A “punição” do comportamento dos trabalhadores nas redes sociais

  • Rita Tavares Catarino
  • 15 Março 2024

É de valorizar, em termos disciplinares, comportamentos adotados por um trabalhador nas redes sociais, se esses mesmos comportamentos colidirem com algum dos deveres laborais que impendem sobre ele.

É inegável a ampla divulgação e utilização das redes sociais a nível mundial, tanto para fins profissionais, como para fins pessoais.

É este, por isso, um tema, que não sendo novo, se apresenta atual, sendo que decorrente do dinamismo que caracteriza e está patente nas redes sociais, se antevê que, nos próximos anos, saia fortalecida a sua importância.

Pelo que, importa retomar estes temas e, desde logo, procurar soluções e respostas para questões tão simples quanto aquela que se prende com o facto de saber se se pode e/ou deve isentar de punição, em termos disciplinares, os comportamentos adotados por um trabalhador nas redes sociais.

A eficácia dos direitos, liberdades e garantias implica a sujeição ao dever de não perturbar ou impedir o exercício dos direitos fundamentais, sendo que a lógica que está subjacente a um vínculo laboral e, bem assim, os poderes do empregador terão sempre por limites a dignidade da pessoa humana, a reserva da intimidade da vida privada e o princípio da confidencialidade, que devem ser sempre regra e não exceção.

Contudo, no “mundo da internet”, em que as redes sociais e os blogs permitem a qualquer pessoa colocar as informações e fazer as afirmações que pretenda, é difícil e até mesmo “indesejável” que aqueles valores e princípios constitucionais, nomeadamente, a liberdade de expressão e de comunicação não tenham qualquer tipo de limites externos.

E isto porque, também no “mundo do trabalho”, crucial se torna atender a interesses específicos, tais como o equilíbrio da organização e o seu normal funcionamento, os quais sempre terão de ser conjugados com a tranquilidade do ambiente laboral pelo impacto que tal necessariamente tem na produtividade das empresas e na prossecução do respetivo objeto social.

Urge, pois, refletir sobre aquele que poderá ser o critério que permita, com equidade e justiça, perante os dois interesses “em jogo”, marcar a linha divisória entre o campo da vida privada e familiar – que goza de reserva de intimidade – e o domínio mais ou menos aberto à publicidade, sabendo de antemão que a extensão da privacidade será sempre variável por força da liberdade de gestão e organização que é conferida por lei aos empregadores.

E é aqui que a palavra “expectativa” ganha uma forte expressão! Dependendo da vontade do trabalhador a publicação de um determinado conteúdo nas redes sociais, redes sociais essas que pelas suas características têm a tendência para tornar público o que houver sido publicado, não poderá aquele legitimamente arrogar-se da expectativa de que o que publicou era secreto, privado e confidencial quando foi o próprio a aceitar tacitamente a quebra da confidencialidade.

Como se usa dizer “uma vez na Internet, para sempre na Internet”.

Sem prejuízo da necessidade de se atender sempre às circunstâncias concretas da situação a analisar, até mesmo para se determinar se as publicações efetuadas por um trabalhador se situam aquém ou além da fronteira que protege a reserva de confidencialidade, é, pois, de valorizar, em termos disciplinares, comportamentos adotados por um trabalhador nas redes sociais, se esses mesmos comportamentos colidirem com algum dos deveres laborais que impendem (sempre) sobre um colaborador, mesmo numa perspetiva extralaboral ou num campo marcado por alguma privacidade.

Existindo tal colisão, e em nome do equilíbrio que deve existir entre os direitos e deveres das partes numa relação laboral, outro caminho não se deve seguir que não seja a instauração de um processo disciplinar ao trabalhador, com a consequente aplicação de uma sanção que ao caso se revelar proporcional ao grau da infração e ao impacto do comportamento que tiver sido adotado por aquele na esfera jurídica do empregador.

  • Rita Tavares Catarino
  • Advogada na AFMA no departamento de laboral

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