The Good, the Bad and the Ugly
O Protocolo de Família é um tema absolutamente crítico e que tem de merecer a maior dedicação dos acionistas na sua cuidadosa preparação e no seu rigoroso cumprimento.
O sucesso, a longevidade e a harmonia acionista de Grupos Familiares em todo o Mundo dependem cada vez mais do Protocolo de Família, conjunto de princípios e regras de regulação dos assuntos chave na relação entre acionistas. É um tema absolutamente crítico e que tem de merecer a maior dedicação dos acionistas na sua cuidadosa preparação e no seu rigoroso cumprimento.
Ao longo de décadas, temos vindo a identificar, estudar e elaborar Protocolos de Família em grandes e médias empresas sobretudo em Portugal. O título deste artigo, roubado ao icónico filme de Sérgio Leone, não foi escolhido por acaso – espelha de forma perfeita a situação com que nos temos deparado.
The Good
Os grupos familiares que desenharam o Protocolo seguindo as regras das melhores práticas e com peritos de gestão de empresas familiares, que o entendem e aceitam, que o cumprem de forma disciplinada e que mantêm o texto atualizado face às alterações de contexto interno ou externo. Os Protocolos de Família não são documentos jurídicos mas como estão assinados pelos envolvidos as suas disposições devem ser cumpridas por todas as partes e acabam por representar, na prática, um compromisso passível de aceitação como prova em tribunal. Faz sentido ter advogados de confiança envolvidos, mas limitados à garantia do alinhamento com peças jurídicas societárias do grupo e alguma sugestão pontual para o texto – dar-lhe mais poder do que isso pode prolongar enormemente a duração do processo sem justificação e facilmente se resvala para o segundo conjunto…
The Bad
Os grupos familiares convencidos que têm um Protocolo mas que estão enganados – têm um Pacto Social, Pacto de Acionistas ou outro documento jurídico rígido obra de advogados mas incompleto, com um conteúdo técnico que não consegue refletir adequadamente as aspirações, necessidades e compromissos de longo prazo do legado acionista para as gerações vindouras, têm algumas páginas com ideias genéricas mas obviamente insuficiente, têm um “queijo suíço” denso mas com buracos, têm um protocolo desatualizado há mais de uma geração e que já não reflete a realidade atual, ou falta-lhes um compromisso formal da geração seguinte por exemplo.
The Ugly
Recorrendo à idiomática brasileira, estes são os grupos que não estão nem aí. É uma situação mais comum do que se pensa e que afeta grupos familiares reputados, alguns até cotados. Há muitas razões para que isto aconteça: ou porque um líder autocrático quer gerir como acha melhor e não quer cá nenhuma democracia acionista; ou porque os acionistas acham que se dão bem, o negócio corre bem e recebem dividendos e por isso não é preciso formalizar nada; ou porque o negócio está nas mãos do fundador e ainda se acha que é cedo; ou porque o indispensável envolvimento dos acionistas e dos seus filhos/as maiores ao longo do processo pode levantar temas escondidos e incómodos que é melhor deixar dentro do baú – como nos dizia o Presidente de um grupo familiar “não quero abrir uma caixa de Pandora e andar por aí anos a gerir os estragos”
E o que caracteriza, afinal, um Protocolo de Família de referência alinhado com as melhores práticas como vemos no primeiro grupo? Tomamos a definição da ARBORIS:
O Protocolo de Família é o documento estruturante de governação acionista de um Grupo Empresarial Familiar que tem por missão clarificar regras de convivência acionista no seio da Família e face ao negócio, assegurando um ambiente de transparência e harmonia que estimule a valorização do negócio sob controlo da Família a longo prazo. Deve ser preparado sob liderança solidária da geração acionista no poder, mas com o envolvimento ativo da geração seguinte que lhe proporcione um verdadeiro sentido de ownership do Protocolo.
Neste contexto, não é possível que um bom Protocolo seja um documento sucinto. Por mais próximo que seja o relacionamento entre os atuais acionistas, há que ter em conta que as gerações seguintes terão muito mais membros e relações potencialmente mais distantes. Um Protocolo tem no mínimo 50 páginas e pode chegar a mais de 200 páginas. A figura seguinte mostra o índice de um Protocolo de Família preparado pela ARBORIS – poderá não ser legível, mas ilustra a variedade de tópicos cobertos pelo Protocolo e a extensão do conteúdo.
Exemplo do conteúdo de um Protocolo de Família
O Protocolo de Família é hoje uma plataforma de base fundamental na gestão e desenvolvimento da estrutura acionista de Grupos Empresariais Familiares em todo o Mundo. Portugal possui vários casos de referência que podemos classificar no “grupo dos bons”: as Famílias José de Mello, Amorim, Eusébio, Silva Rego, Jervell, Soares dos Santos, Vasconcelos da Mota, Carvalho Martins, Robertson ou Roquette são alguns exemplos concretos cuja natureza tivemos oportunidade de estudar ou de participar na sua elaboração. E o que é comum a estes grupos familiares? Criaram um modelo de gestão equilibrado e harmonioso entre os acionistas e envolvem a próxima geração de forma ativa para consolidar a base acionista futura que assegure a criação de riqueza inerente à preservação do capital nas mãos da Família a médio e longo prazo.
Em The Good, the Bad and the Ugly, a coragem, a dureza e a estatura moral de Clint Eastwood (the Good) leva a melhor sobre os ardis de Eli Wallach (the Bad) e de Lee Van Cleef (the Ugly) e acaba como o único sobrevivente dos três.
Aqui, no mundo dos Grupos Familiares, reencontramos estes três personagens e vemos que, no futuro, os Bad ou os Ugly vão acabar por desaparecer, falidos ou vendidos, na próxima geração ou numa outra. Só os Good vão ter condições de sobreviver e fazê-lo por muitas gerações. Mas, ao contrário do filme, há uma janela de redenção para os Bad e para os Ugly – um Protocolo de Família feito como deve ser, e quanto mais cedo melhor.
Aos amigos leitores os meus desejos de um Novo Ano com muita saúde e sucesso.
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