Sub-representação portuguesa nas instituições europeias fruto de “negligência” do anterior Governo, diz Rangel
Na Comissão Europeia há um "deserto total" no que toca à presença de portugueses em cargos de topo, diz o ministro. Compromete-se a dar continuidade à estratégia de levar mais cidadãos para a UE.
O ministro dos Negócios Estrangeiros acusou o anterior Governo de “distração” face à sub-representação portuguesa em cargos de topo em Bruxelas. Para Paulo Rangel, o facto de António Costa ter conseguido chegar a presidente do Conselho Europeu “é algo muito positivo para Portugal”, mas assinala ser preocupante que não existam mais portugueses em posições de chefia nas instituições europeias.
“Houve uma negligência censurável [do anterior Governo] e agora estamos a trabalhar para contrariar isso”, garantiu Rangel, esta quinta -feira, em resposta a Rui Tavares, do Livre, na Comissão dos Assuntos Europeus da Assembleia da República. “É um deserto total. Não temos um subdiretor-geral na Comissão Europeia. É absolutamente extraordinário”, disse, revelando que o primeiro-ministro Luís Montenegro já teve oportunidade de abordar e “insistir” sobre o assunto junto da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Tal como o ECO já deu conta, só há quatro portugueses em posições de topo em Bruxelas: Elisa Ferreira, comissária da Coesão e Reformas; Vasco Cordeiro, presidente do Comité das Regiões; Rodrigo da Costa, diretor executivo da Agência da União Europeia para o Programa Espacial (EUSPA); e João Negrão, diretor do Instituto da Propriedade Intelectual da UE.
Fora estes, não há qualquer cidadão nacional como diretor-geral no bloco europeu, sendo esta a primeira vez que isso acontece desde que Portugal aderiu à UE. O último diretor-geral foi Mário Campolargo, que ficou com a liderança da Direção-Geral de Informática, até 2022, ano em que abandonou o cargo para ser secretário de Estado da Digitalização do anterior Governo. O seu mandato foi interrompido.
Essa falta de representação, diz Rangel, é também resultado de uma “falta de impulso político” aquando dos concursos lançados para o preenchimento de vagas, nomeadamente, do anterior Executivo. “O anterior Governo tem grandes responsabilidades, mas isso vai mudar”, promete Rangel.
Ainda que reconheça os esforços da anterior secretaria de Estado dos Assuntos Europeus, no sentido de incentivar o número de portugueses em cargos europeus por via de um incremento do número de bolsas no Colégio da Europa, Rangel aponta que essa estratégia tem de continuar a ser desenvolvida para produzir efeitos mais tangíveis. Desta instituição, o ministro dos Negócios Estrangeiros diz ter recebido a indicação de que, “se as bolsas fossem reforçadas, o número de portugueses seria maior”.
Segundo dados da Comissão Europeia, a 1 de janeiro de 2024, o número de portugueses — entre funcionários, pessoal temporário e trabalhadores locais — no conjunto dos serviços da Comissão era de 806, num total de 30.451 – ou seja, 2,6%. Os países com maior representação são, naturalmente, Bélgica (14%) e França (10%), por serem casa das principais instituições europeias. Excluindo esses dois, Espanha (8,7%) e Dinamarca (6,7%) são os países que contam com mais funcionários a trabalhar em Bruxelas e Estrasburgo.
Face a esses valores, que não ultrapassam a marca dos 2% há vários anos, o objetivo português é alcançar a quota mínima de 3,1% de trabalhadores portugueses nas instituições europeias. De acordo com Bruxelas, a quota portuguesa traduz-se num “défice significativo” de representação.
Portugal tem 64 processos de infração em Bruxelas
Na mesma ocasião, o ministro revelou que Portugal tem 64 procedimentos de infração impostos pela Comissão Europeia que resultam de falhas na transposição de diretivas europeias. Segundo avançou Paulo Rangel, as situações de incumprimento podem levar ao pagamento de sanções “muito avultadas” que, em alguns casos, podem superar os três milhões de euros.
“O Governo anterior dizia-se muito europeísta mas não na questão de transposição de diretivas“, afirmou Paulo Rangel esta quinta-feira na Comissão dos Assuntos Europeus, na Assembleia da República. “A herança que [o PS] deixa é má”, frisou durante a sua intervenção.
Segundo o governante, dos 64 procedimentos de infração, 21 aguardam arquivamento. Nestas situações, a resolução dos processos deverá ser mesmo por essa via, diz o ministro. Mas não acontecerá o mesmo noutros.
Neste momento, 43 processos estão ativos e em fase pré-contencioso, ou seja o Governo português e a Comissão Europeia estão a tentar resolver o processos sem recorrer a tribunais; 28 processos tiveram origem pela “má aplicação do direito europeu” e cinco são referentes à execução de obrigações do regulamento europeu.
Por fim, 15 desses processos resultam da “falta ou atraso” na transposição de diretivas. Este último valor poderá, no entanto, aumentar, uma vez que Portugal tem até ao final do ano para transpor mais 17 diretivas.
“As situações de incumprimento podem levar ao pagamento de sanções muito avultadas, algumas superiores a três milhões de euros. Estamos a trabalhar numa relação muito apertada entre a secretaria de Estado dos Assuntos Europeus e a presidência do Conselho de Ministros para superar isto”, garantiu o ministro dos Negócios Estrangeiros, recordando que um dos esforços prende-se com a atualização dos sistemas de segurança do Espaço Schengen.
“Estávamos muito atrasados na questão das migrações. Tínhamos um semáforo vermelho e agora temos um verde e faremos um esforço para não termos mais nenhuma falha até outubro relativamente ao espaço Schengen. Queremos superar isso”, garantiu.
Recorde-se que, no início de maio, António Leitão Amaro, ministro da Presidência, disse ao Expresso que Portugal está em risco de ficar suspenso do espaço Schengen se não conseguir implementar atempadamente os sistemas de informação integrados no âmbito do projeto das fronteiras inteligentes do espaço Schengen, nomeadamente o EES e o Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagens (ETIAS, na sigla em inglês).
No entanto, fonte oficial da Comissão Europeia garantiu ao ECO que nunca esteve em cima da mesa “qualquer cenário” em que Portugal ficasse suspenso do espaço Schengen por um atraso na implementação de sistemas de informação integrados no âmbito das fronteiras inteligentes.
Na sequência deste esclarecimento, o Sistema de Segurança Interna (SSI) garantiu que Portugal já “recuperou os atrasos” relativamente à implementação de sistemas de informação integrados no âmbito das fronteiras inteligentes, assegurando que o país “já não corre o risco” de ser suspenso do Espaço Schengen, ao contrário do que disse o ministro da Presidência, António Leitão Amaro.
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