“Acelerar a economia” – mas para onde?
As medidas do Governo para acelerar a economia são bem-vindas, mas antes de pôr o pé no acelerador, convém saber para onde nos dirigimos e confirmar que a estrada está livre.
O Conselho de Ministros aprovou, recentemente, o Programa Acelerar a Economia, com 60 medidas para ajudar o país a enfrentar 20 desafios concretos. O conceito dos desafios é bom e lembra o conceito de missões aplicado pela Comissão Europeia ao programa Horizon Europe para a competitividade europeia e os ‘policy issues’, definidos pelo departamento de Estado do Governo norte-americano. De certa forma, define o caminho por onde se quer acelerar, o que é sempre um bom princípio.
Mas se as missões europeias são 5 e os ‘policy issues’ norte-americanos são 18, os nossos desafios são 20! Ou seja, ficamos logo com a ideia de que o trabalho vai ser complicado e que temos muito a fazer. Curiosamente, nestes 20 desafios não estão as alterações climáticas, que tanto a nível europeu como norte-americano aparecem mais do que uma vez – temas apenas a descarbonização e não é bem a mesma coisa. Também não está a saúde, que consta nas missões e nos ‘policy issues’ e que em Portugal é um dos grandes problemas identificados pela população.
Uma estrada de seis pistas
Algum dos desafios identificados são complementares ou interligados e poderiam estar agrupados em 6 “pistas” principais: Internacionalização (que não se faz sem escala, e portanto sem clusterização, capitalização e consolidação); Boa governança (que implica simplificação, transparência e adequada gestão da concorrência); Sustentabilidade (que implica descarbonização, sim, mas também um forte esforço de adaptação às já inevitáveis alterações climáticas, devendo ser esse o conceito principal a promover); Digitalização (e a consequente desmaterialização, mas também a preparação para a inteligência artificial); Captação e qualificação de Talento (onde se podem acrescentar questões de bem estar como a saúde), e Competitividade, que implica reindustrialização (que no nosso caso é mais renovação da indústria), empreendedorismo, produtividade acrescida e, claro, inovação.
Seis pistas é uma autoestrada suficientemente larga para acelerar à vontade, mas que permite, ainda assim, manter o foco no destino final, e sem curvas em excesso, algo em que temos sido especialistas nos últimos anos.
Mas antes de pôr o pé no acelerador, é preciso confirmar que esta estrada está livre e sem barreiras. Para isso são necessárias instituições eficientes, que possam implementar as medidas propostas sem burocracias excessivas, atrasos incomportáveis ou decisões inexplicáveis.
Ano após ano, sucessivos governos e os têm proposto novas medidas, mas a implementação destas medidas cai sempre nas mesmas organizações, que continuam a ser geridas e a funcionar como há 20 ou 30 anos.
É urgente a criação de uma rede de maior proximidade com os beneficiários, envolvendo intermediários, nomeadamente privados, na gestão dos programas como já faz a Comissão Europeia. E é urgente a adoção de mecanismos mais simples de verificação dos custos – como os métodos de pagamentos por tarefa e resultados – e não apenas por reembolso de despesa.
Destino: Portugal mais competitivo
Confirmando que não há barreiras e obstáculos desnecessários, antes de acelerar é também importante ter uma visão clara de e para onde pretendemos dirigir-nos. Neste caso, o destino deve ser um país que desenvolve, retém e atrai mais e melhores talentos, e empresas capazes de se afirmar na cena internacional. Um país preparado para os grandes desafios transformadores que já começamos a enfrentar, nomeadamente as alterações climáticas e o advento da inteligência artificial.
Algumas das medidas propostas no Programa Acelerar a Economia vão claramente na direção deste destino. Outras nem tanto. E faltam algumas mais ambiciosas e inevitáveis.
Começando pela área da inovação, no campo das boas medidas está o reforço dos incentivos fiscais sobre a despesa tecnológica, essencial para o aumento da competitividade. Neste tema é necessária uma avaliação mais criteriosa da despesa e um maior incentivo à despesa feita no âmbito de projetos europeus, que é a que mais pode reforçar o posicionamento competitivo das empresas portuguesas.
É de destacar também a ideia de um plano nacional de proteção da inovação, pois esta é uma área em que Portugal continua a sair mal na fotografia a nível europeu, como se vê nos resultados do European Innovation Scoreboard de 2024 recentemente publicados: ficamos no último terço dos países europeus neste critério. Contudo, esta medida necessita de ir mais longe do que a simples promoção da propriedade industrial, como consta do programa. Deve incluir a criação de verdadeiras estruturas de apoio, nomeadamente alojadas em privados.
Continuam a faltar também medidas que estimulem o desenvolvimento de novos produtos competitivos à escala europeia e global pelas empresas portuguesas, inclusivamente em parceria com empresas internacionais.
Reindustrialização, Sustentabilidade e Defesa
Nas áreas da Reindustrialização e Sustentabilidade, os programas de suporte a Infraestruturas Científicas Internacionais são muito positivos, mas é preciso uma verdadeira rede comercial de apoio, que ajude as organizações nacionais a venderem para o CERN, para o Joint Research Centre da Comissão Europeia ou para a Agência Espacial Europeia – e que não existe de momento.
Igualmente positiva é a inclusão de critérios ESG no Acesso a Incentivos e Contratos Públicos, mas antes é necessário garantir que existe uma oferta suficientemente forte, dinâmica e competitiva de consultadoria em ESG que possa servir a indústria nacional – algo que se pode assegurar com um processo de certificação e de vales, por exemplo.
Surge também, finalmente, a aposta na área da Defesa – uma inevitabilidade, onde se pode atalhar caminho com um estímulo da participação nacional nos programas do European Defence Fund. E é ainda evidente a aposta na capitalização de empresas, que é absolutamente essencial para que as empresas nacionais ganhem escala. Mas é necessário reforçar os estímulos à entrada nos mercados de capitais, única forma de as nossas empresas crescerem sem perder independência e mantendo os centros de decisão em Portugal.
“Não é o destino, é a viagem”
A INOVA+ tem antecipado algumas destas medidas. Tem uma forte presença em projetos europeus, nomeadamente nas Missões da União Europeia, onde é o maior participante nacional. Tem vindo a desenvolver competências nas áreas da defesa, sustentabilidade e tecnologia avançada – com a criação de um laboratório de inteligência artificial na Alemanha –, e está pronta a apoiar as organizações nacionais a acelerarem nesta autoestrada, rumo ao destino da competitividade global.
E se, como dizia Ralph Waldo Emerson, “não é o destino, é a viagem” – o que é bem verdade neste caso, pois o destino está também em constante movimento, já que a concorrência não para. É necessário garantir que a viagem é feita no pelotão da frente e, para isso, Portugal tem de acelerar rápido e com segurança.
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