Governo sobrevive à segunda tentativa de derrube, mas queda está iminente
O Parlamento chumbou a iniciativa do PCP com os votos contra de PSD, CDS, IL e abstenção do PS. Executivo vai apresentar uma moção de confiança, que será rejeitada.
O primeiro-ministro, Luís Montenegro, sobreviveu à segunda moção de censura em menos de duas semanas. Depois de ter rejeitado a iniciativa do Chega, o Parlamento chumbou esta quarta-feira a tentativa de derrube do Governo da autoria do PCP, graças ao PS, que voltou a segurar o Executivo ao abster-se, tal como o Chega.
PSD e CDS, os partidos que suportam o Executivo da Aliança Democrática (AD), e IL votaram contra. Todos os restantes partidos (PCP, BE, Livre e PAN) votaram favoravelmente.
Mas a queda do Executivo está iminente, uma vez que o primeiro-ministro anunciou que vai apresentar uma moção de confiança, que está condenada com voto contra do PS.
Em causa está a polémica em torno da empresa familiar de Montenegro, a Spinumviva, que o chefe do Executivo já passou para os filhos, e um potencial conflito de interesses entre o cargo de primeiro-ministro e os serviços prestados a clientes como o grupo de hotéis e casinos Solverde, que rasgou o contrato com a empresa, segundo um comunicado tornado público antes de o debate ter arrancado.
De lembrar que, entre 2018 e 2022, ou seja, antes de ser presidente do PSD e primeiro-ministro, Montenegro liderou as negociações com o anterior Governo para estender a concessão dos casinos de Espinho e do Algarve ao mesmo grupo. O contrato com o Estado termina este ano, o que significa que seria este Executivo, de Montenegro, a escolher se renovaria ou não a concessão.
Durante o debate da moção de censura do PCP, Luís Montenegro afastou quaisquer incompatibilidades e garantiu que nunca violou a exclusividade de funções a que está sujeito. “Não recebi um cêntimo sequer desde que foi eleito e investido na função de presidente do PSD. Que fique muito claro: não sou nem fui avençado de ninguém”, afirmou.
Já em relação a um potencial conflito de interesses com uma eventual renovação da concessão dos casinos ao grupo Solverde, Montenegro quis arrumar o assunto ao revelar que o próprio Executivo a que chefia contestou uma indemnização de 18 milhões de euros que a empresa exigiu ao Estado, no âmbito de perdas financeiras durante o período da covid-19, que acabou por ser rejeitada pelo Supremo Tribunal Administrativo.
“Há 18 milhões de euros de razões para acreditar que o primeiro-ministro não teve nenhuma intervenção. Não houve nenhuma acumulação de funções, nunca violei a exclusividade”, defendeu.
Mas as explicações não convenceram nenhum partido da oposição, nomeadamente o PS, determinante para o seu chumbo ou aprovação. Ainda assim, a bancada socialista optou por se abster, inviabilizando desta forma a iniciativa comunista.
O PS não poupou críticas à atuação do primeiro-ministro. O vice-presidente do grupo parlamentar socialista, António Mendonça Mendes, considerou que “as explicações” de Montenegro “não foram concretas”.
Na ótica do deputado, ficou por esclarecer se “o primeiro-ministro usou uma empresa da sua esfera familiar para contornar a exclusividade de funções, mantendo a atividade”.
Para além disso, sublinhou, “o primeiro-ministro teve consciência que não podia ter esta empresa quando fez a transmissão das quotas à sua conjugue”. Montenegro cedeu a sua quota à mulher a 30 de junho de 2022 quando se tornou presidente do PSD.
PS chumba moção de confiança e dita queda do Governo
Apesar da segunda moção de censura ter sido chumbada, o primeiro-ministro considerou que era preciso uma maior relegitimação do Governo: “Não ficando claro que o Parlamento dá todas as condições para executar o seu programa, avançaremos para a aprovação de um voto de confiança, será um mal necessário”.
“Mais vale dois meses de suspensão política do que um ano e meio de degradação política”, defendeu. E dirigiu-se ao PS: “O país precisa de clarificação política e este é o momento, o contexto internacional assim o impõe. Seria inaceitável, contrário ao interesse nacional, que um partido, reiteradamente, inviabilizasse moções de censura e depois continuasse a alimentar suspeições para contaminar o ambiente político, com o fito de desgastar o Governo e o primeiro-ministro. Não vale a pena disfarçar, não podemos brincar com o país e não podemos brincar com a vida dos portugueses”.
Pedro Nuno Santos anunciou, de imediato, que “a moção de confiança terá o chumbo do PS”, o que vai inevitavelmente provocar a rejeição do voto de confiança e a demissão do Governo. No entanto descartou o ónus de uma crise política: “A responsabilidade da crise política é do primeiro-ministro”.
O líder do PS criticou a fuga de Montenegro: “Nunca deu explicações cabais sobre o caso, escolheu não o fazer, evitou, continuou sem responder e tivemos de ir para a comissão parlamentar de inquérito e o que quer é evitar a comissão”.
Montenegro foi ainda acusado de “medo” de escrutínio ao lançar uma moção de confiança, uma vez que, sendo rejeitada e havendo eleições antecipadas, atira para a próxima legislatura a comissão parlamentar de inquérito do PS, que se irá debruçar sobre o cumprimento da exclusividade de funções do primeiro-ministro e das obrigações declarativas, designadamente no que diz respeito a impedimentos e incompatibilidades.
“Não há nenhuma fuga à comissão parlamentar. O PS já disse que ela iria ocorrer esta ou na próxima legislatura”, argumentou o chefe do Executivo.
O debate foi correndo num pingue-pongue sobre quem é o responsável pela crise política, com o Governo, PSD e CDS a culparem o PS e os socialistas a devolverem a bola ao Executivo. O bate-boca levou o primeiro-ministro a concluir: “A crise política não é por causa da minha vida pessoal, é por causa do sucesso da governação”.
No discurso de encerramento do Governo, subiu ao púlpito do hemiciclo o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, para lançar o derradeiro repto ao PS, depois de o acusar de uma “duplicidade e um taticismo inaceitáveis”.
Teve “a atitude de quem quer mas não pode e de quem pode mas não quer: não quer uma moção de censura, mas tem pavor de uma moção de confiança”, criticou. O governante concluiu então que os socialistas queriam votar antes uma “moção de descensura”, ironizou.
“Deputados do PS, se querem tanto uma comissão parlamentar de inquérito, têm bom remédio. Abstenham-se no voto de confiança e iniciem a comissão daqui por 15 dias”, desafiou Rangel.
E depois mudou a agulha do discurso, entrando em modo de pré-campanha eleitoral: “Este Governo e este primeiro-ministro não desistem nem do crescimento nem da valorização dos trabalhadores e dos pensionistas Não desistimos, não vamos desistir, nunca vamos desistir de Portugal!”.
(Notícia atualizada às 19h17)
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