Governo cede a médicos e aceita repor 35 horas semanais nas urgências
Ministério da Saúde diz que esta medida"não pode significar a diminuição de acesso a cuidados de saúde e da capacidade de resposta do SNS [Serviço Nacional de Saúde]".
O Ministério da Saúde compromete-se a repor as 35 horas semanais para os médicos dos serviços de urgência e reduzir progressivamente o horário naquela atividade, mas adverte que tal não pode prejudicar o acesso a cuidados de saúde.
Num documento enviado pelo Governo aos sindicatos dos médicos, a que a Lusa teve acesso, o Ministério da Saúde destaca que a redução do horário de trabalho dos médicos e do número de horas de atividade no serviço de urgência “não pode significar a diminuição de acesso a cuidados de saúde e da capacidade de resposta do SNS [Serviço Nacional de Saúde]”.
O executivo cede à reivindicação das 35 horas de trabalho semanais, mas coloca condições para não pôr em causa o atendimento no SNS. Se for aceite, a medida abrangerá de imediato os médicos dos serviços de urgência, sendo depois gradualmente aplicada a todos os outros.
“Exige-se, por isso, um compromisso das duas partes em relação a esta matéria, que é condição essencial para que as referidas alterações possam vir a ser consideradas”, refere o ministério tutelado por Manuel Pizarro.
Na contraproposta enviada aos sindicatos, a tutela compromete-se a consagrar o horário semanal de 35 horas aos médicos do serviço de urgência, e posteriormente aos médicos de outros serviços, mas destaca que “o devido descanso compensatório não pode implicar o prejuízo do cumprimento do horário de trabalho semanal, sob pena de provocar uma perda de carga horário global incompatível com o funcionamento dos serviços”.
O Ministério da Saúde admite também indexar a “redução progressiva” de 18 para 12 horas semanais no serviço de urgência, desde que se verifique a “diminuição da dependência do SNS da realização de trabalho em horas extraordinárias e em regime de prestação de serviço”.
A reorganização dos serviços de urgência, através da criação de Centros de Responsabilidade Integrados e de equipas dedicadas à urgência nos diversos hospitais do país é outra das propostas da tutela, assim como criar condições para o alargamento do horário de funcionamento das Unidades de Saúde Familiar (USF) “possibilitando o acesso dos utentes em situação de doença aguda não urgente e reduzindo a necessidade de recurso aos serviços de urgência hospitalares”.
“Esperamos ter condições para evoluir, em conjunto, na direção de um acordo que, constituindo uma valorização da profissão médica e melhoria das condições de trabalho das equipas clínicas permita, em simultâneo, melhorar a capacidade de resposta do SNS. É isso que os portugueses nos exigem!”, acrescenta.
O governo realizou este domingo uma nova ronda negocial com a Federação Nacional dos Médicos (Fnam) e o Sindicato Independente dos Médicos (SIM), após uma reunião inconclusiva na passada sexta-feira.
Os dois sindicatos apresentaram à tutela uma contraproposta negocial na qual exigem a reposição do horário semanal de 35 horas para todos os médicos que assim o desejem e das 12 horas semanais de trabalho no Serviço de Urgência, bem como um aumento salarial transversal de 30%.
As negociações entre o Ministério da Saúde e o SIM e a Federação Nacional dos Médicos Fnam iniciaram-se em 2022, mas a falta de acordo tem agudizado a luta dos médicos, com greves e declarações de escusa ao trabalho extraordinário além das 150 horas anuais obrigatórias, o que tem provocado constrangimentos e fecho de serviços de urgência em hospitais de todo o país.
Esta situação levou o diretor executivo do SNS, Fernando Araújo, a avisar que se os médicos não chegarem a acordo com o Governo, novembro poderá ser o pior mês em 44 anos de SNS.
O secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) manifestou-se este domingo preocupado com a proposta apresentada pelo Governo antes de regressarem à mesa das negociações e para o qual está a ser preparada uma contraproposta.
“Numa primeira análise devo dizer que estamos seriamente preocupados com essa proposta” apresentada este sábado pelo Ministério da Saúde, disse à agência Lusa Jorge Roque da Cunha.
Desde logo, continuou, porque “vai ao arrepio daquilo que foi dito na última reunião negocial” e “há um sentimento de deceção, porque, como é evidente, se a situação se mantiver, como tem estado (…) a situação vai agravar-se”.
“Parece-me que o Governo está totalmente insensível em relação ao que está a ocorrer em todo o país, na dificuldade nas escalas de urgência, das consultas externas e das cirurgias que são adiadas e no número de utentes sem médico de família”, acusou.
O sindicalista acusou o Governo de não aproveitar a disponibilidade apresentada pelo SIM e pela Federação dos Médicos de uma “cedência importantíssima que era a calendarização de três aspetos que ocorreram no período da troika”.
“Na transição, de uma forma faseada, para 35 horas de trabalho, tal como todos os funcionários públicos; diminuição da carga de urgência na carga de trabalho, permitindo, dessa forma, criar condições para que as cirurgias programadas e as consultas faça, claramente, uma menor pressão junto da urgência e, ao mesmo tempo, fazer uma reposição salarial, também faseada no tempo”, enumerou.
Permitir-se-ia desta forma, continuou, “criar estas três condições para que os médicos deixem de sair do Serviço Nacional de Saúde” como aconteceu em 2022, quando “cerca de 1.100 rescindiram” e, este ano, “espera-se a reforma de 1.200”.
“Esta preocupação é fundada, é uma preocupação muito responsável, porque abdicamos de exigir imediata reposição e, pelos vistos, o Governo não tem essa perceção”, alertou.
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