Marcelo apela à preservação da “ordem pública” após desacatos em Lisboa

  • Joana Abrantes Gomes e Lusa
  • 14:36

Presidente da República pede garantia da ordem pública perante desacatos na Grande Lisboa em protesto pela morte de um homem no bairro da Cova da Moura, baleado por um agente da PSP.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, apelou esta quarta-feira à garantia da “segurança” e da “ordem pública”, em particular “através do papel das forças de segurança”, na sequência dos desacatos das últimas horas em várias zonas da Grande Lisboa, após a morte de um homem baleado pela PSP.

Numa nota publicada no portal da Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa disse estar a acompanhar “atentamente” os acontecimentos, estando “em contacto com o Governo e os presidentes das câmaras municipais da Amadora e de Oeiras”.

Além da importância de preservar os “valores democráticos” da segurança e da ordem pública, o Chefe de Estado realça que essa garantia “tem de respeitar os princípios do Estado de Direito democrático, designadamente os Direitos, Liberdades e Garantias dos cidadãos, bem como fazer cumprir os respetivos Deveres”.

Apesar dos problemas sociais, económicos, culturais e as desigualdades que ainda a atravessam, [a nossa sociedade] é genericamente pacífica, e assim quer continuar a ser, sem instabilidade e, muito menos, violência“, sublinha ainda o Presidente da República na mesma nota.

Os desacatos na região de Lisboa — que já se alastraram aos concelhos de Lisboa, Amadora, Oeiras, Odivelas, Loures, Cascais e Seixal — tiveram início após Odair Moniz, de 43 anos e morador no Bairro do Zambujal, na Amadora, ter sido baleado por um agente da PSP na madrugada de segunda-feira, no Bairro da Cova da Moura, no mesmo concelho, acabando por morrer pouco depois, no Hospital São Francisco Xavier.

Segundo a PSP, o homem pôs-se “em fuga” de carro depois de ver uma viatura policial e “entrou em despiste” na Cova da Moura, onde, ao ser abordado pelos agentes, “terá resistido à detenção e tentado agredi-los com recurso a arma branca”.

A associação SOS Racismo e o movimento Vida Justa contestaram a versão policial e exigiram uma investigação “séria e isenta” para apurar “todas as responsabilidades”, considerando que está em causa “uma cultura de impunidade” nas polícias.

A Inspeção-Geral da Administração Interna abriu um inquérito urgente e também a PSP anunciou um inquérito interno, enquanto o agente que baleou o homem foi constituído arguido.

Desde a noite de segunda-feira foram registados desacatos no Zambujal e, já na terça-feira, noutros bairros da Área Metropolitana de Lisboa, onde foram queimados dois autocarros, automóveis e caixotes do lixo, e detidas três pessoas. Dois polícias receberam tratamento hospitalar devido ao arremesso de pedras e dois passageiros dos autocarros incendiados sofreram esfaqueamentos sem gravidade.

Esquerda repudia violência e critica Governo, direita sai em defesa da polícia

Em reação aos desacatos registados nas últimas 48 horas em vários bairros lisboetas, os partidos da esquerda parlamentar repudiam a violência, mas pedem que sejam apuradas as responsabilidades pela morte de Odair Moniz, com o Livre a admitir chamar a ministra da Administração Interna à Assembleia da República. À direita do hemiciclo, PSD e CDS elogiam as forças de segurança, enquanto o Chega e os liberais apelam a um reforço policial.

O PS, através da líder parlamentar Alexandra Leitão, criticou o défice de intervenção do Governo para conter o alarme social na sequência dos desacatos na Grande Lisboa e defendeu uma “intervenção moderada para garantir a segurança e um trabalho multidisciplinar nos bairros“.

“Lamentamos a morte do cidadão no quadro de um incidente com a polícia. É preciso apurar todas as circunstâncias que rodearam essa morte e isso é fundamental. Sobre isso não direi mais até se saber exatamente quais são essas circunstâncias”, ressalvou a presidente da bancada socialista.

Mais crítico da ação policial, que considera que, “vezes demais, não trata os cidadãos da mesma forma, o presidente da bancada parlamentar do Bloco de Esquerda, Fabian Figueiredo, pediu uma “polícia sintonizada com o Estado de Direito” e alertou para uma “permanente estigmatização” de pessoas racializadas.

Ser negro em Portugal aumenta a probabilidade de ser atingido mortalmente pelas forças de segurança 21 vezes. As populações das áreas urbanas de Lisboa, as pessoas racializadas, merecem um tratamento igual perante o Estado, merecem ser cidadãos de pleno direito”, sustentou Fabian Figueiredo.

Falando aos jornalistas, o deputado do PCP António Filipe repudiou “quaisquer atos de violência e manifestações de apelo ou incitamento à violência”, pedindo “serenidade” e “calma” às populações, e, simultaneamente, para que haja uma “intervenção policial que seja adequada e proporcional às circunstâncias existentes”.

Sobre a morte de Odair Moniz, que foi baleado fatalmente por um agente da PSP na madrugada de segunda-feira, no Bairro da Cova da Moura, António Filipe exigiu um “esclarecimento cabal do que aconteceu”, uma vez que, disse, a “polícia serve para proteger os cidadãos e garantir a tranquilidade dos cidadãos”.

Numa posição transmitida pelo deputado Paulo Muacho, o Livre criticou a reação da ministra da Administração Interna, Margarida Blasco — que classificou os distúrbios dos últimos dias como “inadmissíveis” –, considerando que pode “acicatar ânimos”. Deve haver a capacidade de a situação serenar e é preciso também perceber o que está a falhar”, apontou.

“Logo que se consigam apurar mais algumas circunstâncias” deste caso, o deputado adiantou que o Livre irá chamar Margarida Blasco ao Parlamento para esclarecer “o que é que efetivamente aconteceu” desde o momento em que Odair Moniz foi morto por um agente da PSP.

o PSD e o CDS elogiaram a ação desenvolvida pelas forças e serviços de segurança para a reposição da ordem pública em várias zonas da periferia de Lisboa e condenaram extremismos e aproveitamentos políticos da situação.

Não obstante, Hugo Soares, líder da bancada parlamentar social-democrata, considerou que “sempre que há excecionalidades elas devem ser investigadas”, numa alusão à situação do agente da PSP que baleou mortalmente Odair Moniz e que já foi constituído arguido.

João Almeida, em representação do partido centrista, salientou que se tem assistido a “atos de vandalismo inaceitáveis”, considerando que aqueles que contribuíram para esses atos “devem ser severamente punidos”. Além disso, o deputado do CDS acusou as posições do BE e do Chega de “incitarem à violência e ao ódio”.

Antes de João Almeida e Hugo Soares, o presidente do Chega havia defendido que é preciso “tolerância zero” com quem causa distúrbios, tendo pedido ao Governo uma “condenação inequívoca” dos desacatos ocorridos nas últimas noites na Grande Lisboa.

“Ou nós damos um sinal político, a esta hora, de que estas pessoas terão margem zero e tolerância zero, ou nós arriscamos outra noite de conflitos, outra noite de turbulência e outra noite de desacatos. Não pode haver tolerância”, afirmou André Ventura, que classificou os autores dos desacatos como “rascaria” e “bandidagem pura”.

Por sua vez, o líder da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, apelou ao reforço do policiamento e intervenção do Estado “para repor a ordem” depois dos desacatos na Área Metropolitana de Lisboa e acusou o Chega e o BE de serem “abutres” a querer “incendiar a cena política”.

 

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