Prolongamento da concessão da Fertagus “poupa” 5,5 milhões ao Estado
A concessão da Fertagus foi prolongada até março de 2031, como resultado do REF pedido pela concessionária do comboio da Ponte 25 de Abril, para compensar a quebra de receita nos anos da pandemia.
A prorrogação do contrato de concessão da Fertagus em seis anos e seis meses permitiu ao Estado evitar o pagamento de 5,5 milhões de euros à concessionária do comboio da Ponte 25 de abril. Este foi o valor de compensação acordado no âmbito da negociação do pedido de reposição do equilíbrio financeiro (REF) realizado pela empresa do grupo Barraqueiro pela perda de receitas nos anos da pandemia, que compara com os 6,76 milhões de euros do pedido inicial feito pela concessionária.
Segundo adiantou ao ECO fonte oficial do Ministério das Infraestruturas e da Habitação (MIH), “o pedido inicial de REF da concessionária apontava para 6.763.629 euros”. No entanto, “no quadro do processo negocial foi possível reduzir o valor de REF aceite pelas partes para 5.550.709 euros, o que, face às projeções financeiras estimadas, acabou por determinar uma redução para 6 anos e 6 meses, ou seja, até 31 de março de 2031.”
O pedido de reposição do equilíbrio financeiro feito pela Fertagus foi realizado ao abrigo do Decreto-Lei n.º 19-A/2020, um “regime excecional e temporário de reequilíbrio financeiro de contratos de execução duradoura” por conta da primeira vaga da pandemia que, devido às medidas de confinamento, impediu a circulação de pessoas.
O diploma aprovado por altura da Covid-19 previa que, “nos contratos em que se preveja expressamente o direito do contraente ou parceiro privado a ser compensado por quebras de utilização ou em que a ocorrência de uma pandemia constitua fundamento passível de originar uma pretensão de reposição do equilíbrio financeiro, tal compensação ou reposição só pode ser realizada através da prorrogação do prazo de execução das prestações ou de vigência do contrato”.
O Ministério das Infraestruturas e da Habitação adiantou ainda que o processo de negociação para estabelecer as condições da compensação à Fertagus foi liderado por uma comissão de negociação constituída para este efeito, cuja “prioridade foi reduzir essa prorrogação ao período mínimo indispensável“.
“Verificou-se que, num cenário de expansão da oferta, com reforço do programa de exploração, nomeadamente levando um maior número de comboios até Setúbal (…), seria possível obter um prazo de prorrogação menor para o mesmo montante de reposição do equilíbrio financeiro, tendo sido essa a opção da Comissão de Negociação”, descreve o ministério liderado por Miguel Pinto Luz.
O ministro Leitão Amaro adiantou em setembro, após o Conselho de Ministros que aprovou o prolongamento da concessão, que o prazo definido desta decisão foi decidido por uma comissão que apontou para uma prorrogação da concessão de seis anos e cerca de seis meses, apesar de “a concessionária ter pedido 11 anos de prolongamento”. Um período que, segundo os números partilhados pelo ministério, correspondia a uma compensação avaliada em 6,76 milhões de euros.
Segundo o relatório e contas de 2020, a Fertagus fechou esse ano com um resultado líquido de 393,6 mil euros, um montante que compara com lucros de 3,3 milhões de euros, em 2019. No ano seguinte, 2021, a empresa conseguiu melhorar os resultados, fechando o ano com lucros de 631,6 mil euros, números, ainda assim, bastante inferiores aos registados nos anos anteriores à pandemia.
Apesar da acentuada quebra dos resultados, a Fertagus não registou prejuízos em nenhum dos anos da pandemia, o que já levou o PCP a pedir uma audição parlamentar ao ministro das Infraestruturas para que “esclareça quais os fundamentos em que foi aceite a exigência de reequilíbrio financeiro da Fertagus que deu origem” à prorrogação do contrato em seis anos e seis meses.
“Se tivermos em conta que a Fertagus não teve prejuízos durante a pandemia, registando-se um aumento substancial dos financiamentos públicos na operação, questiona-se a legitimidade de tal decisão agora confirmada pelo Conselho de Ministros“, refere ainda.
O ministério das Infraestruturas e Habitação acrescenta ao ECO que “o REF em causa, ainda que realizado ao abrigo do Decreto-Lei n.º19-A/2020, de 30 de abril, não visa compensar pela pandemia de Covid, mas sim pela falta de pagamento pelo Estado de montantes devidos à concessionária ao abrigo de cláusulas contratuais de acerto, decorrentes da matriz de risco da concessão.”
A mesma fonte não especifica se o ministério irá encaminhar a extensão do contrato ao Tribunal de Contas. Em declarações ao ECO, feitas após a aprovação da prorrogação do contrato, fonte oficial do Tribunal de Contas limitou-se a adiantar que a entidade não podia responder a qualquer questão sem ter “conhecimento oficial da extensão do contrato, que foi operado por decreto-lei, conforme comunicado do Conselho de Ministros”, não especificando se tinha conhecimento do contrato ou existia necessidade de fiscalização prévia por parte do TdC.
Sobre a possibilidade de prolongar outras concessões devido à Covid-19, o ministério das Infraestruturas e Habitação referem que “o Estado não aceitou a pandemia de Covid como sendo um evento que origina REF dos contratos de concessão“.
Terceiro prolongamento da concessão
No que diz respeito à Fertagus, esta é a terceira renegociação do contrato da empresa, que começou a operar o comboio da Ponte 25 de Abril em julho de 1999, com uma concessão por 30 anos. A primeira alteração surgiu em 2005, por conta da utilização abaixo do previsto: após dois anos de conversações, o contrato foi encurtado para durar até 2010, mantendo a empresa o direito a receber compensação do Estado.
A partir de 2005, o Estado passou a ser o proprietário dos 18 comboios da Fertagus (iguais aos comboios de dois pisos dos suburbanos da CP), que tem de pagar uma renda anual para utilizar o material circulante. Também nesse ano ficou estabelecido que a Fertagus poderia comandar a operação até ao final de 2019, mas sem receber pagamento público.
A opção de prolongamento foi acionada, mas não muito tempo depois Fertagus e o Estado voltaram a negociar, a partir de 2012: a concessionária sentiu-se penalizada pelo aumento do valor da tarifa de utilização das linhas de comboio, que foi determinado pela então Refer (e atual IP) em dezembro de 2011 e que não estava previsto no contrato. Os anos passaram e o valor em dívida da taxa de utilização atingiu os 7,6 milhões de euros.
Depois de sete anos de conversações, em vez de o Estado pagar à empresa que gere as linhas de comboio, chegou-se a acordo, em dezembro de 2019, para prolongar a concessão por mais quatro anos e nove meses, até 30 de setembro de 2024. Um contrato que volta agora a ser prolongado até março de 2031, com vista ao reequilíbrio financeiro da empresa.
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