Fernando Braz, Portugal Country Leader da gigante Salesforce, mostra preocupação com a resistência das empresas com cerca de 500 colaboradores às ferramentas digitais. É o podcast 'À Prova de Futuro'.
Fernando Braz lidera o escritório em Portugal aberto pela Salesforce, gigante global de Customer Relationship Management, em 2020. Não revela números, mas diz que o negócio “tem corrido muito bem”, especialmente nos segmentos de grandes e pequenas empresas. As médias preocupam, no entanto, pois muitas acham que o negócio corre bem e que “ter um site puramente informativo é o digital suficiente”.
Em entrevista ao podcast do ECO ‘À Prova de Futuro’, o gestor explica ainda que os chatbots “tal como os conhecemos, morreram” e que os da próxima vaga vão usar linguagem natural para conversar com os clientes de forma imediata, sem latência, e já com voz.
No Customer Experience, ou experiência do cliente, o foco irá continuar a ser na personalização, antevê, salientando “o valor inestimável” dos dados e a importância das ferramentas de software para tratar e analisá-los.
Ouça o episódio do ‘À Prova de Futuro’ no leitor abaixo:
Vamos começar por falar um bocado pelo aspeto global da Salesforce, uma empresa gigante global, com receitas anuais de mais de 30 mil milhões dólares. Tudo à volta de software na cloud de Customer Relationship Management (CRM) . Gostaria que nos explicasse um bocado o que é esse produto, como é que funciona e melhora a experiência do cliente.
Muito obrigado pelo convite. A Salesforce é uma empresa que tem 25 anos, nasceu na cloud em 1999 e arrancou efetivamente com a sua oferta de CRM, onde permite exatamente aquilo que nós sabemos, ter uma base tecnológica que permita, no caso, ter uma visão sobre tudo aquilo que representou o cliente, seja uma empresa, seja a nível individual, usando os jargões, tanto serve B2C como serve o B2B, ainda que seja mais aplicada na área do B2B, porque a nível do consumidor final não faz tanto sentido, a não ser ter dados para que se tenha uma perceção do que é a margem ou o addressable desses segmentos de mercado. São, ferramentas que são importantes para o dia-a-dia de todas as empresas. Portanto, é difícil nos dias de hoje, nos anos de hoje, o entender ou aceitar que uma empresa não tenha uma ferramenta dessas para gerir o seu negócio. Ainda gerem muito, por vezes, numa simples folha de cálculo ou num documento word.
À moda antiga.
Exatamente ou numa ferramenta de contactos, o que é difícil no mundo global em que estamos hoje, conseguir gerir o seu negócio com uma ferramenta simples como essas. Portanto, é importante e fundamental ter uma ferramenta que permite ter a visão sobre tudo aquilo que são as suas transações, os negócios e por aí fora.
O vosso software é de 360 graus, portanto estamos falar do lado do cliente para vocês, para a empresa, nomeadamente, e da empresa de volta para o cliente, através de newsletters, campanhas de marketing, etc.
Ele é complementar com outras peças importantíssimas que são o serviço de apoio ao cliente. Costumo dizer que o mais importante que uma ferramenta CRM é, é ser a ferramenta que permite o serviço de apoio ao cliente, porque é uma oportunidade de servirmos melhor o cliente, seja proativamente ou reativamente. Depois temos a capacidade de comunicar com ele, onde usamos as chamadas ferramentas de marketing, que permite fazer campanhas, permite fazer as comunicações, permite ter a capacidade de segmentação, porque por vezes, como nós sabemos, isso já são ferramentas que já existem há algum tempo. Não queremos comunicar igual ou fazer uma campanha igual para todas as pessoas ou todos os segmentos, porque cada segmento ou cada pessoa é diferente. E depois as ferramentas também de comércio online que tudo junto, e efetivamente tem essa capacidade única, a Salesforce é a única empresa que tem a capacidade de ter uma plataforma que, comercialmente, por assim dizer, tem a visão do cliente 360.
Com os dados que isto deve gerar, vocês acabam por ter uma visão muito interessante também do mercado de consumo. Gostaria que partilhasse comigo algum aspetos das tendências ou conclusões a que um software como o vosso permite chegar.
Há cerca de dez anos ou mais se criou este paradigma de mercado que os dados o new oil, o novo petróleo, porque efetivamente são os dados que permitem analisar e conhecer melhor o nosso negócio e conhecer melhor os nossos clientes. É importantíssimo que as empresas entendam que neste mundo atual, que esses dados são verdadeiramente de um valor inestimável. Conhecer o nosso cliente em várias dimensões é importantíssimo e eu só posso servir melhor o meu cliente, só posso ter uma ambição de crescer o meu negócio quanto melhor eu conhecer o meu cliente. E o conhecer o meu cliente, não é eu por vezes a nível individual, se for uma empresa de menor dimensão ou um indivíduo que trabalha com um conjunto de pessoas há muito tempo que tem os seus próprios dados.
Eu recordo me como há muitos anos, quando comecei nas vendas, tive um comercial que me dizia que não colocava os dados no nosso sistema porque os dados dos clientes eram dele. Mas faz parte de um ciclo e as coisas foram evoluindo. E portanto os dados para as empresas são algo importantíssimo. E são esses dados que são difíceis de trabalhar, porque os dados hoje são os estruturados, que são aqueles que designadamente estão numa ferramenta de CRM, numa ferramenta de RP, e são os não-estruturados, aqueles que passam na web, quando nós estamos a navegar e estamos a consultar as páginas, são dados importantíssimos que grande parte delas não conseguem ler, não conseguem interpretar que eu estive no site daquela empresa, e o que é que eu estive a ver. São dados não-estruturados, como ficheiros ou como emails ou todas as outras formas que não estão dentro destas aplicações. E portanto esse volume de dados é hoje enorme, gigante e as empresas têm dificuldade em trabalhá-los, em entendê-los. E é essa dificuldade que torna ineficaz, e muitas das nós ouvimos em vários testemunhos, eu investi numa plataforma investir nisso e continuo perdido nos dados. Ok, é preciso aplicar as melhores práticas, é preciso simplificar, porque muitas das vezes nós não estamos a simplificar, nós a empresas estamos a complicar. E eu costumo dizer, o caso da Salesforce nasceu em 1999 na cloud. Quantos de nós., que estávamos preocupados com o bug do ano 2000, colocávamos nessa altura os dados na cloud? Nenhum. Nós colocamos a cloud por força dos Facebooks da da vida e por aí fora que impulsionaram. Mas até há uns anos atrás ninguém colocava os dados, e muito menos as empresas. Hoje em dia já temos o setor público a entender a necessidade de colocar os dados na cloud, por que são mais seguros, são mais escaláveis e, portanto, permite conhecer e servir melhor o cidadão. Mas isto foi uma evolução e esta evolução não para hoje em dia. No caso, por exemplo, de Salesforce, nós acabamos de lançar os agentes autónomos, que permite, através de um chat, teres linguagem natural.
O que agora vem é esta nova onda, que é os agentes autónomos, são bots, por assim dizer, em linguagem natural, onde o cliente ou a pessoa está a falar, a interagir com a empresa, com esse serviço, a escrever mensagens e que já há também voz, e atenção, a voz vai chegar a qualquer momento da mesma forma, mas é mais fácil neste momento vir através do texto e nós interagimos.
Era essa a minha pergunta seguinte. Como é que a tecnologia está avançar no vosso negócio. Inteligência Artificial? Chatbots?
Exatamente. Os bots como nós os conhecemos, estão ultrapassados neste preciso momento. Morreram, por assim dizer, porque esses bots, que toda a gente detesta, que é carregar um para não sei quê, carregar dois e depois nunca aparece o operador. E isso, entre aspas, desapareceu. O que agora vem é esta nova onda, que é os agentes autónomos, são bots, por assim dizer, em linguagem natural, onde o cliente ou a pessoa está a falar, a interagir com a empresa, com esse serviço, a escrever mensagens e que já há também voz, e atenção, a voz vai chegar a qualquer momento da mesma forma, mas é mais fácil neste momento vir através do texto e nós interagimos.
Vão pensar e responder de imediato?
De imediato, não está em latência. E o ponto é como é que vou conseguir, através das ferramentas, servirem ainda melhor o meu cliente. Quanto melhor forem os meus dados, sejam eles mais uma vez estruturados ou não-estruturados. Porque a tecnologia evoluiu imenso e tal como há uns anos atrás quase não se acreditava que era possível ter estas ferramentas de CRM e conhecer a visão do cliente, comunicar tudo integrado, como é que eu faço para aquele o segmento face a campanha A ou B ou C, hoje em dia, sim, já é possível. Na Salesforce tenho a oportunidade de trabalhar numa empresa que já está a oferecer neste preciso momento aos clientes a capacidade de terem estes agentes para divulgar. E isto vai abrir uma enormidade de oportunidades, algumas positivas, outras mais desafiantes.
Isto vai mudar de forma fundamental o negócio de contact?
Claramente.
O escritório da Salesforce em Portugal é relativamente recente, desde 2020. Qual foi a lógica de abertura e como é que corre o negócio?
Foi numa lógica natural de crescimento que a companhia tem tido ao longo da sua vida. Continuamos a abrir escritórios pelo mundo fora. O último, que eu saiba, foi o Dubai. Não sei dizer a razão especificamente que levou a parte corporativa a decidir por Portugal. Acho que é óbvio que estar ao lado Espanha, estarmos envolvidos numa operação ibérica e, portanto Portugal era natural face dentro da Europa mais central, que aderisse. Tem corrido muito bem. Temos tido um crescimento ótimo, uma adoção incrível. Normalmente estas empresas endereçam o mercado em três segmentações: as grandes empresas, as médias empresas e as empresas de menor dimensão. À Salesforce tem corrido extraordinariamente bem, por incrível que possa surpreender, nas pequenas empresas. É um mercado que nós temos uma pegada enorme. Também nas grandes empresas, as grandes instituições bancárias, as operadoras de telecomunicações.
Aí já não é tão surpreendente.
Aí já não é tão surpreendente. Mas onde me preocupa como cidadão é aquilo que eu designo como o espelho da economia portuguesa, que são as empresas com 400, 500 ou 600 empregados que efetivamente resistem ainda em entender que têm que abraçar o mundo digital.
Porque têm gestores mais velhos, mais antiquados?
É difícil comentar. Muitas vezes a nossa perceção é que o negócio está a correr bem, mas não entendem que há uma concorrência global, ou europeia, há uma concorrência sobretudo ibérica. Eu trabalho muito também o mercado ibérico e tenho a perceção que Espanha está uns passos à frente. E eu, como português, preocupa-me porque conversamos com algumas das pessoas que acham sempre que estão bem e que ter, por exemplo, um website unicamente informativo já é o digital suficiente. Se a parte fiscal, por exemplo, ajudou, entre aspas, na obrigatoriedade de ter um sistema de contabilidade, aqui na área de conhecer cliente, obviamente não se pode obrigar a ter uma plataforma. Mas como é que é possível que esse conhecimento resida na cabeça das pessoas ou resida em ficheiros isolados? Não é uma questão de estar centralizado, é uma questão de conhecer o cliente, ter um histórico para poder evoluir e para poder crescer e apostar às vezes nas áreas certas. Porque às vezes as pessoas não são insubstituíveis e as empresas têm que ter uma sucessão?
"Eu que tenho 50 e poucos anos, deixa me sempre surpreendido ver alguns destes jovens que muitas vezes herdam os negócios da família e acham sempre que se eu tenho uma fábrica, é muito mais importante comprar um equipamento para a fábrica do que investir algo no digital.”
É uma coisa geracional? Muitas das empresas pequenas são startups, mais tecnológicas, portanto se calhar têm essa vantagem.
E aí é uma dos grandes footprints. São as empresas startups e as empresas que são efetivamente geridas por jovens. Mas por vezes também encontramos os jovens mais envelhecidos, por assim dizer [risos]. Eu, que tenho 50 e poucos anos, fico sempre surpreendido ver alguns destes jovens que muitas vezes herdam os negócios da família e acham sempre que se têm uma fábrica, é muito mais importante comprar um equipamento do que investir algo no digital. Os pagamentos através do digital, já se fazem consultas e compram-se coisas. É inevitável, não dá para, como se costuma dizer na gíria, parar uma onda com as mãos, não se consegue e portanto o digital não se vai conseguir parar.
O que é importante é ter os parceiros certos, as ferramentas certas para que possamos ajudar. Acho que a Salesforce pela confiança que muitos clientes nos dão, somos uma empresa que podemos ajudar, que estamos disponíveis para ajudar, porque se assim não fosse, não haviam empresas sejam grandes e mais pequenas, sobretudo as grandes, e não são por serem grandes, por terem mais dinheiro, são grandes porque entendem que a empresa consegue ir ao encontro das necessidades que eles têm, não só de confiança, porque é muito importante ter uma plataforma que dá a confiança da segurança que é hoje um dos principais riscos.
A cybersecurity é um dos principais pontos e nós, por exemplo, temos tido a sorte, nascemos na cloud e até hoje nunca tivemos nenhum ataque, nenhum incidente grave. E portanto, isso é muito importante nós entendermos e temos alguns casos que foram conhecidos no mercado português, alguns até mais associados com o desporto, onde a facilidade de os dados não estarem devidamente protegidos ou acharmos que estando na nossa casa que estão mais protegidos não é verdade. Existem entidades e plataformas que protegem e estão capazes para servir melhor os dados.
Como é que a inteligência artificial, por exemplo, vai mudar a forma de contacto com os clientes. Como é que vê o Customer Experience a mudar nos próximos anos, o que é que os consumidores vão querer e como é que as empresas vão conseguir reagir a essas necessidades?
Eu deixo para o fim aquilo que vejo. Mas digo que muito desse futuro já existe, muito ao encontro da personalização. Acho que quase todos nós gostamos um bocadinho quando abrimos uma Netflix ou quando compramos habitualmente num site, seja bens de consumo, seja outro tipo de bens, e entendemos que o site está um pouco personalizado aos meus gostos com base nas visitas que fazemos, com base nas coisas que adquirimos. Apreciamos essa personalização e, portanto, o digital, a experiência do utilizador oferece isso. Lá está, é o trabalhar dos dados, perceber o que é que este cliente costuma visitar. Perceber o que é que este cliente costuma comprar que me permita a empresa oferecer me a mim como consumidor isso mesmo. E no nível B2B, a mesma coisa. Se percebo o tipo de serviço que costumo prestar e, percebo, o nível de resposta à satisfação que a empresa me dá, consigo adaptar o meu nível de serviço. Aquilo que vem aí é a parte da robotização com inteligência artificial. Eu costumo dizer que sou um sortudo que vivi ao longo destes 20 e poucos anos o mundo do crescimento da indústria do hardware, software e por aí fora, mas agora vamos ter a parte de robótica de consumo e vamos ter as máquinas com inteligência artificial e aquilo que muitas vezes vemos vimos nalguns filmes há uns anos e que pensávamos que estavam muito longe, estamos agora a viver. A mecânica e as máquinas vieram dominar. Já temos os carros sem condutor. Estive recentemente em São Francisco e havia já uma marca concorrente da Uber que nos leva do ponto A ou B ao longo da cidade, sem condutor, coisa que nós achávamos se calhar que estava muito longe, não está muito longe. Pois bem, mas é uma questão de regulamentação, a ética tem de estar, a confiança tem de estar. Nestas empresas como a Saleforce, um dos principais pilares tem a ver com a forma como a empresa se posiciona e se responsabiliza muito a sociedade.
A parte da confiança do tratamento dos dados, por exemplo. A Salesforce nunca tem acesso a nenhum dado dos clientes. São completamente confidenciais, os clientes conseguem aceder aos dados, às suas fontes de informação, nós damos esse acesso, mas a Salesforce não tem. Se o cliente tiver um problema qualquer em que apagou os dados, eu não os posso ir os recuperar. Portanto, são princípios e valores que o mundo digital tem que ter e que tem. Não sou só eu, eu e os meus colegas, parceiros e concorrentes também têm estes princípios para dar essa confiança, porque o mundo precisa dessa confiança. Porque há sempre abusos. há toda a parte criminal e é importante coisas básicas como os bancos têm adotado mais do que uma password, a second key para dificultar. Nós somos também agentes, nós como seres humanos, somos agentes e responsáveis.
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“As empresas portuguesas de tamanho médio resistem ainda em abraçar o digital”
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