Editorial

Uma oportunidade única para ‘roubar’ investimento a Espanha

Se o Governo português perceber a oportunidade, num contexto orçamental muito favorável para aumentar a concorrência fiscal em relação a Espanha, poderá mudar a realidade da economia ibérica.

Afinal, a política fiscal tem mesmo impacto na decisão de investimento das empresas. A decisão da Repsol de transferir para Portugal um investimento de 15 milhões de euros em Sines por causa da política fiscal da geringonça espanhola de Sanchez é a evidência, pelos vistos necessária para alguns, de que o nível de tributação conta. E neste contexto de concorrência com Espanha, Portugal tem uma oportunidade única para atrair investimento industrial espanhol, especialmente na área da energia.

Há três notícias que vale a pena assinalar:

  1. Repsol confirma desvio de investimento para Sines. Construção de eletrolisador arranca em 2025.
  2. Las grandes energéticas negocian in extremis frenar el impuestazo.
  3. Portugal tem o quarto pior sistema fiscal da OCDE.

Comecemos pela última, a que está nas mãos dos decisores em Portugal, o Governo e, neste contexto parlamentar, da oposição do PS.

De acordo com o Índice de Competitividade Fiscal, Portugal é o quarto país fiscalmente menos competitivo da OCDE, em 35º lugar de 38. Mas o pior desempenho do sistema fiscal português continua a ser o relativo às empresas (Portugal mantém-se na penúltima posição), “sobretudo devido à elevada carga fiscal sobre as empresas e à complexidade“. Portugal tem a segunda taxa estatutária máxima de IRC mais elevada da OCDE, de 31,5%, que contempla 21% do imposto, à qual se somam a derrama municipal de até 1,5% e a derrama estadual que pode atingir os 9%. E Espanha? Está em 33º no índice geral, mas muito melhor do que Portugal no indicador relativo aos impostos sobre as empresas, no 29º posição. Também não é brilhante, mas por comparação, quase parece um paraíso fiscal.

A discussão sobre o orçamento do Estado para 2025 mostra bem que estamos longe de perceber o que é a força da política fiscal. O arranjo com o PS cortou uma descida anunciada do IRC de dois pontos percentuais em um ponto apenas. Uma redução simbólica de um imposto que deveria ter começado pelas derramas, e especialmente pela estadual, que impacta este tipo de investimento.

Ora, o Governo de Luís Montenegro tem uma oportunidade única perante um governo da geringonça espanhol, liderado pelo socialista Sanchéz que não gosta particularmente de grandes empresas e gosta sobretudo de taxas os seus lucros, para atrair investimento estrangeiro e particularmente de empresas espanholas como a Repsol. Aliás, a companhia petrolífera está já a desenvolver um projeto de mais de 600 milhões em Portugal e tem outros investimento em pipeline — nomeadamente no hidrogénio — que estão em processo de avaliação e discussão com vários governos, nomeadamente o espanhol e o português.

A proposta de Orçamento do Estado para 2025 não é um bom prenúncio. Não há subidas de impostos, mas as reduções de impostos são limitadas. É certo que os orçamentos não devem servir para fazer reformas do sistema fiscal, mas do que se sabe, a competitividade fiscal da economia portuguesa continuará a marcar passo e por exemplo impostos extraordinários ou de solidariedade vão continuar por cá. A CESE, sobre o setor da energia, foi criada no período da troika, com caráter temporário, mas será renovada pela 12º vez consecutiva no Orçamento do Estado para 2025.

Isso leva-nos às outras duas notícias. A Repsol vai mesmo avançar com a construção do novo eletrolisador em Sines, tendo dado ordem de suspensão de todos os investimentos de hidrogénio previstos em Espanha, depois de o Governo de Pedro Sánchez ter confirmado que, a partir de 2025, vai tornar permanente a cobrança do imposto extraordinário sobre as energéticas e o setor bancário. Ao ECO, fonte oficial da empresa confirma a relocalização do projeto, que se encontra já em fase de engenharia, estando previsto o arranque da construção no primeiro semestre de 2025 com entrada em funcionamento no início do ano seguinte.

Por outro lado, as outras grandes companhias energéticas espanhola — Cepsa, Iberdrola, Endesa e Naturgy — estão a desenvolver contactos com grupos parlamentares para travar a manutenção daquela taxa que foi criada há dois anos, talvez cópia da portuguesa, e que custou 1.200 milhões de euros em 2022 e mais de mil milhões em 2023.

Se o Governo português perceber a oportunidade, ainda por cima num contexto orçamental muito favorável para aumentar a concorrência fiscal em relação a Espanha, poderá mudar a realidade da economia ibérica. É uma questão de escolhas.

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