O valor do trabalho
As pessoas vivem, na sua maioria, alheadas de quanto ganham de facto e de quanto lhes é retirado pelo Estado, subvertendo completamente o valor atribuído ao trabalho.
A literacia fiscal e financeira deve ser uma prioridade absoluta e assumida de qualquer sociedade progressista. Vivemos mergulhados num emaranhado de normas, regras, tributações, impostos diretos e indiretos, que afetam a nossa vida sem que tenhamos uma consciência fiscal na sociedade que lhe permita, sequer, ser crítica em relação a estes temas. As pessoas vivem, na sua maioria, alheadas de quanto ganham de facto e de quanto lhes é retirado pelo Estado, subvertendo completamente o valor atribuído ao trabalho e criando uma perceção que não corresponde à realidade.
Uma sociedade sem capacidade crítica, por sua vez, não fomenta um sistema democrático saudável e que dê resposta às necessidades das pessoas que abrange. Como podemos avaliar o que não conhecemos? Como podemos entender um sistema que nos é alheio? Como podemos decidir sem conhecermos todos os fatores que influenciam a nossa decisão? O caminho a percorrer é, definitivamente, o caminho da informação, da literacia e do fomento da capacidade crítica. Não há fator mais perigoso para a humanidade do que a desinformação pela ausência de informação. Veja-se o que acontece em países onde a desinformação impera. Logo se transformam em ditaduras propagandistas que oprimem as populações, fomentam a miséria e não protegem a dignidade do ser humano.
O papel das empresas nas comunidades em que se inserem vai bem mais além do que a simples atividade económica. As empresas são os verdadeiros agentes de transformação e evolução das sociedades. Desde logo porque são em si mesmas micro sociedades. “As empresas são as pessoas”: parece um lugar-comum, tantas vezes utilizado por mera estratégia retórica, mas ainda assim, apesar da expressão padecer desse mal de uso abusivo, ela encerra em si todo o conceito que corporiza o papel das empresas na sociedade. Elas são as pessoas, nas sociedades, nas comunidades e é por isso que o seu papel é tão maior do que gerar riqueza. Não que este último não seja de facto a sua razão de existir, mas o seu papel nesse processo vai muito mais além.
Na semana passada, a Associação Empresarial do Minho associou-se à iniciativa da Business Round Table Portugal, para desafiar os seus associados a incluírem, de forma clara, gráfica e percetível, todo o custo que o trabalhador representa para a empresa. Claro que logo se levantaram vozes, as tais da retórica oportunista assente na desinformação, a dizer que estávamos a oprimir os trabalhadores dizendo-lhes que eles são um custo. Ora, na verdade e tecnicamente, o valor dos salários, dos salários dos gerentes, acrescido de todos os recursos necessários para a atividade empresarial são um custo. Custo não é um termo negativo, ofensivo, pejorativo ou opressor. É o termo que caracteriza o que, em termos financeiros, o trabalho representa nas contas das empresas, entre outros fatores. Eu sou um custo para as minhas empresas quando das mesmas aufiro salários. Sem ofensa, com naturalidade. Mas aí não está o foco da nossa iniciativa.
Nós pretendemos que os trabalhadores saibam o valor que as empresas atribuem ao seu trabalho. O valor real. Que saibam também quanto desse valor vai para o Estado e depois criem consciência crítica sobre ele. Se um trabalhador recebe 1300€ na conta bancária, mas acrescidos os impostos, ele custa 2600€, ou seja, o valor que a empresa atribui ao seu trabalho é 2600€. Isto é importante em termos de literacia fiscal e financeira, de criação de consciência crítica na sociedade. Isto são as empresas a fazerem aquilo que o Estado não faz, informar. Se há setores que não gostam que as pessoas, as das empresas, sejam informadas, lamentamos, mas não vamos contribuir para a perpetuação da desinformação fiscal que existe em Portugal.
Histórica e oportunisticamente, foi fomentado por determinados setores da sociedade, ao longo dos anos, uma clivagem e um permanente clima divisionista entre empresários e trabalhadores. Dessa dinâmica resultaram diversos fatores de tensão, que em nada contribuem para melhores condições de trabalho, para o crescimento da economia, para salários mais elevados ou melhoria das condições de vida dos portugueses. A complexidade e impercetibilidade fiscal foram um dos fatores que estimularam esta dinâmica. Nós não contribuiremos mais para manter as pessoas, que são as empresas, desinformadas e alheadas de quanto ganham e de quando do que ganham lhes é retirado.
Faremos este caminho com determinação e arrojo, respeito e visão, com os trabalhadores, lado a lado, porque na verdade somos parte do mesmo todo. Somos uma comunidade, juntos, a purgar por melhores dias para os nossos filhos.
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