Medway queixa-se de concorrência desleal da rodovia com ferrovia de mercadorias
O presidente da Medway avisou que o país corre o risco de investir milhões na rede e não ter comboios de carga a circular por não ser competitivo.
O presidente da Medway queixou-se hoje de concorrência desleal entre rodovia e ferrovia de mercadorias e avisou que o país corre o risco de investir milhões na rede e não ter comboios de carga a circular por não ser competitivo.
“Podemos chegar ao extremo de ter uma excelente rede ferroviária onde não circularão quaisquer comboios de mercadorias, face à gritante discriminação de medidas que apoiam a rodovia e penalizam a ferrovia“, afirmou Carlos Vasconcelos, em Lisboa, durante a cerimónia de apresentação das novas locomotivas Stadler Euro 6000, as primeiras quatro de um total de 16 locomotivas adquiridas há dois anos, num investimento total superior a 90 milhões de euros.
O presidente da Medway, antiga CP Carga, considerou mesmo que Portugal é um país “esquizofrénico” em termos ferroviários, que corre o risco de investir “milhares de milhões numa excelente rede”, mas “os operadores ferroviários de mercadorias terão mudado o seu material circulante para o país vizinho que desenvolve uma verdadeira política de incentivo à transferência modal”.
Em concreto, a Medway acusou o Governo de fazer “declarações de amor” à ferrovia, mas depois adotar medidas que beneficiam a rodovia, como por exemplo a taxa de utilização imputada aos operadores ferroviários de mercadorias, enquanto “a maior parte da rede rodoviária não tem qualquer portagem para carga”.
Carlos Vasconcelos realçou também que os operadores ferroviários suportam a quase totalidade dos custos de manutenção da infraestrutura, enquanto os rodoviários não, e que a rodovia recebe subsídios para a renovação da sua frota com camiões mais eficientes e sustentáveis e a ferrovia não.
“A rodovia recebeu as compensações pelo aumento dos custos dos combustíveis em 2022 e 2023, como sabem foram aumentos absolutamente exorbitantes, e a ferrovia? Nada. Nem um cêntimo. Porquê? Não sabemos. O Governo anunciou em 2022 estes apoios também para ferrovia e renovou-os para 2023 tal como o fez para a rodovia. Prometeu, mas não cumpriu, mas a rodovia já recebeu os seus apoios”, lamentou o presidente da Medway.
Outras das medidas que comprovam, para a transportadora, a concorrência desleal com a rodovia é a redução de portagens em nome da coesão territorial, mas, por outro lado, o transporte de mercadorias por comboio teve um aumento médio de 22%, a que se somarão mais 8% em 2025.
“Espanha cobra uma taxa de uso de 23 cêntimos por quilómetro, Portugal cobra 1.87 euros este ano, ou seja, é oito vezes mais caro transportar em Portugal do que em Espanha”, destacou o responsável, dando ainda como exemplo a Áustria, que isentou a cobrança de taxa de uso às empresas de transporte ferroviário de mercadorias, no âmbito das políticas de redução das emissões de dióxido de carbono.
As novas quatro locomotivas da Medway, encomendadas à fabricante suíça Stadler, são elétricas e, como habitual na empresa, vão receber o nome de filhas ou netas de trabalhadores.
Defender mudança de bitola é “ignorância”
O presidente da Medway, Carlos Vasconcelos, considerou, por outro lado, que falar em mudança da bitola, da ibérica para europeia, é ignorância e demonstra desconhecimento do mercado ferroviário. “Quem fala disso [da mudança da bitola] são ignorantes que não conhecem o mercado ferroviário, não conhecem as mercadorias e falam sem saber, não quero pensar que seja por outras razões”, afirmou o presidente da Medway, antiga CP Carga, em declarações aos jornalistas à margem da cerimónia de apresentação das novas locomotivas Stadler Euro 6000, em Lisboa.
Questionado sobre se a bitola ibérica, usada em Portugal e Espanha, é a razão para não se avançar com transporte de mercadorias por comboio para lá dos Pirenéus, que separam a Península Ibérica do resto da Europa, Carlos Vasconcelos foi perentório: “A bitola não é o problema”, mas sim a falta de rede para que seja competitivo transportar carga por esta via.
“A rede espanhola para mercadorias é exclusivamente bitola ibérica, as ligações a Portugal são todas de bitola ibérica. A Adif [administradora espanhola de Infraestruturas ferroviárias] não tem projetos nos próximos 10, nos próximos 20 anos para alterar esta situação, quem disser o contrário mente abertamente e está a tentar enganar as pessoas”, apontou o presidente da Medway.
Carlos Vasconcelos explicou também que construir bitola europeia em Portugal, sem que haja planos em Espanha para fazer a mesma mudança, iria obrigar a fazer dois transbordos de carga, um na fronteira com Espanha e outro na fronteira espanhola com França.
Questionado ainda sobre se a nova linha de alta velocidade entre Lisboa e Porto devia permitir também a passagem de comboios de mercadorias, o responsável defendeu que a nova linha deve ser exclusiva para passageiros, para resolver os congestionamentos atuais.
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