Soltaram o ChatGPT. IAgora?

A inteligência artificial (IA) vai tirar-nos o emprego? Não subitamente, mas há transformações importantes a ocorrer. Para já, a maior desvantagem do ChatGPT é não ser um humano.

A inteligência artificial (IA) vai tirar-nos o emprego?

É uma questão que surge de tempos em tempos e que voltou a estar na berlinda, à medida que cada vez mais gente vai testando as capacidades de ferramentas como o ChatGPT. Foi também uma das perguntas que me fizeram recentemente e que me levaram a refletir um pouco sobre o assunto. À primeira análise, gostaria de responder: “Espero que sim!” Mas o tema é bem mais complexo do que isso.

A propósito, o Financial Times noticiou esta semana uma relatório de research do Goldman Sachs, um banco norte-americano, que nos dá alguns números e extrapolações. De acordo com os autores Joseph Briggs e Davesh Kodnani, os avanços mais recentes no campo da IA generativa poderão conduzir à automatização de um quarto do trabalho feito nos EUA e na Zona Euro, com ganhos ao nível da produtividade.

Segundo o jornal, os autores estimam um aumento de 7% no PIB anual global num período de dez anos graças a este tipo de tecnologia e colocam um número na quantidade de empregos que poderão ser afetados por esta transformação: 300 milhões de trabalhos a tempo inteiro nas economias mais desenvolvidas, especialmente em áreas como o trabalho administrativo e a advocacia. Eu acrescentaria, talvez, a programação.

Neste tipo de coisas, raramente há uma resposta definitiva e ninguém é capaz de prever o futuro. Mas é possível apresentar alguns argumentos e ideias dentro dos limites da razoabilidade.

Primeiro, pelas suas capacidades correntes e abrangência das mesmas, parece-me evidente que este tipo de tecnologias poderá ter um impacto profundo na forma como trabalhamos, e não só. Mas nunca é demais reforçar que existem riscos e ninguém parece saber ao certo quais as potenciais consequências dos mesmos. Ficarão mais claros com o tempo, porque, agora, nada vai travar o avanço desregulado de empresas como a Microsoft e a Google, nem mesmo a “carta aberta” dos gestores que pintou as páginas dos jornais esta semana, incluindo de Elon Musk, que não dá ponto sem nó e sabe isso melhor do que ninguém.

Por isso, em segundo lugar, sim, estes programas poderão, a prazo, substituir os humanos em algumas tarefas. É razoável acreditar que o mercado de trabalho vai adaptar-se gradualmente à inovação que for surgindo. Por outras palavras, este processo, provavelmente, não acontecerá subitamente e não começou agora. É uma adaptação constante que vai acontecendo. E, sendo seguro que o ChatGPT e família já estão a mudar a forma de muita gente trabalhar, é improvável que se torne, no imediato, na origem de uma vaga de despedimentos em massa ou coisa parecida.

Como será um mercado de trabalho dominado pela IA? Algumas teorias circulam em torno da ideia de que será necessário os “donos” dos robôs pagarem algum tipo de imposto para ajudar a financiar uma espécie de rendimento básico universal. Mas estamos no campeonato da pura especulação, apesar de ser uma discussão importante que a sociedade civil deve ter.

Tenho refletido ainda, por fim, sobre o impacto de tudo isto no meu próprio setor. Para tal, socorro-me da minha própria experiência. Tudo isto pode mudar, mas, à data, o ChatGPT está muito longe de substituir o trabalho de um bom jornalista.

Talvez seja capaz de produzir alguns textos mais básicos, mas a tecnologia não tem o conhecimento nem o poder de raciocínio para produzir informação de qualidade, e isso começa logo no facto de não ter qualquer pudor em mentir. O ChatGPT até pode conseguir gerar conteúdo em massa para as redes sociais ou para alimentar um blogue, ou ser excelente a idealizar campanhas publicitárias, mas, do ponto de vista noticioso, carece de conteúdo, de sumo, de substância.

Se redigir uma notícia partindo apenas de um pedido, mesmo que inclua citações de pessoas relevantes, tendem a ser inventadas ou recolhidas e publicadas no passado por jornalistas. No final, o programa até pode sugerir ângulos, melhorar textos, recomendar pessoas de interesse a contactar. Geralmente, não sabe como as alcançar, nem agenda entrevistas.

Em conclusão, ao contrário de outras tecnologias que causaram grande euforia e já quase ninguém fala delas, a IA é, para mim, verdadeiramente transformadora. Mas, para já, a sua maior desvantagem, provavelmente, é não ser um humano.

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