Mau tempo faz disparar custo dos sinistros multiriscos habitação
Os danos causados por água nas habitações nos últimos quatro meses aumentou indemnizações por sinistros em seguros multirriscos habitação em 43 milhões de euros. O que acontecerá aos prémios?
As inundações e tempestades registadas nos últimos meses em Portugal causaram prejuízos anormais às seguradoras principalmente nos seguros multiriscos habitação em que mais de 50% dos sinistros são danos causados por água. Esta é a causa mais frequente em danos nos edifícios e recheio, mais que incêndios e outros riscos que estão cobertos como standard ou extra nas apólices mais frequentemente contratadas.
Os confinamentos devidos à Covid-19, também mudaram hábitos e são um dos fatores que têm contribuído para colocar o Seguro Casa sob pressão. “A pandemia veio evidenciar uma relação diferente dos Clientes com este seguro” explica Carla Jorge da direção de Sinistros da Allianz Portugal, “o facto de estarem cada vez mais despertos para as coberturas e serviços de que dispõem em conjunto com um maior tempo de permanência nas casas, acabou por se traduzir num aumento de participação de sinistros”, conclui.
Carla Jorge refere que também são cada vez mais frequentes os fenómenos climatéricos extremos que expõem as habitações a danos consideráveis. “Os passados meses de dezembro e janeiro foram reflexo disso mesmo, com um grande número de ocorrências por todo o país, destacando-se as inundações na região da Grande Lisboa em dezembro”, diz a gestora da seguradora alemã que em 2022 alcançou 12,8% de quota de mercado em produção neste ramo.
A Aegon Santander, uma das maiores seguradoras no ramo Multiriscos Habitação, tem 200.000 casas seguras e o seu CEO Tiago do Couto Venâncio assinala uma correlação entre precipitação e sinistralidade. De facto, dados do IPMA, confirmam que de setembro a dezembro do ano passado a precipitação superou bastante a média do período entre 1971 e 2000. Em relação a 2021 os últimos 4 meses do ano significaram um aumento de 42,9 milhões de euros em custos com sinistros relativamente a igual período de 2021. A APS, associação dos seguradores, tinha como registo um prejuízo total para as seguradoras de 47 milhões de euros.
O aumento de custos com sinistros atingiu os 16% ao longo de 2022. No total, as seguradoras pagaram 312,3 milhões de euros a segurados por sinistros, e este valor tem grande parte da explicação, segundo Tiago Venâncio, no aumento dos custos a refletirem a subida de inflação: “existe uma grande pressão: falta mão de obra e sinistros mais complexos implicam maior tempo de gestão, os preços dos materiais estão mais elevados, os serviços de reparadores e de peritagem também subiram, embora neste caso a vídeo peritagem tenha ajudado”. O CEO da Aegon Santander calcula entre 8% e 10% a subida de cada uma das componentes de custos ao longo do ano.
Também Carla Jorge sentiu o mesmo ambiente “de inflação galopante que tem afetado especialmente este ramo, com a disrupção das cadeias de abastecimento, um considerável aumento nos custos dos materiais de reconstrução e na mão de obra”.
A rentabilidade do ramo sofreu, principalmente em dezembro, quando o rácio de sinistralidade atingiu 96% dos prémios pagos pelos segurados. No conjunto do ano, devido a um primeiro semestre ainda de seca, a taxa de sinistralidade foi de 49,8% contra 46% de um ano antes.
Se a estes custos com sinistros de juntarem as despesas diretas, como o pagamento a peritos para certificarem os sinistros, ou a quota parte deste ramo nos gastos de funcionamento das seguradoras, provavelmente o ramo multirriscos habitação deu prejuízo no final de 2022, o que não é normal.
Tiago Venâncio acrescenta ainda que os preços de resseguro para este ramo subiram 10% para este ano, também esse recurso das companhias para dispersar os seus riscos, está substancialmente mais caro.
O grupo Ageas Portugal, que opera neste ramo através da Ageas Seguros e tem 15% de quota de mercado, também notou subida de custos: “desde outubro de 2022 que se sente este aumento de sinistralidade, quando comparado com o período homólogo de 2021. Isto acontece, principalmente, pelos três eventos meteorológicos desfavoráveis que marcaram o final do ano e o início de 2023, refletindo-se no aumento em termos de volumes e danos mais avultado devido à gravidade dos eventos ocorridos”, referiu em resposta a ECOseguros, acrescentando que “ainda em janeiro e fevereiro de 2023 continuamos a receber participações de sinistro relacionadas com estes eventos”.
O conhecimento deste risco levou o Grupo a criar, em 2019, a Ageas Repara, uma empresa especializada que realiza serviços de diagnóstico, assistência técnica e soluções tecnológicas no âmbito das habitações e comércio, nomeadamente nos danos por água, dada a importância destas como causa de sinistros dos seus segurados.
Nem tudo são más notícias para as seguradoras
Se os custos de sinistros derraparam também as receitas subiram 7% em 2022, um efeito dos capitais seguros terem subido automaticamente. “Até ao momento, não estamos a antecipar quaisquer aumentos adicionais devido a estes acontecimentos”, comenta a Ageas Seguros. Já a Allianz Portugal “tem vindo a ajustar a política de preços e as coberturas da oferta que tem em comercialização”, enquanto a Aegon Santander parece satisfeita com as subidas automáticas dos capitais seguros.
Esta automatização decorre de uma recomendação trimestral realizada pela ASF, entidade supervisora do setor. É um indicador para as seguradoras de quanto devem atualizar os capitais seguros de cada apólice de seguros multirriscos habitação para evitar a aplicação da regra proporcional.
Esta regra proporcional é aplicada quando há subseguro, ou seja, quando o capital seguro é inferior ao custo de reconstrução, no caso de edifícios, ou ao custo de substituição por novo, no caso de mobiliário e recheio. No seu site, a ASF, exemplificando, alerta: “se um edifício cujo custo de reconstrução é de 100.000 euros estiver seguro por 80.000 euros, o segurador será responsável apenas por 80% de qualquer nível de prejuízos, ficando os restantes 20% a cargo do segurado”.
No primeiro trimestre deste ano os valores devem subir 14,17% relativamente a igual período do ano passado quanto a edifícios e 8,15% a valorização do recheio de habitação. No conjunto, no designado Índice de Recheio de Habitação e Edifícios (IRHE), a taxa de atualização a utilizar nos capitais seguros é de 12,32%. Esta atualização é automática, exceto se o segurado manifestar vontade de não atualizar os capitais seguros e arriscar receber apenas uma parte da indemnização em caso de sinistro.
De todo o modo, Tiago do Couto Venâncio destaca de toda esta época adversa que o awareness e perceção de utilidade por parte dos clientes para os seguros de habitação indiscutivelmente aumentou.
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