ASF desvenda o perfil ideal para os gestores de seguros e fundos de pensões
É preciso ser qualificado, idóneo, disponível e independente para poder gerir empresas de seguros. Está agora regulado o que significam essas competências de fit & proper para o supervisor.
Obter transparência e consistência na avaliação dos administradores e gestores de topos das empresas de seguros e fundos de pensões foram os principais objetivos da Circular Orientações da ASF Relativas à Avaliação e Registo Prévio para o Exercício de Funções Reguladas, emitida pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) e agora publicada.
Administradores, diretores de primeira linha, membros de órgãos de fiscalização das empresas de seguros nacionais e estrangeiras a operar em Portugal e responsáveis por funções-chave das seguradoras e gestoras de fundos de pensões, são obrigados a registo prévio na ASF, e têm de ter os seus nomes aprovados de acordo com os seus méritos específicos para exercerem a atividade.
Como a avaliação da sua qualificação, idoneidade, disponibilidade e independência é fundamental para os seus nomes serem aprovados, a ASF produziu este documento que estabelece os critérios a serem seguidos internamente por quem avalia e pelas empresas de seguros para que façam o trabalho prévio e proponham dirigentes que não colidam com o perfil exigido.
O Supervisor salienta que as orientações agora divulgadas consideraram o quadro legal e regulamentar vigente nacional e o de Direito da União Europeia, bem como um conjunto alargado de outras orientações, guias e manuais de recomendações e boas práticas em matéria de supervisão do sistema de governação, não só do setor segurador, como de outras entidades financeiras.
O que é um gestor qualificado, idóneo, disponível e independente
A Qualificação é especialmente relevada, no que toca aos conhecimentos teóricos, a posse de habilitações em certos setores mais ligados às atividades típicas das entidades supervisionadas, como o dos seguros, financeiro, economia, gestão, contabilidade, Direito, matemática, ciências atuariais ou estatística.
Quanto a experiência prática, a ASF valoriza cargos ou funções que a pessoa tenha desempenhado em entidades da mesma natureza ou envolvendo responsabilidades semelhantes. Os fatores avaliados incluem: o tipo de cargos ou funções anteriores, a respetiva duração e as entidades envolvidas.
Para o supervisor os traços de um padrão comportamental idóneo de um gestor de seguros ou de fundos de pensões são a capacidade a de contribuir para uma gestão sã e prudente, de decidir de forma ponderada e criteriosa dentro de critérios de racionalidade, de cumprir pontualmente as suas obrigações e de agir de modo compatível com a preservação da confiança do mercado.
Quem tem processos legais pode ser gestor? Pode, mas…
Para a ASF é valorada, para a análise de idoneidade de um gestor, uma simples “acusação” na qual estarão reunidos e desenvolvidos os indícios determinantes de processos, de natureza judicial, administrativa ou disciplinar, em curso. O legislador entendeu que este é um facto que tem obrigatoriamente de ser considerado na avaliação de idoneidade.
No entanto, a acusação não assume, pela sua natureza, uma gravidade semelhante à de uma “condenação”, e esta, por seu turno, à de uma condenação transitada em julgado, ou a outras circunstâncias confirmadas ou irreversíveis, com maior peso valorativo.
Pelo contrário, o facto de um processo judicial, administrativo ou disciplinar, findar com uma decisão favorável ao avaliado, não implica que a ASF conclua pela sua idoneidade, dada a prevalência do mérito sobre o tratamento processual. O supervisor terá de perceber o que motivou a decisão favorável, se um juízo efetivo sobre a ilicitude ou a culpa, ou se pormenores de cariz exclusivamente processual ou formais, como a desistência ou a transação.
Para efeitos da avaliação da idoneidade, e segundo as diferentes circunstâncias relevantes, as entidades supervisionadas e a ASF podem servir-se de fatores:
- agravantes: natureza da infração – em especial com a conexão aos mercados financeiros -, a sua ligação ao desempenho de funções reguladas ou de especial confiança – como é o caso de funções de administração -, a reincidência, a culpa especialmente grave – dolo -, a recusa do avaliado em prestar esclarecimentos ou fornecer elementos que lhe sejam solicitados e, de um modo geral, a postura de não cooperação;
- atenuantes: o caráter não definitivo da sanção – se ainda admite recurso -, a limitação dos efeitos da infração – não atinge diretamente o exercício de funções reguladas ou de especial confiança -, o seu caráter isolado ou antiguidade – período de tempo decorrido desde a última infração, que pode levar, inclusive, à prescrição da responsabilidade -, a culpa reduzida -negligência -, o comportamento colaborante ou outras evidências de reabilitação do avaliado -como a assunção da responsabilidade -, a adoção de medidas de restauração do dano ou a cooperação com autoridades judiciais ou administrativas.
A disponibilidade traduz-se, num primeiro nível, na capacidade de o avaliado assumir uma determinada função, por não existir risco grave de conflito de interesses face às funções já desempenhadas. Num segundo nível, se essa acumulação, permite dedicar-lhe tempo suficiente.
Ser identificado um risco de conflito de interesses não significa que o avaliado não possa ser registado para o exercício da função. Tal apenas sucederá se o risco for considerado “material” e se não for possível preveni-lo ou mitigá-lo.
Quanto à disponibilidade de tempo, esta pressupõe uma avaliação quantitativa, através da avaliação do número de cargos ou funções desempenhadas, para se julgar se a pessoa pode dedicar o mínimo de tempo razoável ao exercício da função objeto de registo. Também é realizada uma avaliação qualitativa da disponibilidade de tempo estimada, tendo em vista apurar se a mesma se coaduna com as exigências concretas da função objeto de registo e de acordo com as características da entidade.
Uma referência da ASF quanto à carga de funções de gestão acumuladas indica que, no total, o trabalho de um gestor não deve exceder uma média de 60 horas semanais
Não existe uma limitação legal do número de cargos ou funções que uma mesma pessoa pode acumular. São as entidades supervisionadas que têm de, caso a caso, assegurar que a pessoa é capaz de disponibilizar tempo suficiente a um correto exercício da função e ao cumprimento de todas as responsabilidades inerentes, o que implica que conheça o seu negócio, estratégia, riscos e procedimentos e que, se necessário, reforce a disponibilidade em períodos específicos, de crise ou de intensificação da atividade como por exemplo, em cenários de fusões, aquisições ou reestruturações. Outra referência da ASF à carga de funções acumuladas indica que, no total, o trabalho de um gestor não deve exceder uma média de 60 horas semanais.
A independência exprime a capacidade de o avaliado exercer as suas funções com isenção, não estando sujeito à intervenção, pressão ou influência de terceiros. É relevante a pesquisa ou declaração de existência de laços pessoais, profissionais e ou económicos.
Contudo, a existência de fatores prejudiciais da independência de um determinado membro do órgão de administração de uma entidade supervisionada não é impeditivo do seu registo. A decisão final da ASF atenderá, sobretudo, à explicação dada pela entidade, que suporte que a capacidade de atuação isenta do avaliado não se encontra significativamente comprometida, aliada ao seu percurso profissional e aos traços comportamentais evidenciados ou conhecidos, em especial se a pessoa forma opiniões próprias, é capaz de resistir à mentalidade de grupo, é ativa na forma como exerce as suas funções e se não existem indícios ou situações passadas que sugiram o contrário.
O que pretendeu a ASF com esta circular
O supervisor decidiu tipificar estas orientações, destinando-as um público-alvo interno, a própria ASF, e externo que são os operadores ou entidades supervisionadas, com o objetivo de :
- melhorar a avaliação, pela ASF, da adequação das pessoas propostas para o exercício de funções reguladas;
- uniformizar as avaliações, quer as realizadas pela ASF – avaliações de segunda linha -, quer as realizadas pelas entidades supervisionadas – avaliações de primeira linha;
- aumentar a disciplina das entidades supervisionadas, previamente à apresentação de um requerimento de registo prévio, evitando que este venha incorretamente instruído ou que sejam apresentados a registo candidatos que não preenchem os requisitos de adequação aplicáveis;
- remediar fragilidades procedimentais e práticas que a ASF tem vindo a identificar;
- tornar mais transparente a atuação da ASF, quanto às regras e princípios em que se baseia esta atuação e aos entendimentos internos adotados;
- reforçar a aplicação do princípio da proporcionalidade, através de uma abordagem de supervisão consistente, isto é, com requisitos e exigências similares para entidades com natureza, dimensão e complexidade de riscos semelhantes;
- reforçar o sistema de governação, garantindo que as entidades supervisionadas são dotadas de recursos humanos adequados a uma gestão sã, prudente e profissional.
Obrigações abrangem centenas de gestores de seguros e pensões
Para as empresas de seguros ou de resseguros com sede em Portugal, devem ser avaliados os membros do órgão de administração e outras pessoas que dirijam efetivamente a empresa, os membros do órgão de fiscalização, o revisor oficial de contas (ROC) a quem compete a certificação legal de contas da empresa e os diretores de topo, os que constituem a primeira linha hierárquica da empresa.
Devem ainda ser previamente analisados o atuário responsável, os responsáveis por funções-chave, incluindo, obrigatoriamente, a Gestão de Riscos, Verificação do Cumprimento (compliance), Auditoria Interna e Atuarial. As empresas ou a ASF podem ainda identificar outras funções-chave como Encarregado de Proteção de Dados (DPO) e a pessoa responsável pela aplicação das políticas e procedimentos de adequação dos membros do órgão de administração responsáveis pela atividade de distribuição de seguros e de resseguros.
Para as Sociedades Gestoras de Fundos de Pensões (SGFP), com sede em Portugal, são verificados os membros do órgão de administração e outras pessoas que dirijam efetivamente a empresa, os membros do órgão de fiscalização e o revisor oficial de contas. São ainda objeto de análise os responsáveis pelas funções-chave de gestão de riscos, de verificação do cumprimento e de auditoria interna, podendo as sociedades ou a ASF identificar outras funções-chave, tal como no caso das empresas de seguros ou de resseguros.
Para as empresas participantes, incluindo as sociedades gestoras de participações no setor dos seguros, que integrem um grupo supervisionado pela ASF, são analisados os membros do órgão de administração e outras pessoas que dirijam efetivamente a empresa, os membros do órgão de fiscalização, quando exista, o ROC e o atuário responsável.
As sucursais de empresas de seguros ou de resseguros com sede em Portugal apenas precisam de ver aprovado o nome do seu mandatário geral. Já as mesmas empresas com sede num país terceiro à União Europeia necessitam de fazer aprovar o mandatário geral e o seu substituto, o ROC, os diretores de topo, os responsáveis por funções-chave e o atuário responsável.
Veja na íntegra esta Circular N.º 2/2023 Orientações da ASF Relativas à Avaliação e Registo Prévio para o Exercício de Funções Reguladas aqui .
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