Weber Gameiro revela que deixou gestão da TAP por falta de seguro e contrato

O antigo administrador financeiro afirmou na CPI à TAP que renunciou ao cargo por não ter seguro de responsabilidade dos gestores com valor adequado ou contrato de gestor público.

João Weber Gameiro, que foi administrador financeiro da TAP entre 24 de junho e 30 de outubro de 2021, revelou na comissão parlamentar de inquérito (CPI) que deixou a companhia aérea por não ter um seguro de directors & officers com um valor adequado ou um contrato de gestão que garantisse a proteção da responsabilidade dos gestores.

Na sua curta declaração inicial, o antigo CFO da TAP, sublinhou que exerceu o cargo por ter sido eleito em assembleia geral, mas “sem contrato”. Hugo Carneiro, do PSD quis saber porque tinha salientado a ausência do contrato. “Foi uma das razões pelas quais renunciei”, explicou Weber Gameiro.

Quando a sua renúncia prematura foi anunciada, no final de setembro de 2021, o Ministério das Finanças e o Ministério das Infraestruturas e da Habitação divulgaram um comunicado onde lamentaram que, “por motivos pessoais imprevisíveis, a colaboração [de Weber Gameiro] na gestão da TAP tenha sido interrompida”. Não foi dada mais qualquer outra explicação.

“A empresa tem este quadro que descrevi. Para além disso tínhamos as relações da TAP SGPS com a TAP SA, que depois ficou com apenas 8% da TAP SA, a necessidade de aportar fundos ao Brasil, o endividamento, os incumprimentos técnicos dos contratos de financiamento. Era uma situação exigente do ponto de vista contratual e da lei“, apontou o antigo administrador financeiro.

A falta de um seguro de directors & officers tornou-se para o gestor uma situação inultrapassável face às responsabilidades da empresa que tinha mais de dois mil milhões de endividamento, 100 aeronaves, mais de 9.000 trabalhadores, dois mil milhões em financiamentos da frota, enumerou. “Achei que era fundamental ter um seguro. Não é que ter um seguro nos permita ser negligente”.

“As consultas internas que fazia era que não era possível aumentar o seguro”, explicou, considerando que era “fundamental por via do contrato de gestão salvaguardar os administradores”. O gestor explicou que, por causa da crise na aviação e da situação financeira da TAP, as seguradoras baixaram muito os capitais cobertos e não havia quem quisesse fazer um contrato com valores mais altos.

Quem estava a tratar desse tema era o presidente do Conselho de Administração, mas Weber Gameiro considerou que “não ia acontecer, porque não era prática”. Havia uma “desconformidade entre a minha forma de ver, aquilo que eram as responsabilidade, e aquilo que podia ter”, afirmou, acrescentado que foi um “elemento relevante na decisão”.

O antigo administrador financeiro (CFO) tinha afirmado antes que nunca teve dúvidas de que à TAP e a si próprio se aplicava o Estatuto do Gestor Público (EGP) ou a própria natureza da companhia aérea como sendo uma empresa pública.

“Pelo meu lado, tive conhecimento do EGP antes de integrar os órgãos sociais da TAP e do decreto-lei 133.º que rege as empresas públicas. Não o conheço em detalhe, mas tinha consciência das responsabilidades inerentes”, disse. Do que se recorda, o tema não foi discutido na comissão executiva.

Sabia também da necessidade de serem celebrados contratos de gestão. “Levantei essa questão quando estavam a findar três meses após o período de 24 de junho. De acordo com o EGP se não existir contrato de gestão há um risco de nulidade”, contou aos deputados. “Estava preocupado com a eficácia do que eu assinasse”, acrescentou.

“Tive uma conversa com o presidente do conselho de administração e ele fez uma consulta. O que me disse foi que várias empresas públicas portuguesas funcionam sem contrato de gestão ou não têm contrato de gestão”, disse ainda.

“Não assisti a nenhuma situação de conflito” na administração

“Durante o período em que estive na TAP não assisti a nenhuma situação de conflito ou pré-conflito entre qualquer elemento do conselho de administração e da comissão executiva da TAP”, afirmou João Weber Gameiro, que integrou a equipa de Christine Ourmières-Widener e onde estava também Alexandra Reis.

“Cada um apresentava pontos de vista e às vezes não concordávamos de imediato. Tivemos momentos tensos mas não posso dizer que houvesse situação de conflito entre qualquer membro da administração“, acrescentou o gestor, que também foi responsável para as relações com o mercado de capitais.

Weber Gameiro disse aos deputados que a relação com a tutela era apenas com o Ministério das Finanças e nunca necessitou de contactar o Ministério das Infraestruturas e da Habitação. “O foco do meu diálogo era com o Ministério das Finanças, era com o secretário de Estado do Tesouro, Miguel Cruz, membros do seu gabinete e a Direção-Geral do Tesouro e Finanças”, relatou.

As relações eram boas. “Senti que tive sempre colaboração. A disponibilidade por vezes não era imediata mas as coisas eram acompanhadas. Não senti situação de ausência de resposta”, afirmou. Na sua audição, o presidente do Conselho de Administração, Manuel Beja, queixou-se de falta de resposta do ministério então liderado por João Leão.

Chegou a estar prevista também para esta quinta a audição da diretora jurídica da TAP, Manuela Simões. Segundo afirmou à agência Lusa uma fonte da comissão de inquérito, a responsável invocou sigilo profissional para não ser ouvida pelos deputados. O Parlamento irá pedir ao tribunal o levantamento do sigilo.

A comissão parlamentar de inquérito para “avaliar o exercício da tutela política da gestão da TAP” foi proposta pelo Bloco de Esquerda e aprovada pelo Parlamento no início de fevereiro com as abstenções de PS e PCP e o voto a favor dos restantes partidos. Nasceu da polémica sobre a indemnização de 500 mil euros paga a Alexandra Reis para deixar a administração executiva da TAP em fevereiro de 2022, mas vai recuar até à privatização da companhia em 2015. Tomou posse a 22 de fevereiro e vai estender-se até 23 de julho.

(notícia atualizada às 19h)

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