“Incumprimento do crédito à habitação é residual”, diz Centeno
O governador do Banco de Portugal revela ainda que 68% dos contratos abrangidos pelo PARI encontram-se "isentos de risco de incumprimento."
Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, referiu esta terça-feira em comissão parlamentar que o “incumprimento do crédito à habitação continua a ser residual”, apesar da forte subida das taxa de juro no último ano.
No decorrer da sua intervenção, Centeno referiu também que 68% dos contratos abrangidos pelo Plano de Ação para o Risco de Incumprimento (PARI) encontram-se atualmente “isentos de risco de incumprimento.”
O PARI entrou em vigor em agosto de 2021 e é para onde são encaminhados os créditos à habitação renegociados ao abrigo do decreto-lei, aprovado a 3 de novembro pelo Governo, com vista a mitigar o impacto da subida das taxas de juro no orçamento das famílias.
Mário Centeno volta a reforçar a ideia de que Portugal tem “um problema de aumento do custo” com as taxas de juro entre 2022 e 2023, mas é um aumento “comportável pelo comportamento que temos assistido no mercado de trabalho e pelos apoios públicos recebidos”.
Segundo o governador do Banco de Portugal, “genericamente falando, a avaliação que fazemos é que as famílias têm condições para continuar a suportar estes encargos adicionais enquanto as condições do mercado de trabalho continuarem como observamos hoje.”
No seguimento da comissão parlamentar, Mário Centeno antecipa também que os bancos possam vir a baixar as comissões bancárias, como resultado das taxas de juro não estarem mais em terreno negativo. “Espero que isso se reflita nos próximos tempos”, diz o governador.
A observação do líder do Banco de Portugal vai ao encontro do projeto de Lei apresentado esta terça-feira pelo grupo parlamentar do Partido Socialista (PS), que visa “promover a razoabilidade e proporcionalidade das comissões bancárias e reforçar a proteção do consumidor de serviços financeiros.”
Parte das medidas apresentadas passam por clarificar alguns dos pontos evocados no decreto-lei aprovado pelo Governo a 3 de novembro do ano passado para apoiar as famílias com crédito à habitação, que passam por:
- Prazo: A renegociação dos créditos à habitação possa permitir o alargamento da maturidade dos contratos de crédito à habitação para lá dos prazos recomendados pelo Banco de Portugal na contratualização dos novos empréstimos para a compra de casa, desde que, “no final do calendário de amortização ajustado, o mutuário não tenha mais de 75 anos de idade.”
- Cross-selling: Os bancos não podem exigir a “contratação, aquisição ou locação de quaisquer bens ou serviços, de natureza financeira ou outra, por contrapartida da renegociação de contrato de créditos.”
- Avaliação do imóvel: Numa revisão do contrato de crédito à habitação, será possível considerar o relatório de avaliação do imóvel anterior desde que este tenha sido realizado há menos de seis meses. E na eventualidade de haver lugar a uma nova avaliação do imóvel e caso o cliente não quiser avançar com as novas condições, o encargo deste serviço ficará a cargo do banco.
Todas estas medidas já estavam impressas na lei, com exceção do último ponto relativo ao relatório de avaliação do imóvel. Natália Nunes, coordenadora Gabinete de Proteção Financeira da DECO, refere que estas medidas são, de uma forma geral, positivas mas não trazem nada de novo. “Servem apenas para clarificar alguns aspetos que num primeiro momento podiam ser entraves aos consumidores, mas não vêm adiantar mais do que já estava previsto na legislação.”
No entanto, a responsável da DECO dá como exemplo um conjunto significativo de casos que chegaram à DECO em outubro e novembro de propostas de bancos que renegociavam os créditos à habitação através da revisão do spread dos contratos, caso adquirissem novos produtos bancários. “Depois de expormos estas situações aos bancos visados, foi-nos garantido que isso não voltaria a acontecer”, refere Natália Nunes.
Ao dia de hoje, Natália Nunes refere que a maioria dos créditos à habitação que estão a ser negociados ao abrigo do diploma do Governo tem passado por uma revisão do spread e do alargamento do prazo do contrato.
Contudo, refere que a DECO tem registado “uma grande quantidade de clientes a receberem por parte dos bancos a informação de não haver condições para renegociar os contratos” e sem darem qualquer explicação. “Os bancos dizem apenas que não há condições para renegociar”, revela Natália Nunes.
Cortar nas comissões bancárias
Além da clarificação que pretende ver no diploma aprovado em Conselho de Ministros de 3 de novembro e publicado a 25 de novembro (Decreto-Lei n.º 80-A/2022), o Partido Socialista pretende também “promover a eliminação ou a limitação de encargos excessivos junto dos consumidores financeiros.” Essas medidas abrangem três áreas:
- Habilitação de herdeiros
Isenção de comissões ou encargos diretos pelo processo de habilitação de herdeiros por óbito de um titular de conta bancário cujos ativos não ultrapassem os 50 mil euros, “quando o habilitando for herdeiro legitimário do titular quando seja titular de uma conta de serviços bancários.” E nos restantes casos não ultrapasse 10% do Indexante dos Apoios Sociais (IAS) – que neste momento é de 480,43 euros. - Alteração de titularidade de conta
Os bancos não podem cobrar quaisquer comissões ou encargos diretos no âmbito dos processos de alteração da titularidade de conta à ordem quando esta seja motivada por falecimento de um dos cônjuges; no âmbito de processos de remoção de representantes legais por maioridade do segundo titular, por inserção ou remoção de representantes legais em contas cujo primeiro titular seja menor de idade, maior acompanhado ou se encontre insolvente, bem como nos processos de remoção de titulares falecidos. - Pagamento do distrate
Após o fim do contrato de crédito, os bancos têm de entregar ao cliente o respetivo distrate no espaço de 14 dias úteis, “não havendo lugar à cobrança de comissão ou despesa adicional por esse ato”.
Em declarações ao ECO, a Associação Portuguesa de Bancos refere apenas que “que os bancos estão a cumprir diligentemente com o que está previsto no decreto-lei 80-A/2022.”
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