívida que no final de 2022 era equivalente a 3,5 vezes os meios de exploração libertos, rácio que baixou para 2,2 vezes no início de 2024 considerando a última injeção de capital do Estado de 343 milhões.
O que não se alterou foi o interesse da Air France-KLM, da Lufthansa, e do Grupo IAG (dono de companhias como a British Airways e Iberia), que desde 2023 têm vindo a reiterar a vontade de se candidatar à venda da TAP, considerada a última transportadora aérea europeia com uma dimensão significativa ainda não integrada num grande grupo.
Embora todos tenham manifestado disponibilidade para a aquisição de uma parcela minoritária da TAP, há quem tenha mostrado preferência por uma maioria do capital ou “um caminho para a propriedade total”, como afirmou em janeiro um executivo responsável pelo desenvolvimento de negócio do grupo IAG.
A autonomia de gestão será outro tema central. O CEO da dona da British Airways e Iberia afirmou em fevereiro que o interesse na TAP depende da “liberdade para gerir a companhia”.
A consolidação no setor também não parou. A Lufthansa concluiu em janeiro a aquisição de 41% da italiana ITA Airways, por 325 milhões de euros, depois de um longo processo de aprovação junto da Comissão Europeia. A semana passada a Air France-KLM anunciou que pretende aumentar a sua participação na SAS dos atuais 19,9% para 60,5%, adquirindo a totalidade das ações detidas pela Castlelake e pela Lind Invest.
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