Margarida Corrêa de Aguiar: “setor segurador está bem capacitado para responder à atual conjuntura”

A presidente da ASF não teme que o momento económico afete os seguros, mas não esconde os desafios estruturais do setor: protection gap, aumento da longevidade, clima e transição digital.

3ª Conferência Anual ECO Seguros - 20OUT22
Margarida Corrêa de Aguiar no encerramento da 3ª Conferência Anual ECOseguros: “a ASF irá estar particularmente atenta aos fenómenos de greenwashing”.Hugo Amaral/ECO

Margarida Corrêa de Aguiar, presidente da ASF, entidade supervisora, no seu discurso de encerramento da 3ª Conferência Anual ECOseguros, que teve lugar esta quinta feira no Centro de Congressos de Lisboa, deu “uma palavra de confiança no setor segurador, um setor bem capacitado, para responder à atual conjuntura e aos desafios estruturantes que estão na ordem do dia e que a conjuntura veio evidenciar”.

A presidente da supervisão dos seguros e fundos de Pensões alertou que a ASF irá estar “particularmente atenta aos fenómenos de greenwashing” sublinhando “a responsabilidade do setor segurador ao nível da divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade e de informações pré-contratuais”.

Margarida Aguiar acentuou ainda “o papel do setor segurador em relação aos riscos das alterações climáticas que impacta o negócio em múltiplas vertentes, desde a subscrição de novos riscos, à exposição a uma maior frequência e severidade de sinistros em diversas coberturas, passando pela reorientação das políticas de investimento, atendendo à transição política e tecnológica requerida para a conversão de diversas atividades económicas para moldes compagináveis com os objetivos de sustentabilidade”, disse.

A presidente avisou que “continuará a ser preocupação central da ASF, assegurar que os consumidores disponham de informação que lhes permita estarem devidamente informados sobre as características dos produtos que estão a adquirir – sejam de consumo sejam de poupança – e sobre a sua adequação às suas necessidades e ao seu perfil de risco”.

Margarida Corrêa de Aguiar destacou na análise de conjuntura:

Que se vivem momentos conturbados, em que a conjuntura económica se mantém fortemente influenciada pelos impactos da invasão da Ucrânia pela Rússia, num momento crítico para o processo de recuperação europeia e mundial, ainda sob o rescaldo de dois anos de pandemia.

  • As sanções impostas à Rússia pela comunidade internacional – e consequentes medidas de retaliação – magnificaram os efeitos da crise energética e das perturbações sobre as cadeias de abastecimento, amplificando a trajetória ascendente da inflação.
  • As alterações nas medidas de política monetária – verificadas por todo o globo – em resposta à crescente inflação, conduziram a um aumento significativo das taxas de juro de mercado, descolando do ambiente de baixas taxas de juro com o qual convivemos durante quase uma década.
  • A nova realidade das taxas de juro mais elevadas abre boas perspetivas na oferta de produtos de poupança com retornos garantidos mais atrativos, mas reaviva preocupações antigas relativamente à sustentabilidade do endividamento público, ao risco de incumprimento dos privados e a fenómenos de fragmentação dos mercados financeiros aos quais a nossa economia se encontra particularmente exposta.
  • Os mercados acionistas com quebras nos preços dos ativos e aumento da volatilidade, persistindo receios de correções descendentes adicionais.
  • Os desafios impostos por esta conjuntura são bem conhecidos seja ao nível da subscrição, do aumento dos custos com sinistros ou da gestão criteriosa dos portfólios de investimentos.

A resposta à conjuntura exposta levou a presidente da ASF a comunicar que “é muito importante que sejamos capazes de pensar o longo prazo e, simultaneamente, gerir as necessidades de curto prazo”.

Margarida Aguiar também anunciou:

  • Que a supervisão encontra-se a conduzir ações de supervisão e de monitorização dos riscos, específicas, tanto na vertente microprudencial como na vertente macroprudencial;
  • Que estão em desenvolvimento iniciativas de monitorização dos riscos cibernéticos, nas vertentes de riscos operacional e de subscrição, assim como de análise de sensibilidade do setor segurador aos principais riscos da atual conjuntura macroeconómica.

Os desafios estruturais estão inalterados

Para Margarida Corrêa de Aguiar “a conjuntura desafiante que enfrentamos e que nos acompanhará em 2023, tornou mais evidentes os desafios estruturantes do setor segurador que não se alteraram”, referindo-se aos desafios inerentes ao protection gap, ao aumento da longevidade, às alterações climáticas e à transição digital.

Segundo a presidente da ASF a instituição tem” trabalhado na procura de soluções efetivas e duradouras e que não podem ser circunscritas ao setor segurador, antes articuladas também com as políticas públicas”.

Referiu que relativamente ao protection gap, e ao aumento da longevidade, a ASF apresentará em breve dois estudos sobre estas matérias, “os quais irão certamente dinamizar o debate – que se pretende alargado – em torno das melhores soluções”.

Referiu que para a redução do protection gap, importa que os operadores “continuem a desenvolver oferta seguradora, financeira e tecnicamente sustentável, adaptada às necessidades dinâmicas das famílias e da economia, reforçando o desempenho do papel fundamental dos seguros na proteção e diversificação dos riscos dos agentes económicos”

Em relação ao aumento da longevidade, afirmou que “o setor segurador continua a ser um ator privilegiado, não só pelo seu papel histórico na captação de poupança para a reforma, como, crescentemente, no acesso a cuidados de saúde complementares ao sistema nacional de saúde”.

Influência ativa na Europa

A presidente da ASF destacou também algumas iniciativas em curso a nível internacional, nomeadamente a nível europeu, nas quais “a ASF tem tido uma participação particularmente ativa e das quais o setor segurador, a regulação e a supervisão beneficiarão”

Anunciou que sobre protection gap, e com forte interligação com os desafios relativos às alterações climáticas, será publicado, até ao final deste ano, o Dashboard europeu da EIOPA sobre o Protection Gap para riscos de catástrofes naturais. Ainda quanto a riscos climáticos, integrado na Estratégia de Financiamento da Transição para uma Economia Sustentável da Comissão Europeia, está em estudo, ao nível das autoridades europeias de supervisão, o lançamento de um exercício transversal ao setor financeiro de stress test aos riscos climáticos, no sentido de se obter uma fotografia completa e integrada sobre este problema transversal.

No âmbito da criação de um quadro comum de resiliência operacional digital (DORA), aplicável ao setor financeiro europeu, referiu que “os próximos anos preveem-se de grande intensidade, sendo necessário preparar o pacote de regulamentação e, simultaneamente, capacitar os operadores e as autoridades de supervisão para os desafios da implementação nesta área de grande complexidade.

Segundo a presidente da ASF, logo que o Regulamento entre em vigor, previsivelmente no início de 2023, as autoridades de supervisão europeias – Autoridade Bancária Europeia (EBA), Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma (EIOPA) e Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA) –, com o forte envolvimento das autoridades de supervisão nacionais, terão dois anos para preparar as normas técnicas que irão detalhar os requisitos do pacote legislativo, disse.

A respeito dos riscos cibernéticos, Margarida Aguiar afirmou que o quadro de monitorização, recentemente lançado pela ASF, pretende possibilitar a recolha de um conjunto de dados que lhe permita aferir a exposição dos setores supervisionados a estes riscos numa perspetiva operacional e, também, a avaliação da sua exposição na vertente da cobertura de riscos. Sublinhou “o importante papel que as empresas de seguros e resseguros desempenham, na medida em que a oferta de cobertura para riscos cibernéticos – ainda que não substitua a adoção de medidas de prevenção e proteção adequadas –, possibilita, em certa medida, atenuar o eventual impacto financeiro de um incidente cibernético”.

Também referiu os trabalhos de revisão do regime Solvência II, incluindo a proposta de Diretiva para a Recuperação e Resolução de Empresas de Seguros, onde espera assistir, em 2023, a desenvolvimentos importantes no sentido do robustecimento do quadro regulatório permanente onde operam as empresas de seguros nacionais.

Quanto à proposta de Diretiva para a Recuperação e Resolução de Empresas de Seguros revelou que está num estágio menos avançado de concretização por abordar “matérias de particular complexidade como o planeamento preventivo de recuperação e resolução, a aplicação de poderes e instrumentos de resolução ou o financiamento da resolução”.

Margarida Aguiar também considera relevante a iminente entrada em vigor da IFRS 17, a Norma Internacional de Relato Financeiro dedicada aos contratos de seguros, que implica uma profunda alteração não só nos sistemas contabilísticos, mas em toda a infraestrutura tecnológica dos operadores.

O ano de 2023 será de consolidação da implementação da nova Norma da Conduta de Mercado e da Norma do Sistema de Governação – que entraram em vigor, respetivamente, no final dos meses de julho e de junho – e, ainda, das Orientações de Fit and Proper que serão aprovadas pela ASF dentro em breve, conclui Margarida Corrêa de Aguiar.

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