Vamos falar dos salários dos políticos
A reposição do corte de 5% nos salários dos titulares de cargos políticos é mais do que justificável. A seguir, é preciso discutir o aumento de salários dos políticos, mas exigem outras condições.
Os salários dos políticos são um daqueles temas que mais demagogia motiva, mais populismo promove, como se viu com o circo montado pelo Chega no dia da votação do orçamento para 2025. Num país com um salário mínimo de 820 euros e um salário médio bruto da ordem dos 1500 euros, factos somados à crescente degradação da qualidade percebida dos decisores políticos, percebe-se a dificuldade em discutir aumentos salariais dos que nos representam. Mas é crítico para aumentar a qualidade das decisões políticas.
O orçamento do Estado para 2025 — aprovado na última sexta-feira — prevê o fim do corte de 5% nos salários dos titulares de cargos políticos, uma decisão de 2010 e que surgiu no contexto da pré-falência do país. É uma medida mais do que justa, já vem aliás com atraso. Especialmente depois do que se passou em 2024 com as negociações salariais de carreiras especiais do Estado, como os professores.
Perceberam-se dois tipos de voto à proposta de fim do corte de salários dos políticos.
Por um lado, uma posição razoável da Iniciativa Liberal, que defende o fim do corte de salário mas com efeito apenas numa próxima legislatura, para evitar a crítica da decisão em causa própria. É um argumento de bom senso, especialmente neste ambiente político. Mas para isso, não deveria entrar no orçamento para 2025, que trata de medidas de caráter orçamental para o ano em análise. Seria uma daquelas medidas ‘cavaleiro’, aprovadas agora para ter efeitos a prazo.
Por outro, há a posição do Chega, populista e demagógica, a montar aquele circo com os cartazes nas janelas da Assembleia da República. A clamar ‘vergonha’ e a puxar aos sentimentos de ressentimento e indignação de tantos que vivem em dificuldade. Comportou-se como aqueles ativistas do clima do Bloco de Esquerda e ainda brincou com o trabalho dos bombeiros. Ventura prometeu que os deputados e todos os representantes eleitos não aceitariam receber aqueles 5% de reposição do salário. Vamos ver até onde vai a demagogia do líder do Chega.
Se a reposição de um corte salarial que tem mais de uma década motivou estas reações, o que seria se estivesse em discussão um aumento salarial? Creio que essa discussão terá de ser feita, mais tarde ou mais cedo, para promover uma qualificação dos titulares de cargos políticos.
Como se pode ver no quadro em baixo (fonte: Instituto +Liberdade), os políticos não têm apenas um salário muito inferior ao de qualquer gestor das maiores empresas portuguesas. Não precisaria de ter o mesmo salário, mas deveria ter um que fosse competitivo, tendo em conta a responsabilidade, o nível de escrutínio, até as limitações profissionais que se colocam nos anos seguintes ao exercício de funções.
A ideia de que os titulares de cargos políticos devem fazer sacrifícios e devem agradecer a oportunidade de prestar um serviço público é perigosa, porque isso cria o incentivo errado para abrir a porta aos que não gostaríamos de ter em cargos políticos. É o que se tem visto. Ou então, aqueles que procuram apenas tornar verdadeira a proposição de que melhor do que ser governante é ser ex-governante.
Há, ainda assim, duas condições essenciais para incluir na discussão sobre o aumento necessário do salário dos políticos. Por um lado, é preciso reformar a forma como os partidos se organizam, como são escolhidos os candidatos, é preciso acabar com o caciquismo local e concelhio, é preciso diminuir as barreiras à entrada de independentes como candidatos, dentro e fora dos partidos. Por outro lado, também é urgente mudar as regras de nomeação para as direções gerais, institutos e empresas públicas, robustecer os critérios de escolha, proteger o mecanismo do concurso, e sobretudo acabar com o que é hoje a Cresap, uma caricatura de organismo que avalia candidatos, e criar outra entidade independente, além de pôr fim a mecanismos como o regime de ‘substituição’, que serve apenas para enganar os eleitores sobre a forma como membros do cada governo em funções fazem as suas escolhas.
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