Muitos trabalhos e duas urgências para Gabriel Bernardino à frente do supervisor dos seguros

O novo presidente do supervisor dos seguros foi bem recebido pelo setor. Caminho passa por aproveitar o trabalho deixado por Margarida Corrêa de Aguiar e a abertura do Governo para fazer reformas.

O regresso de Gabriel Bernardino como presidente ao supervisor de Seguros (ASF) está a encantar os seguradores, que temiam alguém de fora do setor para suceder a Margarida Corrêa de Aguiar. Em declarações a ECOseguros, José Galamba de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Seguradores (APS), revelou-se muito satisfeito pela nomeação de Gabriel Bernardino porque “conhece bem a ASF, o supervisor europeu EIOPA e os operadores do mercado”, como são também as seguradoras.

Gabriel Bernardino é o novo presidente da ASF, supervisora dos seguros em Portugal, após 10 anos a regular os seguros europeus.Miguel A. Lopes/Lusa

Na sua opinião, o novo presidente tem uma sensibilidade adequada, dando continuidade a uma mútua compreensão, embora com defesa de interesses nem sempre partilhados, que existia com Margarida Corrêa de Aguiar, que agora deixa o cargo após seis anos de um mandato como presidente da instituição.

Trabalhou comigo sete anos, por mérito passei-o de técnico a diretor e, através de provas e exames, atingiu a presidência da EIOPA”, refere Rui Martinho, atual presidente da Mútua Portuguesa de Seguros e que presidiu ao Instituto de Seguros de Portugal – hoje ASF – até 2006. “Penso ir ser um dos momentos altos da ASF”, afirma.

Nuno Martins, o novo presidente da APROSE, única associação representante os corretores e agentes de seguros em Portugal, disse a ECOseguros que “rigor, experiência e isenção são atributos que definem Gabriel Bernardino e que continuarão a influenciar o setor nos próximos anos, o seu valioso contributo para os Seguros em Portugal foi reconhecido, em 2024, com a atribuição do Prémio Carreira APROSE”

Acrescenta o representante dos mediadores ser “uma nomeação amplamente reconhecida, símbolo de independência e de uma referência incontestável no setor, com provas dadas ao longo dos dez anos ao serviço da EIOPA, Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma”, concluindo que “da parte da APROSE e dos seus associados, reiteramos o nosso compromisso em continuar a trabalhar pela defesa e valorização do setor”.

Também Hugo Borguinho, um dos diretores de topo da ASF, comentou a ECOseguros a vontade de voltar a trabalhar com Bernardino, de quem foi adjunto e cujo lugar no supervisor de seguros ocupou quando este partiu para a EIOPA.

Entre as prioridades, para começar, o vento favorável e a abertura do Governo têm de ser aproveitados para tratar de assuntos mais urgentes: as lacunas de proteção (protection gaps) graves existentes em Portugal como em toda a Europa.

Reformas, sismos, doenças e regras europeias

Margarida Corrêa de Aguiar deixa as batalhas preparadas, mas muitas urgências estão do lado do Governo. A vontade política de as fazer avançar tem de ser conquistada e lembrada aos governantes da tutela, ao ministro das Finanças Miranda Sarmento e ao Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, João Silva Lopes.

A primeira de todas esteve durante os oito anos de governos socialistas a ser evitada, porque a agonia das pensões de reforma estatais é suave e longa. O facto foi de novo repetido no Ageing Report de 2024 da Comissão Europeia: a pensão de reforma média do sistema de segurança social (pilar 1 da segurança social) em Portugal deverá passar de um valor equivalente a 69,4% do valor do último salário em 2022 (chama-se taxa de substituição) para um valor estimado de 38,5% em 2050, num cenário em que não existam alterações no sistema público de pensões.

Neste ano de 2025, contando com uma idade de reforma de 67 anos, significa que quem tem hoje 42 anos já receberá em média de pensão de velhice 385 euros por cada 1.000 euros de salário. Mas, desde há uns anos que é sempre a descer.

Daí ser necessário uma poupança complementar dos portugueses. A taxa de participação da população ativa em fundos de pensões profissionais (pilar 2) situava-se em 3,8% no final de 2023, enquanto a participação em fundos de pensões individuais (pilar 3) era de 4,5%.

O estímulo de planos de empresa e individuais de reforma será então fundamental para enfrentar esta realidade, que parece distante mas que a inação vai tornando urgente. “Os atuais baixos níveis de poupança e a baixa literacia financeira e de risco dos portugueses tornam inevitável a perda de rendimentos em idade de reforma”, já alertou Margarida Corrêa de Aguiar.

Gabriel Bernardino também terá de dar seguimento à proposta da ASF de criação de um fundo sísmico, entregue ao Ministério das Finanças no final de 2024. Em Portugal a cobertura de risco sísmico não é obrigatória e apenas 19% do edificado habitacional dispõe de seguros com cobertura de risco sísmico. É outro tema politicamente sensível, até porque o financiamento desse Fundo poderá exigir mais um seguro obrigatório às habitações e a gestão desse fundo – que se tornará valioso com o tempo – será apetecível.

Este fundo é o começo de uma cobertura extensível a Catástrofes Naturais, incluindo incêndios e inundações, que a ASF deverá preparar para avançar em paralelo ou por extensão do Fundo Sísmico.

Outro tema sensível é cibersegurança, que gradualmente vem aumentando e que tem para o setor financeiro o DORA – Digital Operational Resilience Act, que abrange o reporte de incidentes cibernéticos que, apesar de se focar sobretudo no seu impacto operacional, prevê a recolha de informação sobre o respetivo impacto financeiro.

A distância temporal relativa ao período de pandemia de Covid-19 tem afastado o tema, mas também neste aspeto não se avançou com as perdas por interrupção de negócios não provocadas apenas por danos nos equipamentos, não adicionando as provocadas por problemas de saúde pública.

Ainda na Saúde, Gabriel Bernardino tem de acompanhar o Governo na questão do direito ao esquecimento, cuja lei precisa de regulamentação detalhada, para poder ser operacionalizada pelas seguradoras de uma forma eficaz para os potenciais segurados, os recuperados de doenças graves.

Os seguros de saúde exigem cuidado especial, já que mais de 4 milhões de portugueses os usam, mas a sua quota no financiamento do sistema nacional de saúde é muito baixa. Também exige uma atenção à distinção clara entre planos e seguros de saúde.

Finalmente, existe toda a parte de legislação europeia que será tema em que Gabriel Bernardino estará à vontade e terá influência a nível europeu e na EIOPA, que fundou e presidiu durante 10 anos até 2021.

Aí terá de tratar e transpor para Portugal dossiers importantes como a revisão de Solvência II, o regulamento que disciplina as seguradoras quanto a capitais para enfrentar os riscos, as regras ESG de subscrição e investimentos, toda a acelerada legislação que vai reger a Inteligência Artificial, o regulamento FiDA – Financial Data Access e a mais em voga Savings and Investments Union (SIU), uma determinação da Comissária Maria Luis Albuquerque que quer ver mais poupanças europeias – como as captadas por seguradoras – a financiar a expansão de empresas, mesmo em capital de risco, para renovar a competitividade económica da Europa.

Para todos estes desafios, numa ótica de regulação, Gabriel Bernardino traz conhecimento, experiência e credibilidade junto do setor.

Notícia atualizada às 21h com declarações de Nuno Martins, presidente da APROSE.

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