Centrais sindicais disponíveis para avaliar “compra” de dias de férias sem perda de benefícios
Mas há linhas vermelhas intransponíveis. UGT e CGTP estão contra o fim das restrições ao outsourcing durante um ano após despedimentos e a imposição de serviços mínimos às greves.

As confederações sindicais UGT e CGTP estão disponíveis para negociar a proposta de criação de um regime de compra de dias de férias extra que a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, vai levar à mesa da concertação social esta quinta-feira.
O mecanismo, defendido pelos patrões, prevê a perda de salário correspondente a um dia ou mais de trabalho sem penalização na atribuição de outros benefícios, como o subsídio de refeição, de férias ou de natal, ou na contagem de tempo de serviço para efeitos de pensão de velhice ou prestação de desemprego, como o ECO noticiou.
Mas há linhas vermelhas intransponíveis. UGT e CGTP não aceitam acabar com as restrições à subcontratação ou outsourcing um ano após despedimentos nem apertar as regras para os serviços mínimos das greves, como também vai propor o Executivo, em resposta às reivindicações das confederações patronais.
A possibilidade de meter dias de férias extra com perda remuneratória mas sem prejuízo de receber o subsídio de refeição, de férias ou de natal por inteiro, uma vez que não contam como faltas, já merece algum acolhimento por parte das estruturas sindicais. “À partida não estamos contra. Mas não sabemos em concreto o que é que o Governo vai trazer à concertação social”, afirmou ao ECO o secretário-geral da CGTP, Tiago Oliveira. Do mesmo modo, o secretário-geral adjunto da UGT, Sérgio Monte, adianta que, para já, a confederação “não tem uma posição fechada, ainda está a avaliar”.
No entanto, o dirigente sindical “alerta para alguns riscos”. “Os trabalhadores com salários mais elevados podem usar mais esse direito. Para além disso, as férias têm sido objeto de negociação coletiva, portanto é algo que pode limitar ou prejudicar a negociação coletiva. E, em terceiro lugar, é um risco, porque em certos setores com menos encomendas pode servir para a empresa pressionar o trabalhador a meter dias de férias extra, uma espécie de layoff encapotado”, sinaliza.
É um risco, porque em certos setores com menos encomendas pode servir para a empresa pressionar o trabalhador a meter dias de férias extra, uma espécie de layoff encapotado.
Tiago Oliveira lembra ainda que “há pouco tempo os trabalhadores tinham direito à majoração de três dias de férias e agora coloca-se a questão de os trabalhadores poderem comprar dias de férias”. “Tenta-se sempre inverter a decisão”, critica. Apesar disso, a central sindical não está, neste momento, “contra a favor” da medida, “não é uma linha vermelha”.
Para o líder da CGTP, há outras matérias que “preocupam muito mais muito como o subsídio de férias e de natal em duodécimos por decisão da empresa”. “Essa possibilidade já existe por acordo, então por que surge agora esta medida? Nenhum trabalhador que tenha um salário digno vai abdicar de ter direito a férias com a sua família. É inadmissível, servirá para encapotar salários baixos e dar a falsa impressão de que o trabalhador está a receber mais no final do mês”, atira.
Relativamente aos dias extra de férias, a proposta em cima da mesa, e que a ministra vai apresentar esta quinta-feira às confederações patronais e sindicais, aponta para a criação de um regime específico na legislação laboral que permita ao trabalhador meter um ou mais dias, com a correspondente perda salarial, por acordo com a entidade empregadora e sem prejuízo de outros benefícios.
Por exemplo, um funcionário, a ganhar um ordenado bruto mensal de 1.000 euros e a trabalhar 40 horas por semana, se pedir dois dias extra irá, nesse mês, receber menos dois dias de trabalho, o que equivalente a 90,9 euros, tendo em conta que cada dia vale 45,45 euros. Porém, as ausências não irão contar como faltas, pelo que o trabalhador receberá o subsídio de refeição, de férias e de natal por inteiro. Também não haverá penalização na carreira contributiva para obtenção do subsídio de desemprego ou da pensão de velhice.
As ausências não irão contar como faltas, pelo que o trabalhador receberá o subsídio de refeição, de férias e de natal por inteiro. Também não haverá penalização na carreira contributiva para obtenção do subsídio de desemprego ou da pensão de velhice.
Se há abertura nesta matéria, já quanto ao fim das restrições ao outsourcing após despedimentos, norma que recentemente foi validada pelo Tribunal Constitucional, e à definição de serviços mínimos para as greves, as confederações sindicais estão totalmente contra. O braço de ferro para um possível acordo vai balançar sobretudo entre estas duas medidas.
Outsourcing e mexidas nos serviços mínimos das greves são linhas vermelhas
No que toca às greves, o objetivo é definir uma percentagem específica para garantir o funcionamento mínimo do serviço e evitar casos como o da paralisação de maio da CP – Comboios de Portugal, em que o Tribunal Arbitral decretou serviços mínimos de 15%, mas a empresa decidiu não acatar a ordem porque estariam em causa “os mínimos padrões de segurança dos utentes no acesso às plataformas das estações ferroviárias e no uso das composições”. Mais tarde, e depois de a CP ter recorrido, o Tribunal da Relação acabou por dar razão à CP, considerando que deveriam ter sido fixados serviços mínimos de 25% da oferta programada.
Na altura, a paralisação levou o primeiro-ministro e líder do PSD a defender a revisão da lei da greve, intenção que foi vertida no Programa de Governo. Luís Montenegro usou esse caso e a paragem do metro e da Carris na véspera do feriado de Santo António para justificar as alterações durante o debate do Programa de Governo no Parlamento. “Num dia de festa, marcar um plenário durante toda a noite até às 6h para perturbar todos os outros cidadãos não é o cumprimento de um princípio de equilíbrio no exercício de direitos e o poder político tem de assumir as suas responsabilidades”, afirmou.
Montenegro voltou a sublinhar a necessidade de alterações à lei da greve na primeira reunião de Concertação Social da nova legislatura, a 2 de julho: “Somos um país que tem uma legislação laboral, que importa revisitar para poder dar às empresas maior capacidade de serem competitivas e aos trabalhadores a possibilidade de terem maior perspetivas de segurança e progressão nas carreiras.”
A intenção de “equilibrar” o direito à greve já constava do programa do Governo, mas, desta vez, o primeiro-ministro precisou que o que o Governo pretende é que “essa alteração possa consagrar que, em todas as ocasiões, há serviços mínimos que não põem em causa proporção entre o exercício do direito à greve e o exercício dos demais direitos”.
Maria do Rosário Palma Ramalho irá propor aos parceiros sociais a definição de uma percentagem que garanta sempre os serviços mínimos em casos de greves, medida que será bem acolhida pelas confederações patronais e alvo de duras críticas por parte dos sindicatos, designadamente da CGTP, que não subscreveu o acordo tripartido para a valorização salarial.
É inaceitável. Não aceitaremos que se ataque o direito dos trabalhadores de lutar. A greve é o último patamar de luta e qualquer mexida neste direito deve ser combatida com toda a força.
“É inaceitável. Não aceitaremos que se ataque o direito dos trabalhadores de lutar. A greve é o último patamar de luta e qualquer mexida neste direito deve ser combatida com toda a força”, critica Tiago Oliveira, líder da CGTP. Também Sérgio Monte, da UGT, considera que esta matéria “é uma linha vermelha”, até porque “a percentagem de serviços mínimos pode ser definida em negociação coletiva”. “No privado, os serviços mínimos são definidos conforme o ministério, é definido por despacho do ministro da tutela. No setor empresarial do Estado é o Tribunal Arbitral”, defende.
O Governo quer ainda eliminar a norma, da autoria do último Governo de António Costa, que proíbe o outsourcing, durante 12 meses após extinção de postos de trabalho, para funções que eram desempenhadas por trabalhadores que foram despedidos.
Em causa está um artigo introduzido em maio de 2023 que estabelece que “não é permitido recorrer à aquisição de serviços externos a entidade terceira para satisfação de necessidades que foram asseguradas por trabalhador cujo contrato tenha cessado nos 12 meses anteriores por despedimento coletivo ou despedimento por extinção de posto de trabalho”. A violação desta regra implica uma contraordenação muito grave para quem recorre aos referidos serviços.
A antiga provedora e agora ministra da Administração Interna, Maria Lúcia Amaral, considerou que esta restrição vai muito além dos limites constitucionais ao exercício da liberdade de iniciativa económica privada. E o Governo quer agora deixar cair esse travão ao outsourcing como exigem as confederações patronais. Apesar disso, essa norma já teve o respaldo do Tribunal Constitucional. Ou seja, está blindada do ponto de vista da Lei Fundamental.
Esta alteração também vai merecer a oposição das duas centrais sindicais, desde logo da UGT que foi a estrutura que propôs a introdução deste mecanismo na lei. “Soubemos, no passado, que empresas com lucros estavam a fazer despedimentos coletivos das pessoas mais antigas e a recorrer ao outsourcing, contratando trabalhadores mais novos ou seja mais baratos. Além disso, o TC validou a norma”, indicou ao ECO, Sérgio Monte, secretário-geral adjunto da confederação sindical.
Alinhando pelo mesmo diapasão, Tiago Oliveira está “contra” o fim da proibição da subcontratação. “Tem de haver um limite. Os patrões querem uma ferramenta para despedir e contratar mais barato“, argumenta.
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