Editorial

Cheira a TAP nos CTT

As Finanças têm a obrigação de divulgar o despacho que determinou a intervenção da Parpública na compra de ações de uma empresa cotada.

Ainda se sabe pouco da história, mas o que se sabe faz-nos lembrar o que sucedeu com a TAP em 2022 com o despedimento de uma gestora, o pagamento de uma indemnização, a informalidade na gestão e as empresas públicas ao serviço de interesses partidários. A Parpública terá andado a comprar no mercado ações dos CTT com base num despacho do ministro João Leão, aparentemente para cumprir um acordo entre o Governo e o BE no âmbito da geringonça.

Os CTT, como a CGD, a TAP e a RTP, fazem parte de um restrito lote de empresas que são, para os portugueses, uma empresa pública qualquer que seja a natureza do seu capital. Para os portugueses em geral e para o PS, o BE e o Bloco de Esquerda em particular.

No caso dos CTT, refira-se, o Estado fez um ótimo negócio, vendeu a empresa por mais de 900 milhões de euros, a empresa foi reestruturada num contexto social difícil e só isso permitiu que hoje desse lucros (mérito de Francisco Lacerda, especialmente). Se estivesse no universo do Estado, obviamente estaria como estava há dez anos, e estaríamos todos a subsidiar a empresa com impostos, para responder a todas as pressões políticas num negócio que está a mudar de forma rápida e tem ao mesmo tempo de manter um contrato de serviço público postal (a forma como está a ser regulado o cumprimento do contrato é outra história, para outro Login).

Em 2020 e 2021, com Pedro Nuno Santos no Ministério das Infraestruturas e João Bento já nos CTT, aumentava a tensão por causa da renegociação do contrato de serviço público postal. E o BE, no Parlamento, exigia a nacionalização dos CTT, uma agenda que, na verdade, esteve sempre presente no discurso bloquista e comunista, mas que encontrou nas infraestruturas quem estivesse mais disponível para a ouvir. Os sinais públicos do atual líder do PS eram de que o Estado poderia tomar uma posição no capital acionista dos CTT para chegar à administração e impor mudanças no negócio (faz-nos lembrar a TAP em 2015, não é?).

Um dos problemas que já são óbvios é a ordem à socapa, sem transparência, para uma intervenção numa empresa privada e cotada em bolsa, com milhares de acionistas.

O que se sabe agora é mais grave, e não foi desmentido. Segundo o jornal económico, o ministro João Leão, presume-se articulado com Pedro Nuno Santos, emitiu um despacho que ficou escondido para obrigar a empresa pública Parpública a comprar ações dos CTT. Terá sido entre 2020 e 2021 e nunca foi comunicado ao mercado, nem sequer à empresa e aos seus órgãos de fiscalização. E como foi uma decisão da tutela, dispensou-se também uma avaliação prévia da UTAM, a unidade técnica das Finanças que avalia estas operações.

A que preço foram as ações compradas? E já foram vendidas? Com prejuízo? Como o Governo caiu, a Parpública não chegou a ter mais de 2% do capital e por isso não foi obrigada a fazer um comunicado ao mercado, mas as Finanças têm a obrigação de divulgar o despacho que determinou a compra das ações, as instruções exatas e os respetivos objetivos, para avaliar até que ponto foi usada uma empresa pública para fins aparentemente partidários.

Há muitas perguntas por responder, mas agora que estamos em campanha eleitoral, há uma que ressalta. Esta intervenção do Estado numa empresa cotada — percebe-se assim o que se passará em empresas sem o escrutínio das cotadas — terá sido um custo político de um acordo da geringonça. É isto que poderá voltar a estar em cima da mesa no dia 10 de março?

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