Gestão de Riscos no Setor Segurador: Para Além dos Indicadores Tradicionais

  • Nuno Oliveira Matos
  • 8 Dezembro 2024

Nuno Oliveira Matos revisita os indicadores e métricas usados na gestão de risco pelas seguradoras. E questiona e conclui sobre a sua eficácia nos tempos atuais.

O setor segurador é, essencialmente, o negócio da gestão de riscos. Para navegar neste ambiente complexo, as empresas de seguros utilizam uma ampla gama de indicadores e métricas que sustentam a gestão sã e prudente dos riscos de subscrição, mercado, crédito e operacional.

Os tradicionais indicadores-chave de solvência proporcionam uma base sólida, mas incompleta, na gestão de riscos. Indicadores como a cobertura dos requisitos de capital de solvência e a cobertura do requisito de capital mínimo refletem parte da capacidade de absorção de choques.

Por esta razão, os departamentos de gestão de riscos têm desenvolvido, complementarmente, um conjunto de indicadores de gestão internos amplamente baseados em técnicas de Value-at-Risk (VaR). Para riscos de natureza catastrófica, análises complementares como o Tail Value-at-Risk (TVaR) têm desempenhado um papel crucial.

Os indicadores acima mencionados são ainda complementados pela Autoavaliação do Risco e da Solvência (ORSA, na sigla em inglês), uma ferramenta crítica que oferece uma visão abrangente da adequação do capital. O ORSA não só avalia os riscos atuais, como também antecipa riscos futuros, promovendo uma análise prospetiva, que complementa a visão tradicionalmente retrospetiva da solvência, o que permite às empresas de seguros avaliar a sua capacidade de manter a solvência mesmo em cenários adversos de risco e de mercado.

Apesar da robustez das métricas descritas, algumas dimensões de risco permanecem difíceis de modelizar. Estes riscos incluem variáveis estratégicas, comportamentais e/ou intangíveis, que escapam às métricas tradicionais. Exemplos incluem os riscos estratégicos, a cultura organizacional, a satisfação de clientes e colaboradores, o risco moral, a elasticidade das tarifas, a cobertura mediática negativa, etc.. A gestão eficaz destes riscos exige uma abordagem que vá além da modelização quantitativa, integrando ferramentas que verdadeiramente promovam uma visão holística.

Originalmente desenvolvido em 1966 pelo canadiano Douglas A. Barlow, o conceito de Total Cost of Risk (TCoR) revolucionou a gestão de riscos ao introduzir uma métrica holística. Para empresas não financeiras, o TCoR engloba todos os custos relacionados com a mitigação de riscos, incluindo prémios de seguros, franquias, despesas de autosseguro e investimentos em prevenção e controlo de riscos. Na prática, o TCoR oferece vantagens significativas, como:

  • A redução de prémios de seguros, ao demonstrar eficiência na gestão de riscos;
  • O aumento da resiliência operacional, por meio de investimentos em tecnologia e formação;
  • O fortalecimento da confiança por parte dos stakeholders, pela transparência e robustez das decisões de gestão.

Será o TCoR relevante para as empresas de seguros?

No setor segurador, o TCoR apresenta um enorme potencial como métrica estratégica. Tal como ocorre nas empresas não financeiras, ele permite às empresas de seguros:

  • Avaliar o custo total do risco;
  • Incorporar nas suas análises os riscos não capturados na modelização quantitativa;
  • Estabelecer uma ligação direta entre gestão integrada de riscos, desempenho financeiro ajustado ao risco e solvência.

Ao adotar esta abordagem, as empresas de seguros promovem uma visão abrangente do desempenho financeiro ajustado ao risco, outra métrica crucial na gestão de riscos. De facto, o Retorno Ajustado ao Risco sobre o Capital (RAROC, na sigla em inglês) avalia a rentabilidade ajustada ao risco, sendo uma ferramenta indispensável para decisões informadas sobre alocação eficiente do capital, otimização de recursos e decisões estratégicas de negócio. Quando combinado com o custo de capital, o RAROC permite às empresas de seguros equilibrar a rentabilidade esperada aos riscos assumidos, promovendo a sustentabilidade financeira a médio e longo prazos. Além disso, ao incorporar o conceito de Economic Value Added (EVA), as empresas de seguros conseguem medir de forma mais precisa o valor económico gerado ajustado ao risco após a dedução do custo de capital, reforçando o compromisso com a criação de valor acrescentado para todos os stakeholders, incluindo, desde logo, os acionistas.

Enquanto os indicadores tradicionais continuam a ser pilares essenciais da gestão de riscos no setor segurador, a verdadeira transformação começa quando a gestão se questiona: Estamos a medir apenas o que é visível, ou estamos também a antecipar o impacto do que ainda não conseguimos modelizar? Repensar os paradigmas de gestão de risco é não apenas uma oportunidade, mas uma necessidade estratégica para assegurar a resiliência e o valor sustentável num futuro crescentemente incerto!

  • Nuno Oliveira Matos
  • Sócio da Carrilho & Associados, SROC

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