O grupo de whatsapp, a falta de consenso e as regras regimentais: como a votação da audição de Centeno foi atirada para setembro

CDS-PP pediu para ouvir com urgência o governador do Banco de Portugal. Discussão ficou adiada para setembro, mas antes houve troca de argumentos sobre a admissão na reunião de terça do requerimento.

Um requerimento para ouvir o governador do Banco de Portugal (BdP), uma reunião da comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), as regras regimentais e a falta de consenso. São estes os ingredientes do mais recente episódio de medição de forças entre partidos, desta vez sobre um dos temas que tem marcado a agenda mediática esta semana: Mário Centeno e o negócio da nova sede do regulador bancário.

O CDS-PP apresentou na terça-feira um requerimento para a audição urgente do governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, na Comissão de Orçamento e Finanças para “dar explicações” sobre as operações vindas a público acerca do negócio da nova sede. O Observador (acesso pago) tinha noticiado nessa manhã que a meses do final do primeiro mandato como governador, Mário Centeno assinou, com o apoio da sua administração, um contrato-promessa com quatro sociedades do Grupo Fidelidade para a construção da nova sede do banco central nos antigos terrenos da Feira Popular, em Lisboa, mas que o negócio era de “alto risco”.

Com o tema a ganhar espaço mediático, os centristas queriam ver discutido o tema na última reunião da COFAP, agendada para o dia seguinte, ou seja terça-feira. Porém, para que o requerimento fosse admitido a votação era preciso o consenso dos partidos, o que não aconteceu. Na terça-feira à tarde, entre a audição da Autoridade da Concorrência e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Paulo Núncio, deputado do CDS-PP, chamou o tema à COFAP.

Sabemos que de acordo com as regras que foram definidas isso só será possível com o consenso de todos os grupos parlamentares presentes na Comissão e, por isso, gostava de requerer esse mesmo consenso“, disse o parlamentar centrista.

Um consenso que segundo o presidente da COFAP e deputado do Chega, Rui Afonso, que o CDS-PP já sabia que não teria. “Não obteve o consenso de todos os grupos parlamentares, portanto, o requerimento terá de ficar para setembro. Nesse aspeto, já está mais do que definido. Ficou definido no nosso grupo de whatsapp de mesa e coordenadores que realmente não haveria o consenso de todos os grupos parlamentares para incluir esse ponto“, realçou Rui Afonso.

Mas Paulo Núncio insistiu. “Gostava mesmo de saber quais são os grupos que se opõem à audição do atual governador do Banco de Portugal e, já agora, relativamente a este negócio relacionado com a construção da nova sede do Banco de Portugal”, disse. Informação que o centrista tinha, mas que queria que ficasse registada na reunião pública da comissão parlamentar.

Presidente da COFAP: O senhor deputado sabe perfeitamente qual foi o grupo parlamentar que se opôs à admissão do requerimento.
-Paulo Núncio: Já agora qual foi?
-Presidente da COFAP: Foi o PS.

Apesar de na segunda-feira, segundo as intervenções dos parlamentares na reunião, o PS se ter posicionado contra, o deputado socialista Miguel Costa Matos abriu na terça-feira a porta à possibilidade de admissão do requerimento, com a condição dos restantes serem também admitidos a votação.

Em causa está o facto de no início da reunião, o presidente da COFAP ter anunciado que a discussão sobre os pontos dos criptoativos e dos lesados do BES ficariam adiados para setembro, devido à resolução do Parlamento que, em termos gerais, destina a última semana de trabalhos nas comissões apenas para redações finais.

“Acho que é extremamente desonesto que seja imputado a esta comissão algum tipo de atraso na discussão deste requerimento. Este atraso resulta exclusivamente das regras regimentais que dizem que esta comissão deve discutir exclusivamente redações finais e audições“, alegou Miguel Costa Matos.

Neste sentido, o deputado defendeu que “mesmo que tivesse havido o consenso para se debater” o requerimento “numa comissão que estava definida como disse, e bem, o senhor presidente, exclusivamente para redações finais e audições, não poderia ter sido discutido e o senhor presidente teria retirado os pontos como fez com todos os outros”.

“Aliás, pelo que soube, foi por sugestão do PSD que se retirassem todos os pontos”, atirou. No entanto, o PSD ripostou que o cenário era ligeiramente diferente.

A resolução do plenário determina que tirando os casos das redações finais podem ser agendados pontos nas comissões quando há consenso. Relativamente aos pontos que elencámos [projeto de resolução de criptoativos e requerimento para acesso a documentação sobre o mecanismo de recuperação de créditos dos lesados do BES], aquilo que dissemos é que não fomos procurados nem consultados para obtenção desse consenso e não demos esse consentimento”, explicou o deputado social-democrata Hugo Carneiro.

O parlamentar garantiu, assim, que “se tivesse existido consenso de todos os partidos seria possível fazer o seu agendamento“. Neste sentido, Miguel Costa afirmou estar disponível para “discutir todos os pontos”: “Da nossa parte tudo ok, agora não vamos é estar a fingir que se discutem os de uns e não se discutem os de outros. É muito curiosa esta atenção da parte dos partidos”, disse.

Mais de dez minutos de troca de argumentos sobre o tema, interrompidos para dar início à audição da CMVM, sendo o tema atirado para o fim da reunião e com o desfecho sinalizado desde o início do encontro. Entendeu-se não existir condições para votar o requerimento nesse dia, ficando agendado para setembro, no regresso das férias parlamentares.

Com a votação da audição do governador adiada, o CDS-PP apresentou mais um requerimento. Desta vez para pedir ao Banco de Portugal o envio do Memorando de Entendimento assinado entre o Banco de Portugal e a Fidelidade, detida pelo grupo chinês Fosun, sobre a construção da nova sede, bem como os relatórios jurídicos e técnicos, internos e externos, recebidos pelo Banco de Portugal sobre o projeto.

Os centristas requereram ainda ao regulador que remeta o contrato-promessa compra e venda assinado pelo Banco de Portugal, que gerou o pagamento de um sinal de 57,5 milhões, a identidade do promotor, assim como todos os restantes pareceres internos e externos sobre esta matéria.

O ECO noticiou esta terça-feira que mais de uma dezena de condições poderão travar o negócio da nova sede do Banco de Portugal, segundo o contrato assinado com a Fidelidade, a dona dos terrenos da antiga Feira Popular, em Entrecampos, Lisboa, que albergará a futura casa do supervisor da banca (ainda) liderado por Mário Centeno. As notícias vieram a público na semana em que o Governo anuncia o sucessor de Mário Centeno à frente da instituição.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

O grupo de whatsapp, a falta de consenso e as regras regimentais: como a votação da audição de Centeno foi atirada para setembro

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião