UTAO valida contas do Governo até 2028 no défice e dívida

A unidade técnica de apoio aos deputados conclui que o plano orçamental de médio prazo até 2028 está de acordo com as novas exigências de Bruxelas para o défice e a dívida pública.

As previsões orçamentais do Governo que constam do plano de médio prazo até 2028 “permitem o cumprimento da cláusula de salvaguarda da resiliência do défice” e a “salvaguarda da sustentabilidade da dívida” de acordo com as novas regras comunitárias, considera a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) na análise preliminar à proposta de Orçamento do Estado para 2025 à luz do novo Plano Orçamental-Estrutural Nacional de Médio Prazo 2024–28 (POENMP), já enviada para o Parlamento e a que o ECO teve acesso. O relatório da UTAO aponta, ainda assim, riscos à execução orçamental e é crítico da estratégia das ‘cativações’ e dos chamados “cavaleiros orçamentais” no orçamento para o próximo ano e que já tem a viabilização assegurada com a abstenção do PS.

O relatório deste organismo independente de apoio aos deputados explica, em primeiro lugar, as mudanças decorrentes da entrada em vigor das novas regras orçamentais da União Europeia, e do respetivo calendário, que vêm substituir os planos de estabilidade entregues em abril. Desta forma, a UTAO justifica a análise aos dois documentos em simultâneo, avaliando a sua coerência. E, neste ponto, o organismo liderado por Rui Baleiras — e no qual já trabalhou, também, o ministro das Finanças Miranda Sarmento — valida o cumprimento das regras europeias.

“Em 2025, o crescimento previsional da despesa líquida (4,9%) situa-se ligeiramente abaixo do teto anual da trajetória de referência do Plano Orçamental-Estrutural Nacional de Médio Prazo 2024–28 (5,0%), o que indica o cumprimento deste critério. Neste ano, as previsões subjacentes ao indicador estão coerentes com a POE/2025”, detalha a UTAO. E acrescenta: “As previsões da evolução do saldo estrutural até 2028 permitem o cumprimento da cláusula de salvaguarda da resiliência do défice. De acordo com a trajetória prevista para o saldo estrutural, Portugal cumprirá, com margem confortável, os pressupostos da salvaguarda da resiliência do défice. A trajetória prevista no POENMP/2024-28, ao longo do horizonte de projeção, cumpre simultaneamente o critério anteriormente em vigor de redução de um vigésimo do rácio da dívida pública, bem como o critério atualmente em vigor de salvaguarda da sustentabilidade da dívida“.

O que está, afinal, em causa? “Estes planos [orçamentais] incluem uma trajetória orçamental nacional definida em termos de despesa primária líquida a título de único indicador operacional e devem ser coerentes com uma trajetória de referência da Comissão baseada numa metodologia comum. A trajetória de referência da Comissão deve assegurar um esforço orçamental no sentido de colocar a dívida numa trajetória suficientemente descendente ou de a manter a níveis prudentes, respeitando os critérios de salvaguarda da sustentabilidade da dívida e salvaguarda da resiliência do défice“.

A UTAO alerta que “a sequência de tetos anuais para o crescimento da despesa primária líquida, apresentada pelo Governo, diverge da trajetória de referência da Comissão Europeia“, mas acrescenta que a previsão da taxa média anual no período 2025 a 2028 é igual à da CE (3,6%). “Em 2025, o crescimento previsional da despesa líquida (4,9%) situa-se ligeiramente abaixo do teto anual da trajetória de referência da POENMP (5,0%), o que indica o cumprimento deste critério. (…) As previsões da evolução do saldo estrutural até 2028 permitem o cumprimento da cláusula de salvaguarda da resiliência do défice. De acordo com a trajetória prevista para o saldo estrutural, Portugal cumprirá, com margem confortável, os pressupostos da salvaguarda da resiliência do défice“. Em simultâneo, “a trajetória prevista no POENMP/2024-28, ao longo do horizonte de projeção, cumpre simultaneamente o critério anteriormente em vigor de redução de um vigésimo do rácio da dívida pública, bem como o critério atualmente em vigor de salvaguarda da sustentabilidade da dívida“.

‘Cativações’ e ‘cavaleiros orçamentais”…

O relatório da UTAO à proposta de orçamento para 2025 e ao plano orçamental de médio prazo é crítico em relação às chamadas ‘cativações’, isto é, aos “instrumentos não convencionais de controlo da despesa” especialmente na aquisição de bens e serviços, que, como o ECO revelou em primeira mão, atingem um valor recorde no próximo ano. “Em termos financeiros, as restrições previstas para 2025 mantêm as restrições introduzidas em anos anteriores“, explica a UTAO. É remetido para governante de cada área setorial, “o poder (discricionário) de autorizar a execução de despesa com a aquisição de serviços acima dos limites estabelecidos, ainda que o serviço ou organismo em causa tenha dotação disponível no orçamento aprovado pela Assembleia da República”. Mas, como salienta a UTAO, “é forçoso que estas restrições venham a repercutir-se negativamente sobre a qualidade (e quantidade) dos serviços públicos prestados às pessoas e às empresas. A necessidade de introduzir um elevado número de exceções é um sinal de que a regra definida não será o melhor meio para atingir o fim pretendido”.

Já sobre os chamados “cavaleiros orçamentais”, a UTAO assinala um artigo publicado no ECO no qual o ministro das Finanças prometia acabar com essa solução. De que se trata? De medidas sem relevância orçamental ou cujo conteúdo é apenas programático, mas que se tornaram um hábito nos orçamentos. “Procurámos simplificar bastante o articulado e, sobretudo, eliminar as designadas normas cavaleiras orçamentais. Ou seja, vamos ter um articulado que não terá normas programáticas, porque elas não têm valor orçamental e do ponto de vista das normas fiscais iremos procurar ter de forma muito simplificada“, disse o ministro. Mas a UTAO considera que esse objetivo está por cumprir.

A extensão do clausulado pode ser um sinalizador da quantidade de cavaleiros orçamentais. Note-se que uma lei orçamental que se limite a definir a restrição orçamental provavelmente não necessitará do que mais de 20 artigos“, mas a proposta de orçamento tem mais de 160 artigos. A unidade técnica reconhece os esforços feitos por Miranda Sarmento, contudo, serão insuficientes. “A PPL/OE–2025 é claramente menos extensa do que a proposta de lei do OE para 2024. Tem 165 artigos contra 198 um ano antes; o articulado ocupa 192 páginas contra 271 um ano antes. Em ambos os anos, números com esta dimensão excedem claramente os estritamente necessários para o Parlamento aprovar os termos da execução orçamental. Imediatamente lançam a suspeita de que há cavaleiros à boleia“.

…e poucas medidas novas

“Em comparação com os anos anteriores, a POE/2025 apresenta um número reduzido de novas medidas e um impacto agregado residual no saldo orçamental, indiciando que o Governo, face à dimensão orçamental das medidas permanentes previamente adotadas, decidiu não alterar com materialidade relevante o impacto orçamental projetado para o cenário final de 2025”, lê-se no relatório da UTAO. “As novas medidas permanentes de política orçamental, identificadas na Proposta de Orçamento do Estado para 2025, acarretam, após a revisão da UTAO, um impacto líquido negativo de 0,02% do PIB no saldo orçamental. Este impacto resulta, principalmente, da menor arrecadação de IRS, decorrente da medida ‘Alargamento do IRS Jovem’, e do aumento da receita de impostos indiretos, devido à medida ‘Atualização da taxa de carbono’“, detalha a equipa de Rui Baleiras.

A UTAO considera que a proposta de orçamento para 2025 é expansionista pró-cíclica, ao contrário do que sucede este ano, quando é expansionistas, mas num contexto de abrandamento da economia. “Tendo por referência os dados da POE/2025, a política orçamental no ano em curso de 2024 deverá ser expansionista contracíclica, refletindo uma degradação do saldo primário estrutural num contexto de deterioração da conjuntura económica. Para 2025, caso se concretizem as previsões da POE/2025, a política orçamental será marginalmente expansionista pró-cíclica, refletindo um contexto de ligeira deterioração do saldo primário estrutural e de melhoria residual da atividade económica“.

 

As medidas de política pública em vigor “carreiam um impacto adicional líquido para o saldo orçamental de 2025 negativo em 5 172,4 M€ (1,76% do PIB)”, lê-se no relatório, mas a UTAO salienta que “a dimensão do impacto incremental das medidas antigas permanentes foi influenciado pela adoção de medidas de política orçamental ao longo do ano de 2024″ que valem “um incremento adicional líquido negativo no saldo orçamental de 1 170 M€“.

Há outro alerta da UTAO: “Verifica-se que o peso das medidas permanentes (anteriores e novas) iguala a receita. No entanto, este equilíbrio é frágil, uma vez que a despesa permanente terá uma tendência crescente nos anos vindouros, especialmente no que diz respeito às despesas com pessoal e pensões, enquanto a receita, particularmente na sua componente fiscal, tende a desacelerar face ao registado em anos anteriores, acompanhando o ciclo económico”.

E os riscos, externos e internos, são identificados pela UTAO. Por um lado, “a escalada das tensões no Médio Oriente, com possibilidade de regionalização do conflito, constitui um risco descendente, por via da subida dos preços do petróleo e do gás nos mercados internacionais, transmitindo-se ao cenário por via do agravamento dos custos com a energia e da necessidade de estímulos orçamentais para mitigar efeitos adversos“. Por outro, “o ritmo de implementação do PRR permaneceu aquém do programado entre 2022 e 2023, um padrão que se repete em 2024 e compromete o objetivo de 2025. A incapacidade de executar a despesa no horizonte programado poderá inviabilizar a completa implementação deste plano de investimentos“.

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