André Carvalho, especialista em seguros de Arte da Innovarisk, a Agência de Subscrição da seguradora Hiscox, procurada por colecionadores em todo o Mundo, explica como funciona o mercado português.
A seguradora Hiscox é uma das mais famosas do mundo na relação com colecionadores, galerias e museus em todo o mundo por realizar seguros. Com sede nas Bermudas, mas principalmente ativa na Europa e Estados Unidos, está presente em Portugal há mais de 10 anos e é representada pela Innovarisk, agência de subscrição de seguros de obras de arte, casas de alto valor patrimonial e seguros de responsabilidade civil para a Hiscox, para além de ser agente da Lloyd’s de Londres. André Carvalho é o subscritor de Arte e Clientes Privados da Innovarisk e, em entrevista a ECOseguros revela o estado da arte destes seguros em Portugal. Em artigo ligado pode também ver um trabalho da Hiscox sobre as peças mais significativas recuperadas em 2023 no mundo.
Quanto vale o mercado segurado da arte em Portugal?
É muito difícil de calcular. Dado existirem poucas soluções especificamente para este tipo de bens, muitos estão garantidos por seguros tradicionais de Habitação no caso dos clientes particulares, por apólices de multirriscos estabelecimento no caso de clientes empresariais, ou em apólices de transportes no caso de algumas exposições.
Então não há cultura de proteção através de seguros?
Não. Qualquer que seja o valor ou número do que está efetivamente seguro, o mesmo será sempre uma percentagem muito pequena da realidade, dada a pouca apetência por segurar o nosso património cultural, nomeadamente a nível do Estado, por questões orçamentais. Infelizmente, o seguro ainda é visto como custo e não como uma salvaguarda da nossa História e Cultura, que queremos poder passar aos nossos descendentes.
Como tem acontecido o roubo de obras de arte em Portugal?
Ao contrário do que é hábito ver-se nos filmes, o roubo de arte é relativamente raro. Felizmente. Quando ocorre, o motivo costuma ser um de dois: ou financeiro, em que o objetivo é aproveitar o material de que é feita a obra e não o seu valor artístico (temos, como exemplo, esculturas ao ar livre que são roubadas para fundir e vender o material de que são feitas por valores bem mais baixos do que seria expectável), ou por vandalismo, em que se rouba simplesmente para causar dano ou uma perda ao proprietário. Infelizmente, esse dano muitas vezes é causado a todos nós quando estamos a falar de obras de arte de museus ou entidades públicas.
Qual o maior roubo em Portugal? E a maior recuperação?
Em território português os roubos de arte têm tido, em geral, um valor e uma frequência relativamente baixos. Pelo menos no que diz respeito aos que deram azo a uma participação de sinistro. Apesar de compreendermos o interesse e a curiosidade que casos específicos podem suscitar, a Innovarisk tem por base do seu trabalho a confiança dos seus clientes, pelo que a confidencialidade, nestes casos, tem de ser máxima. Podemos mencionar que tivemos em 2009 um sinistro de furto de arte de cerca de 400 mil euros que será, provavelmente, um dos maiores do tipo ocorridos nos últimos anos.
O seguro de arte tem servido para fraude?
Embora seja um tipo de apólice, e um tipo de bem seguro, que se poderia pensar estar muito exposto a fraude, a nossa experiência diz-nos que esta é mínima se corretamente subscrita. A cobertura de apólices de Arte é bastante ampla, sendo em geral do tipo All Risks – em que está tudo coberto, exceto o que está expressamente excluído nas condições do produto -, em que o ónus da prova de ter existido ou não um sinistro é da seguradora. Por outro lado, e apesar de isto ter vindo a mudar nos últimos anos, o mercado de arte sofre por vezes de alguma opacidade, dificultando por vezes a confirmação da autenticidade, pertença e valor de algumas obras de arte.
Essa opacidade limita a aceitação das seguradoras?
Como qualquer outro contrato de seguro, o de Arte vive da confiança entre seguradora, cliente e mediador. No nosso caso, e os nossos parceiros já o sabem, o mais importante é quem é o cliente. E um cliente de arte é normalmente alguém conhecido, não necessariamente do público em geral mas, pelo menos, do empresarial e cultural, e que a última coisa que quer é hipotecar o seu bom nome para ganhar alguns euros mais.
Qual o valor médio de segurar uma obra de arte? O que faz depender esse preço?
O valor de uma obra pode depender e variar de acordo com diversos fatores. O custo de aquisição, ou seja, o valor despendido pelo seu proprietário na compra da obra pode ser um bom ponto de partida para definir o valor a segurar. No entanto, uma pintura ou escultura pode valorizar de forma exponencial e em pouco tempo. Imagine a surpresa ao saber que o valor do seu quadro preferido duplicou ou mesmo triplicou. Existem vários fatores que podem explicar isso começando, desde logo, pelo reconhecimento do mérito artístico do seu criador, especialmente quando estamos perante artistas emergentes e que “vão ganhando” nome no mercado. A compra e venda de arte é também um exemplo de como as peças podem valorizar: uma obra de um artista que tenha sido vendida num leilão por determinado valor pode, indiretamente, valorizar outras obras desse mesmo artista. Em último caso a própria morte do criador pode fazer com que as suas peças valorizem, sobretudo se estivermos perante um artista reconhecido (lei da oferta e da procura).
Também pode desvalorizar?
Podem sofrer desvalorizações. Por exemplo, um artista que se veja envolvido numa situação cuja reputação seja comprometida, poderá ser sinónimo de ver as suas peças desvalorizadas no mercado. Além disso, cada peça é única e, se acrescentarmos todas estas circunstâncias, podemos concluir que não existe um valor médio de referência para segurar uma obra.
A avaliação e subscrição é seletiva?
Não, começando desde logo pela tipologia de bens que garantimos e que vão desde todo o tipo de obras arte, antiguidades e artigos de coleção. Naturalmente, a subscrição tem em consideração aspetos relacionados com as características de cada bem, tal como por exemplo o seu grau de fragilidade. No caso da avaliação, normalmente é o cliente que decide por quanto quer ver segura a sua obra de arte. No entanto estamos disponíveis para aconselhar sobre a forma de segurar e obter uma avaliação profissional da sua coleção.
O seguro pode ser feito isoladamente ou tem de estar ligado a uma apólice de recheio e eventualmente de edifício?
O seguro pode ser feito isoladamente. Existe uma solução dedicada exclusivamente a obras de arte, quer se trate de uma única peça ou de uma coleção, seja ela pública ou privada. É também possível segurar numa apólice de habitação, para além do edifício e do recheio, obras de arte e coleções.
Quais os sinistros mais frequentes?
Qualquer obra, seja de propriedade pública ou privada, encontra-se exposta a um conjunto muito variado de riscos, como por exemplo o roubo, o incêndio e, inclusive, o dano provocado acidentalmente. Ao contrário dos filmes, séries e livros, o maior risco para uma obra de arte não é um ladrão – é raro as obras de arte serem roubadas num assalto a uma residência, por exemplo, porque são muitas vezes difíceis de transportar e de vender posteriormente -, mas a falta de cuidado no manuseamento, transporte e armazenagem. Ou o contacto com visitantes, crianças, animais domésticos ou empregados de limpeza.
Tem alguma recomendação especial a quem tem obras de arte?
Recomendamos a todos os colecionadores e apreciadores de arte que façam uma gestão de risco adequada, quer através da adoção das medidas de segurança necessárias, quer pela contratação de um seguro que garanta efetivamente a proteção e segurança do seu património.
Como chegam os riscos até à Innovarisk? Mediadores e corretores pedem cotação por já saberem da especialização da Hiscox?
Os pedidos de cotação chegam-nos normalmente através dos mediadores e corretores, mas também diretamente pelos clientes. A Hiscox adquiriu, desde 1967, uma considerável experiência de âmbito global, permitindo-lhe tornar-se numa líder reconhecida neste tipo de soluções em toda a Europa e, claro, em Portugal. Aliás, somos muitas vezes contactados por novos clientes que estão a organizar exposições, e a quem os emprestadores de obras de arte exigiram um seguro Hiscox.
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André Carvalho: “Nos seguros de Arte em Portugal o importante é saber quem é o cliente”
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