Reforma laboral. Jovens e desempregados de longa duração passam a justificar contratos a prazo
Neste momento são poucos os motivos que justificam os vínculos a termo, mas o anteprojeto de reforma laboral tenciona alargá-los. Serviços mínimos às greves também vão abranger o setor alimentar.
O Governo quer incluir jovens e desempregados de longa duração nos motivos que justificam a celebração de contratos a prazo, segundo o anteprojeto da reforma laboral que o Executivo entregou aos parceiros sociais e a que o ECO teve acesso.
O documento, com 59 páginas, e que altera mais de uma centena de artigos ao Código do Trabalho, facilita a caducidade das convenções coletivas, ao eliminar a arbitragem, dificulta a presunção de laboralidade a trabalhadores independentes ao exigir que pelo menos 80% do serviço prestado seja a uma entidade e alarga os serviços mínimos das greves ao setor do abastecimento alimentar e da segurança privada.
As regras para contratos de muito curta duração estão bem balizadas no Código do Trabalho. Só podem ser celebrados para “a satisfação de necessidades temporárias, objetivamente definidas pela entidade empregadora e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades”, de acordo com o artigo 140.º da lei laboral.
Para além disso, e de segundo a legislação atual, é permitido celebrar “contrato de trabalho a termo certo para:
a) lançamento de nova atividade de duração incerta, bem como início do funcionamento de empresa ou de estabelecimento pertencente a empresa com menos de 250 trabalhadores, nos dois anos posteriores a qualquer um desses factos;
b) contratação de trabalhador em situação de desemprego de muito longa duração”.
É este ponto que o Governo pretende alterar. No documento enviado aos parceiros sociais, já não se exige que a empresa tenha menos de 250 trabalhadores e alarga-se o espetro da contratação ao “trabalhador que nunca tenha prestado atividade ao abrigo de contrato de trabalho por tempo indeterminado”, que pode ser um jovem à procura do primeiro emprego ou um trabalhador que nunca tenha estado efetivo, “ou que esteja em situação de desemprego de longa duração”, isto é, sem emprego há mais de um ano.
Estas alterações revogam parte da Agenda para o Trabalho Digno, do anterior Governo de António Costa, ao voltar a incluir jovens e desempregados de longa duração nos motivos que justificam a celebração de vínculos a termo, isto é, precários. Espera-se por isso a contestação das confederações sindicais a esta alteração.
Abre-se ainda a porta à contratação a prazo de pensionistas por velhice e invalidez. Atualmente, a lei já permite vínculos a termo de seis meses para quem se reformou mas para trabalhar na empresa onde até então esteve empregado. O Governo quer permitir que este trabalhador possa, agora que se aposentou, prestar serviços a outras entidades.
Também há mudanças nos prazos dos contratos a termo. “A proposta é que não durem menos do que um ano, apenas em casos excecionais, quando, até agora, eram de seis meses”, como explicou esta quinta-feira o ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho. Ou seja, o mínimo passa de seis meses para um ano. Também a duração máxima vai ser alargada: no caso dos contratos a termo certo, o prazo “aumenta de dois para três anos” e, nos contratos a termo incerto, sobe de “quatro para cinco anos”, acrescentou.
A reforma apresentada aos parceiros sociais deixa cair outras normas da Agenda para o Trabalho Digno que vai facilitar a caducidade das convenções coletivas ao eliminar a arbitragem na apreciação inicial e final da denúncia do acordo coletivo.
Em causa está o artigo 500.º A do Código do Trabalho – Arbitragem para apreciação da denúncia de convenção coletiva, que foi revogado, e que estabelece, “em caso de denúncia de convenção coletiva, a parte destinatária da denúncia pode requerer ao presidente do Conselho Económico e Social arbitragem para apreciação da fundamentação invocada pela parte autora da denúncia”.
E o artigo 501.º A – Arbitragem para a suspensão do período de sobrevigência e mediação, que o Governo também quer eliminar, o qual determina que “qualquer das partes pode requerer ao presidente do Conselho Económico e Social […] arbitragem para a suspensão do período de sobrevigência e mediação pelo árbitro presidente”.
Isto significa que basta uma das partes, por exemplo, a entidade patronal, denunciar a convenção coletiva para a sua produção de efeitos, deixando de existir mediação para precisar os fundamentos do pedido.
No caso da presunção de contrato de trabalho para os recibos verdes economicamente dependentes, as regras são flexibilizadas, o que vai dificultar a vinculação do trabalhador em causa. Neste momento, basta que 50% do serviço seja prestado a uma entidade para ser verificar a presunção de laboralidade. A proposta do Governo alarga aquele limite para 80%.
Serviços mínimos das greves alargados aos setores alimentar e de segurança privada
O anteprojeto de reforma da legislação laboral prevê incluir o abastecimento alimentar e os “serviços de segurança privada de bens ou equipamentos essenciais” nos setores que passam a estar abrangidos por serviços mínimos em caso de greve.
A indicação consta do anteprojeto de reforma da legislação laboral, aprovado na quinta-feira em Conselho de Ministros e entregue aos parceiros sociais.
Segundo o documento a que o ECO teve acesso, além dos “serviços de cuidado a crianças, idosos, doentes e pessoas com deficiência”, que já tinham sido referidos na quinta-feira pela ministra do Trabalho, e que incluem por exemplo creches e lares, o Governo tenciona também alargar os “serviços de segurança privada de bens ou equipamentos essenciais” e o abastecimento alimentar na prestação de serviços mínimos “indispensáveis” em caso de greve e à luz da “satisfação de necessidades sociais impreteríveis”.
Questionado pelos jornalistas sobre se as escolas básicas e secundárias também estão incluídas no âmbito dos serviços de cuidado a crianças, idosos, doentes e pessoas com deficiência”, fonte oficial da tutela referiu, na quinta-feira, que “não está definido”.
O Código do Trabalho prevê atualmente que em caso de greve os serviços mínimos sejam assegurados “em empresa ou estabelecimento que se destine à satisfação de necessidades sociais impreteríveis”, que incluem correios e telecomunicações; serviços médicos, hospitalares e medicamentosos; salubridade pública, incluindo a realização de funerais; serviços de energia e minas, incluindo o abastecimento de combustíveis.
Contemplados estão também abastecimento de águas; bombeiros; serviços de atendimento ao público que assegurem a satisfação de necessidades essenciais cuja prestação incumba ao Estado; transportes, incluindo portos, aeroportos, estações de caminho-de-ferro e de camionagem, relativos a passageiros, animais e géneros alimentares deterioráveis e a bens essenciais à economia nacional, abrangendo as respetivas cargas e descargas; e transporte e segurança de valores monetários.
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