“Governo deve ter estabilidade durante quatro anos”

O próximo Governo deve ter condições para governar durante toda a legislatura, pede Carlos Mota Santos, CEO da Mota-Engil. A prioridade económica deveria ser uma política de internacionalização.

Carlos Mota Santos, presidente da Mota-Engil há quase um ano, revela em entrevista ao ECO que a sucessão estava a ser preparada e planeada há muito tempo. E qual é o desafio da sua liderança? “É entregar à quarta geração uma empresa melhor do que aquela que a terceira recebeu, porque foi assim que segunda geração fez. Isso é o grande desafio, é o grande desafio de corresponder ao legado que temos“.

Atento à vida política e de governação do país, o gestor pede, em primeiro lugar, que o Governo tenha condições para governar durante a legislatura de quatro anos. “É importante que seja estável e que o próximo Governo consiga ter condições de governar durante a legislatura de quatro anos e, nesse sentido, trazer aquilo que é importante para as empresas, que é um quadro de previsibilidade e de estabilidade“. E nas prioridades do próximo Governo, deve estar uma política clara de apoio à internacionalização das empresas, e mudanças na educação e na saúde.

Tomou posse como presidente da Mota-Engil em fevereiro deste ano. Como é que foi este primeiro ano de liderança?

Diria que foi o mais pacífico possível porque foi uma transição há muito planeada, uma transição planeada não só com o meu tio, engº António Mota, com o Gonçalo [Moura Martins], com o saudoso Jorge Coelho, com a terceira geração da qual eu faço parte, mas também com os meus primos. Por isso, foi um movimento absolutamente natural que estava planeado ser no início de fevereiro, e assim foi. Acho que, em termos internos, toda a gente estava à espera, percebia-se e sabia-se. Em termos externos também acho que foi bem aceites. Correu bem e acho que a terceira geração está a dar conta do recado.

Qual é o maior desafio?

O maior desafio que tenho é estar à altura daquilo que são as expectativas, menos internas, porque tenho 45 anos e trabalho 45 anos na empresa, por isso conheço bem a empresa e a empresa conhece-me muito bem. Mas sobretudo do ponto de vista externo, provar que as empresas familiares conseguem conjugar gestores profissionais com gestores que vêm da família e que os gestores da família, se provarem que têm essa valência, essa capacidade de análise e o mérito…

…como é que se fez a preparação?

Eu comecei a trabalhar na empresa desde muito cedo e fiz o percurso todo dentro da empresa. Eu, à semelhança de vários primos meus, um dos quais está comigo a comissão executiva, que é o Manuel Mota, vice-presidente da comissão executiva. O percurso todo, digamos, normal, de um jovem engenheiro dentro da empresa, passai pelas obras, pela produção,

Esteve no chão de fábrica, neste caso no chão da construção.

Estive na lama, como se costuma dizer, e continuo a gostar muito, continuo a andar com as botas e o capacete na mala do carro.

Vai às obras?

Ainda hoje estive numa obra de manhã. Foi um percurso natural, tendo cada vez mais responsabilidades ao longo do tempo. Mas deixe-me responder sobre o desafio que a terceira geração tem…. É entregar à quarta geração uma empresa melhor do que aquela que a terceira recebeu, porque foi assim que segunda geração fez. Isso é o grande desafio, é o grande desafio de corresponder ao legado que temos. A segunda geração, o meu tio [António Mota] em particular, a minha mãe e as minhas tias tomaram conta da empresa após a morte do meu avô e entregou à terceira geração, a mim e aos meus primos, uma empresa bem maior, bem melhor do que tinha recebido. A nossa obrigação é, daqui a muitos anos, uma empresa ainda melhor à quarta geração.

É chairman e presidente executivo de uma empresa familiar que tem como acionista de referência uma outra empresa, a CCCC, que é das maiores construtoras do mundo. Como é que se gere neste contexto?

Uma das grandes das grandes valências, dos grandes valores que a Mota-Engil tem, é de facto ser uma empresa com um cunho familiar, é uma empresa com rosto. É um rosto da família quando as coisas correm mal, quando correm bem, é muito fácil. Quando corre mal é que a família aparece e assume as suas responsabilidades em nome da empresa. E nesse sentido, é uma empresa com uma cultura familiar, pese embora seja uma empresa com 51 mil colaboradores. Ou seja, seremos provavelmente os grupos portugueses com maior número de colaboradores, sendo certo que uma parte muito significativa, cerca de 40 mil, é fora de Portugal. E somos o maior empregador português fora de Portugal.

Mas como se compatibiliza a liderança da empresa familiar com um acionista que é um gigante?

Este cunho familiar, esta forma de conseguir conjugar gestão profissional com uma responsabilidade social e com uma responsabilidade para com as famílias, é um dos maiores valores que a empresa tem. E, nesse sentido, a própria CCCC percebeu que a Mota-Engil é uma empresa muito particular, com uma marca muito particular e com um cunho muito pessoal e muito específico. E de facto, conseguiu perceber que, sendo acionista desta empresa, a poderia potenciar, e potenciar também para si própria oportunidades…

Preservando esses valores?

Preservando esses valores. E o exemplo disso é que, de facto, esta sucessão que ocorreu este ano foi planeada e, a determinada altura, foi planeada também com a própria CCCC, que entrou no capital durante esse processo de planeamento.

O país vai ter eleições no dia 10 de março. Que políticas é que o país precisa para aumentar a competitividade do país?

Bem, antes de falar sobre prioridades, acho que o que é importante é de facto que tenhamos um quadro político de estabilidade, e longo, com duração. Por isso, qualquer que seja a solução governativa que que venha a ser eleita no dia 10 de março, é importante que seja estável e que o próximo Governo consiga ter condições de governar durante a legislatura de quatro anos e, nesse sentido, trazer aquilo que é importante para as empresas, que é um quadro de previsibilidade e de estabilidade. E, nesse sentido, que é o pano de fundo…

…quais devem ser as prioridades?

Essa previsibilidade e essa estabilidade são necessárias para conseguir implementar as políticas que vierem a ser definidas e implementadas de forma mais célere. Há áreas que é importante atentar, como gestor, nomeadamente sob o ponto de vista fiscal, obviamente, sob o ponto de vista do investimento público, com certeza. Mas acho que há outras áreas que é muito importante atentar.

Quais?

O apoio à internacionalização das empresas, ou seja, é preciso ter uma agenda de internacionalização dos nossos setores da economia.

Não vê isso? Ou vê pouco?

Acho que temos termos visto pouco, pelo simples facto de a legislatura voltar a ser interrompida. Ou seja, não temos tido essa estabilidade que deveríamos ter. Por isso, é importante ter uma agenda de internacionalização da economia portuguesa. Nós temos empresas muito boas… Eu não gosto muito de distinguir aquelas que são as grandes, pequenas e médias empresas.

Porquê?

Eu acho que existem dois tipos de empresas, as boas e as más. As boas empresas e as más…

Mas as boas empresas não resultam, sobretudo, da escala?

É essencial. As empresas portuguesas têm diversos problemas, e um dos problemas é a falta de escala, e para ganhar escala, há duas formas que podem ser conjugadas: É internacionalizarem-se e é ganharem escala através de fusões. A Mota-Engil é um exemplo disso, é o produto da fusão de duas empresas. Em Portugal, em diversas áreas e obviamente, atentando às questões da concorrência, é possível ganhar escala.

Há uma certa resistência às fusões.

Há uma cultura empresarial avessa a esse tipo de associação, mas se reparar, em Espanha todas as empresas do setor das infraestruturas foram produtos de várias fusões, ou seja, ganharam escala através da conjugação de fusões e de uma política de internacionalização que foi apoiada, e tem sido apoiada, pelo Estado espanhol, independentemente dos ciclos legislativos. Por isso, devemos copiar as coisas boas que vemos noutros países, nomeadamente a política de internalização da economia espanhola.

Por outro lado, há duas áreas em que é preciso atentar, para além destas questões económicas, Uma é na educação. Teremos um país muito melhor quanto melhor for a educação da nossa população, dos nossos quadros, dos nossos trabalhadores. É fundamental, e acho que é uma aposta que o país tem que fazer. Eu gosto muito do exemplo da Coreia do Sul, quando, após a Guerra da Coreia e da separação entre a Coreia do Norte e Coreia do Sul, a Coreia do Sul era um país iliterado, quase iliterado. E de facto, houve uma grande aposta, um grande investimento na educação, E depois, por outro lado, é o problema a que assistimos todos os dias, é o problema do Saúde, que, de facto, independentemente de qual seja o Governo, tem de ser uma prioridade política.

  • Diogo Simões
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