Inspeção do Ambiente identifica 3.790 captações de águas para consumo humano fora da lei
A ministra do Ambiente, Maria Graça Carvalho, determinou a reposição da legalidade no prazo de seis meses.
A inspeção do Ambiente identificou 3.790 captações de águas para abastecimento público, no continente, em desconformidade com diplomas de proteção dos recursos hídricos e a ministra do Ambiente determinou a reposição da legalidade no prazo de seis meses.
“Foram identificadas 3.790 captações de águas subterrâneas destinadas ao abastecimento público para consumo humano no território continental português, executadas à revelia do disposto” no decreto-lei n.º 382/99 e do Regime de Utilização dos Recursos Hídricos (RURH), concluiu um relatório da Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT).
A ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, homologou, em 27 de junho, o relatório de avaliação do cumprimento do diploma que estabelece perímetros de proteção para captações destinadas ao abastecimento público, e determinou à Agência Portuguesa do Ambiente (APA) que, “no prazo de seis meses, promova todas as diligências necessárias” para reposição da legalidade.
A governante ordenou ainda que a APA apresente “à tutela um plano de ação sancionatório, cautelar e reintegrador da legalidade no prazo de um mês e reporte bimensal das ações tomadas”.
No relatório, a que a Lusa teve acesso, datado de janeiro, a IGAMAOT acrescentou que os dados da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), relativos a 2021, revelam um número ainda mais expressivo de captações desprovidas de título de utilização de recursos hídricos (TURH) – 4.649 –, “o que terá reflexos na extração de cerca de 173 milhões de metros cúbicos [m3] de água, com origem em captações subterrâneas, destinada a consumo humano ‘não licenciadas’, o que equivale a cerca de 27% do volume total captado nesse ano”.
Nesse sentido, recomendou que a APA demonstrasse ter encetado “à reintegração da legalidade de todas as captações que delas carecem no prazo” determinado pelo titular do Ambiente, e “sancionamento contraordenacional das entidades gestoras que mantêm, à revelia da lei, captações de água subterrânea” para abastecimento público, “no prazo de 60 dias após a homologação do relatório”.
A inspeção concluiu ainda que os dados da APA e da ERSAR apresentam “lapsos e lacunas diversas, não são relacionáveis entre si, nem sequer comparáveis, dada a falta de uniformidade até mesmo na denominação de uma mesma captação”.
Além da demora na análise, a IGAMAOT salientou que “a sua falta de qualidade condicionou a definição da amostra” para avaliação de interdições e condicionamentos decorrentes da aprovação dos perímetros de proteção.
Assim, recomendou às duas entidades para verificarem as suas bases de dados, procederem às retificações adequadas, e pugnando por “mecanismos de interoperabilidade”, tendo em vista a conformação das origens de água subterrânea às exigências jurídico-administrativas impostas pela lei.
O decreto-lei e o RURH regulamentam a delimitação dos perímetros, estabelecendo condicionalismos ao uso, ocupação e transformação do solo, que podem ser de interdição ou condicionamento de atividades, em função das características dos aquíferos.
Os perímetros, de identificação obrigatória nos planos territoriais, podem ter uma zona de proteção imediata, contígua à captação, vedada, limpa e identificada, onde são interditadas todas as atividades, acrescida nas captações para mais de 500 habitantes ou caudal superior a 100 m3/dia de proteção intermédia, alargada ou especial, nesta com interdição de atividades ou instalações.
O relatório indicou que apenas 103 de 278 municípios no continente delimitaram captações identificadas pela APA no Plano Diretor Municipal (PDM) e que 82 municípios devem alterar esse instrumento de ordenamento do território.
Os inspetores apontaram que só 21 dos 103 municípios com perímetros de proteção aprovados fizeram constar nas plantas de condicionantes dos PDM as servidões administrativas, “não estando, por conseguinte, assegurado o cumprimento dos condicionamentos ao uso, ocupação e transformação do solo” nos restantes.
A IGAMAOT recomendou à APA, em articulação com as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), para transmitir aos municípios a obrigatoriedade de procederem à alteração dos PDM, com identificação dos “perímetros de proteção delimitados, com a conformação” nos atos de criação, informando das diligências desenvolvidas.
Na fase de contraditório, a APA disse estar a tentar ultrapassar “questões legais complexas” relacionadas com a emissão de TURH para algumas captações, de águas subterrâneas particulares, mas para os inspetores isso não explica a inexistência de perímetros de proteção definidos para esses títulos, quando a agência é a Autoridade Nacional da Água e a lei admite a expropriação e indemnização para servidões por interesse público.
A ERSAR, por seu lado, relevou a publicação do decreto-lei 69/2023, que exige a georreferenciação das captações e envio à APA, juntamente com dados de monitorização, impondo à agência a cartografia dos perímetros de proteção e articulação com a entidade reguladora na partilha dos dados de geolocalização.
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