BRANDS' TRABALHO Uma Cultura de Saúde Mental nas Organizações: será a transformação real?

  • BRANDS' TRABALHO
  • 5 Julho 2024

A cultura de saúde mental nas empresas não é apenas uma questão de responsabilidade social, mas também de saúde pública e económica que não pode ser ignorada. O papel dos líderes é, aqui, fundamental.

Nos últimos anos, tem ocorrido um reconhecimento crescente da importância da saúde mental no contexto do trabalho e as organizações estão cada vez mais conscientes da necessidade de cultivar um ambiente de trabalho que promova o bem-estar emocional e a saúde dos colaboradores. Estabelecer uma cultura de saúde mental no local de trabalho vai garantir o desenvolvimento pessoal e profissional de todos os colaboradores e das organizações.

Contudo, é fundamental reconhecer que essa preocupação nem sempre se traduz em práticas consolidadas e num compromisso genuíno com o bem-estar dos colaboradores. Por detrás das boas intenções, das declarações de compromisso e dos sinceros testemunhos, muitas organizações ainda enfrentam desafios significativos na criação de culturas verdadeiramente saudáveis, inclusivas e de suporte.

É comum encontrarmos organizações que adotam uma abordagem superficial em relação à saúde mental, implementando programas e políticas que parecem estar na “moda”, mas que, na prática, não abordam as questões mais profundas que afetam a saúde e o bem-estar das pessoas em contexto de trabalho. Embora os eventos esporádicos de bem-estar e as iniciativas de autocuidado possam ter uma reação positiva, são insuficientes para lidar com as pressões culturais, sistémicas – e, com um desenho do trabalho ineficaz, podem contribuir para a doença física, para o distress e, em última análise, para o burnout nas nossas organizações.

A falta de recursos e de suporte adequados é outro obstáculo comum na promoção da saúde no local de trabalho. Muitas organizações oferecem apenas serviços limitados de saúde mental, como sejam linhas diretas de apoio ou sessões de aconselhamento de curto prazo, que podem não ser suficientes para atender às necessidades dos colaboradores. Além disso, a cultura de cada organização pode desencorajar os próprios indivíduos a procurar ajuda, devido ao medo ou à insegurança que estão enraizados, criando uma barreira adicional para aqueles que enfrentam dificuldades e que mais necessitam de apoio.

É inegável reconhecer que a aplicação eficaz de uma cultura de saúde requer mais do que simplesmente adotar medidas superficiais. Envolve um compromisso genuíno da liderança na abordagem das questões estruturais que afetam o bem-estar, bem como a criação de um ambiente onde o apoio mútuo e a empatia são valorizados. Isso pode exigir mudanças significativas na cultura organizacional e na forma como o trabalho é estruturado e gerido. Os líderes desempenham um papel determinante na criação e na manutenção de uma cultura de suporte, modelando comportamentos saudáveis, promovendo a transparência e fornecendo recursos e suporte adequados.

Para efetuar uma verdadeira transformação na cultura de saúde mental no local de trabalho é essencial priorizar a segurança psicológica percecionada por todos, todos os dias. Os indivíduos precisam sentir-se seguros para expressar pensamentos, sentimentos e preocupações sem medo de represálias ou julgamentos. Quando os colaboradores podem ser autênticos, isso promove a confiança e a cooperação dentro da equipa, criando um ambiente propício para a criatividade, inovação e colaboração. A segurança psicológica também é fulcral para lidar com desafios e adversidades no trabalho, permitindo o apoio quando necessário e o trabalho em equipa na procura efetiva de soluções.

Além da segurança psicológica, a construção de uma comunidade solidária, de pertença, é um fator determinante para promover a saúde no local de trabalho. Os seres humanos são seres sociais por natureza e a qualidade da relação com os colegas e líderes desempenha um papel fundamental no nosso bem-estar, saúde e produtividade.

Uma cultura organizacional que valoriza a empatia, a compaixão e o apoio mútuo, cria um ambiente onde os indivíduos se sentem conectados e parte do todo, o que não apenas melhora a satisfação profissional, mas também reduz o stress e o burnout, contribuindo para uma força de trabalho mais saudável e resiliente.

Para além disso, é crucial investir em recursos e políticas de apoio que vão além das medidas superficiais. Isso inclui programas estruturados de saúde mental e de capacitação de todos em resiliência, inclusão, proatividade – e de flexibilidade no local de trabalho.

No entanto, apesar dos avanços significativos, ainda há muito a fazer para garantir que a saúde seja uma prioridade no local de trabalho. Muitos colaboradores ainda enfrentam estigma e discriminação quando se trata de questões de saúde mental, e muitas empresas ainda não reconhecem totalmente a importância de investir no bem-estar emocional dos colaboradores através de intervenções na própria cultura de trabalho. Além disso, as pressões do mundo atual, como prazos e metas irrealistas, elevado ritmo de trabalho e a constante conectividade digital, podem contribuir para o aumento do turnover, stress ocupacional e síndrome de burnout.

É, portanto, necessário que as organizações continuem a avançar na criação de culturas organizacionais que priorizem a saúde mental – uma real cultura de saúde. Isso requer um compromisso contínuo de todos os níveis da organização e uma atuação focada na prevenção, na mitigação de riscos e na regeneração. Ao promover a segurança psicológica, construindo comunidades e investindo em recursos e políticas de suporte, as organizações podem não apenas melhorar a saúde e o bem-estar dos seus colaboradores, mas também garantir a realização plena do seu potencial humano e promover um ambiente de trabalho mais produtivo, inovador e sustentável a longo prazo.

Assim, a existência de uma cultura de saúde mental no local de trabalho não é apenas uma questão de responsabilidade social, mas também uma questão de saúde pública e económica que não pode mais ser ignorada.

Na MindAlliance Portugal, acreditamos nesta real cultura de saúde que os nossos membros tentam implementar no seu dia-a-dia, a todos os níveis da organização. É com satisfação que vemos a Accenture Portugal, a Critical Software, a Ageas, os CTT, a Vieira de Almeida, o Novo Banco, a Multicare, a Fidelidade, o BAI Europa, o Santander, a Linklaters, a AstraZebneca e a JLM&A darem passos seguros nesta direção com a nossa ajuda, criando um verdadeiro ecossistema à volta da saúde mental no local de trabalho. É também com muita satisfação que recebemos agora o ECO como o mais recente membro da nossa organização. Temos as portas abertas para que outros se juntem a nós.

Vamos a isso, pela Saúde Mental de todos.

Liliana Dias, Membro do Conselho de Especialidade de Psicologia do Trabalho, Social e das Organizações da Ordem dos Psicólogos Portugueses e Raquel Sampaio, Diretora Executiva da MindAlliance Portugal

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