Teixeira Duarte corta 800 empregos. Portugal volta a pesar mais de 50% na construção
Quebras no Brasil, Angola e Kuwait reforçam quota nacional na construção, que vale dois terços do negócio. Grupo reduz exposição no Qatar, batalha por recompensa na Venezuela e vende hotel em Sines.
A Teixeira Duarte cortou 800 postos de trabalho durante o ano passado, no qual registou prejuízos de três milhões de euros. Agora com um total de 8.689 trabalhadores de 42 nacionalidades, dos quais 27% em Portugal e quase metade (48%) na construção – o peso desta atividade no emprego caiu seis pontos percentuais face ao final de 2022 –, o grupo sublinha que para esta redução no efetivo “contribuiu maioritariamente” o setor da construção no Brasil, “fruto da respetiva redução da atividade durante o exercício”.
O histórico grupo liderado por Manuel Teixeira Duarte, que opera em 21 países e concentra em Angola, Portugal e Brasil 85% dos trabalhadores, que têm uma idade média de 39 anos, justifica os prejuízos com o nível de impostos apurados (26 milhões de euros) e a evolução da posição financeira, que atribuiu sobretudo à desvalorização do kwanza. As vendas e prestações de serviços baixaram 8% em termos homólogos, para 767 milhões de euros, com a construção a valer dois terços do total, após uma quebra de 3,5% a nível global.
Nesta que é a atividade de referência do grupo, o principal destaque vai para o incremento de 20,3% das obras em Portugal, “devido essencialmente ao contributo do setor privado”, como explica no relatório e contas. O mercado português volta assim a pesar mais de metade (52,8%) na faturação do ramo da construção, depois da quota relativa dos mercados externos baixar de 57,8% em 2022 para 47,5% em 2023. Resultado da diminuição homóloga de 63,7 milhões de euros no estrangeiro, pressionada por perdas no Brasil, em Angola e pela conclusão da mega empreitada no Kuwait, onde construiu 98 estruturas e edifícios para uma estação de tratamento de águas residuais.
Com a carteira de encomendas na construção a ascender a um valor global de 1.079,7 milhões de euros a 31 de dezembro de 2023, tem novas empreitadas já contratadas no início deste ano no valor de 91 milhões, como adianta no documento enviado à CMVM. E como o ECO noticiou em março, ficou à frente dos espanhóis no concurso para as obras do IP3, com a Acciona e a Ferrovial, tal como a portuguesa ABB, a contestarem o resultado preliminar do concurso de 130 milhões para o troço entre Santa Comba Dão e Viseu.
Apesar de recear os “impactos da conjuntura inflacionista e de eventuais variações cambiais nos países em que opera, com especial destaque para Angola”, o grupo prevê atingir em 2024 rendimentos operacionais consolidados de cerca de 800 milhões de euros. E uma fatia relevante poderá vir das obras ferroviárias, em que diz ter uma “expectativa de melhoria” com a participação em grandes concursos, em cima do “ótimo ano” que passou. Em janeiro, após o lançamento do primeiro concurso para o TGV, a Teixeira Duarte duplicou de valor em bolsa.
Neste segmento, a atuação do grupo foi “fortemente impulsionada” pelas obras do programa Ferrovia 2020, lançado pela Infraestruturas de Portugal (IP), em particular as empreitadas da Linha da Beira Alta, do troço Cerdeira/Vilar Formoso e do troço de Évora/Elvas, descrito como a maior obra ferroviária de via nova no país nos últimos 100 anos. E no final de 2023, adianta no relatório, a IP adjudicou ao consórcio que a Somafel lidera (participação de 36,5%) novos contratos de manutenção nos lotes que representam 70% da rede ferroviária nacional, com um prazo de três anos, renovável por mais dois, num valor total de 133,6 milhões de euros.
Ainda em Portugal e no setor da construção, voltou a aumentar a atividade nas chamadas obras subterrâneas, inclusive com novos contratos. Na Mina de Neves Corvo assinou um novo contrato com a Somincor para trabalhos de desenvolvimento da infraestrutura mineira, transporte e aplicação de betão projetado, que entrou em vigor a 1 de novembro e tem um prazo de 36 meses. Já com a Almina e ao abrigo do contrato para trabalhos de escavação, contenção e transporte nas Minas de Aljustrel, celebrado em novembro de 2022, revela que adicionou no ano passado a execução de uma nova rampa para infraestrutura mineira a partir da superfície e alargou o prazo inicial do contrato de 14 para 32 meses.
Se no Brasil viu o grupo de mineração AngloGold Ashanti rescindir unilateralmente o contrato para a Mina de Cuiabá, o único que tinha em curso nesta geografia no âmbito das obras subterrâneas, em Espanha, onde já tinha em execução dois contratos de manutenção na Mina de Aguas Teñidas, em Huelva – um para equipamentos mineiros e outro para manutenção de camiões, ambos válidos até outubro de 2025 – , a Teixeira Duarte assinou já este ano um contrato com a Geoalcali para duas rampas e várias infraestruturas subterrâneas no projeto mineiro Muga-Vipasca Potash, na região de Pamplona. Fê-lo em partes iguais com uma empresa espanhola e através de um agrupamento liderado pela EPOS, à qual cabem 24 milhões de euros, detalha.
Em África, enquanto na Argélia a maior parte das empreitadas está suspensa, com exceção de uma obra marítima, e continua a negociar com as autoridades locais o “encerramento dos dossiês em aberto por forma a acautelar os interesses das partes”, em Cabo Verde, o consórcio liderado pela Teixeira Duarte e que integra também a Alves Ribeiro já começou a modernizar sete aeroportos. Antevê “boas perspetivas (…) através de outras oportunidades associadas a novos projetos” com a concessionária detida pela Vinci e pela ANA – Aeroportos de Portugal, e da “angariação de projetos cujo lançamento a concurso se prevê que venha a ocorrer num curto e médio prazo, na área de obras de infraestruturas marítimas”.
Da exposição financeira no Qatar às compensações na Venezuela
Depois da construção, é no ramo de concessões e serviços que o grupo emprega mais gente (17% do total), tendo começado a operar nesta área em 1984 através de uma participação na CPM – Companhia de Parques de Macau, que ainda mantém – e à qual somou outras em dez países e em áreas que vão desde a educação em Angola às pequenas centrais hidroelétricas no Brasil. No entanto, a principal atividade é na gestão e manutenção técnica de instalações, em que opera com a marca TDGI, e ganhou clientes como a farmacêutica MSD, o ManpowerGroup ou a Fujitsu. Renovou contrato com o Novobanco e viu a Tabaqueira entregar-lhe a manutenção das lojas IQOS em Portugal.
Na indústria, renovou em 2023 o contrato para a operação e manutenção da central de amoníaco da gigante Upfield, e finalizou o chamado “Projeto SIDUL” para a histórica empresa portuguesa integrada desde 2010 no líder mundial ASR Group, que envolveu a conceção, instalação e montagem de uma nova linha de abastecimento de açúcar na fábrica de Santa Iria da Azóia (Vila Franca de Xira). Por outro lado, decidiu sair deste mercado na Bélgica e no Luxemburgo, para se focar “noutros mercados de maior potencial”.
É o caso do Qatar, em que atua através de uma empresa de direito local detida em conjunto com a Petroserv, que tem um contrato com a Qatar Foundation para a manutenção do Sidra Medical & Research Centre e das instalações do centro hípico Al Shaqab. Revela que quer “diminuir a sua participação e exposição do ponto de vista financeiro, mas manter uma atividade nas suas áreas de atuação, cuja eficiência operacional e rentabilidade se acredita que poderão melhorar e continuar a merecer a aposta da Teixeira Duarte”.
Mais complicada continua a situação na Venezuela, onde há três anos, “em flagrante violação clara aos acordos bilaterais vigentes e aos direitos e expectativas da Teixeira Duarte”, viu a Bolipuertos avançar com a “rescisão unilateral e extemporânea” do contrato de concessão por 20 anos que tinha assinado, em 2017, para a comercialização, conservação, operação, administração, construção e aproveitamento de um terminal especializado de contentores do Puerto de la Guaira. “Depois das reações havidas logo após a rescisão e as demais concretizadas em 2022, durante o ano 2023 [prosseguimos] com diligências visando o ressarcimento dos impactos gerados por tal rescisão ilícita”, escreve no relatório e contas.
Vende hotel em Sines e procura hotel de negócios no Porto
Finalmente, enquanto no setor imobiliário viu a faturação encolher 63,2% em 2023 face ao ano anterior – embora em Portugal até tenha atingido 17,9 milhões de euros, mais 13,5 milhões do que no ano anterior “fruto das vendas do edifício River Plaza, em Vila Nova de Gaia” –, na hotelaria registou um acréscimo de 12,3%, com os rendimentos operacionais provenientes de nove unidades (duas em Portugal, quatro em Angola e três em Moçambique), a operarem sob a insígnia TD Hotels e com um total de 2.688 camas, a ascenderem a 51,7 milhões de euros.
A grande novidade, concretizada na segunda metade do ano passado e “aproveitando uma boa oportunidade de negócio”, foi a venda da sociedade que explorava o hotel Sinerama, em Sines, ao grupo AP Hotels & Resorts, a quem a Teixeira Duarte já havia alienado outras unidades no passado. Os novos donos vão convertê-lo numa unidade de quatro estrelas, a inaugurar no próximo ano, passando dos atuais 105 para 135 quartos.
O único ativo hoteleiro da Teixeira Duarte em Portugal passou a ser o Lagoas Park Hotel, um quatro estrelas com 182 quartos no concelho de Oeiras, que registou em 2023 o “melhor ano de sempre a nível de volume de negócios”. Porém, adianta o grupo, “otimizando as mais-valias operacionais e as já dezenas de anos de experiência” de gestão neste setor, nomeadamente no segmento de negócios, o grupo fala na “continuidade dos estudos relacionados com novas oportunidades de negócio na cidade do Porto”.
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