Governo negoceia com Bruxelas aumento da despesa líquida. O que está em causa?
Despesa primária estrutural e PIB potencial são dois pontos centrais nas negociações entre os técnicos das Finanças e da Comissão Europeia. Governo confiante que país está numa posição confortável.
As negociações entre o Governo português e a Comissão Europeia sobre o plano orçamental estrutural de médio prazo arrancam em duas semanas, mas o Executivo está confortável com a trajetória de referência indicada a Portugal.
A trajetória de referência ainda não é pública, uma vez que é precisamente sobre esse indicador que as negociações entre os serviços técnicos do Ministério das Finanças e do executivo comunitário se vão iniciar, contudo, segundo fonte próxima do processo, os números sobre a despesa líquida primária e o Produto Interno Bruto (PIB) potencial — centrais na negociação — deixam o país numa posição confortável para atingir as metas.
O ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, numa audição regimental no Parlamento, garantiu que a trajetória que o Governo prevê “para a despesa é consistente com o que a Comissão Europeia considera ser o ponto crítico”.
A trajetória de referência enviada pela Comissão Europeia ao Governo português é baseada no risco, sendo expressa em termos de despesas líquidas plurianuais para os Estados-membros. Todos os países com défices orçamentais superiores a 3% do PIB ou um rácio da dívida pública acima dos 60% recebem esta indicação, que é diferenciada para cada Estado, mas, com o objetivo de simplificar o quadro orçamental europeu, o indicador operacional será único e baseado na sustentabilidade da dívida.
Um dos primeiros pontos de negociação entre os serviços técnicos das Finanças e os do executivo comunitário será, então, sobre a estimativa da despesa primária estrutural, isto é, a despesa primária deduzida de operações one-off e da componente cíclica da despesa. Segundo fonte próxima do processo, a despesa será calculada como uma média a quatro anos (período do plano), tendo como ponto de partida o ano de 2024. Ao ser uma média, estabelece que se num ano a despesa for mais elevada, no ano seguinte terá de ser mais reduzida. Sendo calculada em percentagem do PIB, será também influenciada pelo crescimento da economia.
Na prática, se o Governo carregar mais na descida de impostos em 2025 terá de adotar uma postura mais ligeira nos anos seguintes, segundo fonte ouvida pelo ECO. A prioridade é que o país mantenha, pelo menos, ligeiros excedentes orçamentais, não deixando a despesa líquida derrapar.
Outro indicador central nas negociações será a previsão do PIB potencial, que terá de ser coerente com a redução da dívida pública. No Governo acredita-se que, provavelmente, Bruxelas será mais exigente com Portugal sobre as previsões deste indicador do que sobre a despesa primária.
No Programa de Estabilidade 2024-2028, o Governo prevê (num cenário de políticas invariantes) um crescimento do PIB potencial de 2,2% em 2024, de 2,1% em 2025, de 2% em 2026, de 1,8% em 2027 e de 1,7% em 2028.
De acordo com uma análise do think-tank Bruegel, divulgada no final de junho, a previsão é de que Portugal registe um saldo primário estrutural de 2,2% este ano, sendo 2,6% a percentagem que satisfazia todos os critérios, e irá ter de fazer um ajuste orçamental médio de 0,09% no caso de um plano a quatro anos ou de 0,54% num plano a sete anos.
O plano será negociado durante o verão e, segundo Miranda Sarmento, entregue até 15 de outubro à Comissão Europeia. A data de entrega pelo Estados-membros para o primeiro bloco de planos de quatro anos está prevista para 20 de setembro, mas o prazo pode ser prolongado, por acordo entre a Comissão Europeia e o Estado-membro, por “um período razoável”, desde que de forma justificada, de acordo com o regulamento. Neste caso, até 15 de outubro, em conjunto com o envio da proposta orçamental.
No caso de um Estado-membro não apresentar o primeiro plano estrutural orçamental de médio prazo dentro do prazo, o artigo 19.º do regulamento especifica que o Conselho deve — sob recomendação da Comissão — recomendar ao Estado-membro em causa que a trajetória de referência emitida pela Comissão (em regra) sirva como a trajetória líquida das despesas do Estado-membro, recordou um porta-voz da Comissão Europeia ao ECO.
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