“A integridade de Montenegro enquanto gestor da coisa pública não está em causa”

Armindo Monteiro, presidente da CIP, quer um entendimento político para evitar eleições antecipadas. E afirma que a integridade de Montenegro enquanto gestor da coisa pública não está em causa.

Armindo Monteiro, presidente da CIP, foi o convidado do podcast do ECO e da CNN, ‘O Mistério das Finanças’, e foi claro na defesa e um entendimento entre o Governo e o maior partido da oposição, o PS, para evitar eleições antecipadas. As eleições antecipadas “vão sacrificar o país. Nós temos uma crise que dispensávamos. Ninguém. E parece que nenhum partido, aparentemente, as quer. Então, a pergunta é: Se nenhum partido as quer, porque é que vamos ter…”.

“Não há razões para haver eleições. Há razões para o escrutínio. Nós não cedemos ao escrutínio e achamos que o escrutínio é uma regra importante da democracia. Mas não nos parece que essa necessidade de escrutínio tenha que deitar o país abaixo, e eleições”, afirma o ‘patrão dos patrões’ no podcast conduzido pelos jornalistas António Costa e Pedro Santos Guerreiro.

Vamos já tirar o ‘elefante da sala’: Portugal aguenta mais uma crise política?

Nós somos um país pobre. Somos um país que, ao contrário de outros, tem um percurso enorme a fazer. E no momento de uma convulsão mundial, que é esta que está a acontecer, onde os quadros de referência se esbatem todos os dias, nós inventamos crises internas em vez de fazermos aquilo que temos efetivamente que fazer. Entretemo-nos um bocadinho, como se fosse uma corrida de Fórmula um. Preocupámo-nos quem é que se alinha melhor na grelha de partida, na pole position, porque o que interessa é a disputa política ou partidária. É a altura da sociedade portuguesa, as empresas, as famílias e as pessoas que recebem um salário ao final do mês, que as empresas não vão a eleições. Chega desta indefinição. Chega de jogar com estas regras, que se pode efetivamente desenvolver um país sem ter preocupação com o interesse nacional. Esta política que nos conduziu até aqui é uma política partidária…

Está a falar desta crise?

…nem sequer temos uma estratégia. Aquilo que se verifica, e tem-se verificado nas últimas eleições, é um taticismo político partidário. À custa do voto, sacrifica-se um país. E é preciso dizê-lo, com estas letras.

As eleições antecipadas vão sacrificar o país?

Vão sacrificar o país. Nós temos uma crise que dispensávamos. Ninguém. E parece que nenhum partido, aparentemente, as quer. Então, a pergunta é: Se nenhum partido as quer, porque é que vamos ter…

…se calhar, porque as querem?

Isto é um jogo de sombras. Mas as empresas não vivem de sombras nem vivem de perceções. As empresas vivem numa realidade económica, as empresas não vivem numa abstração intelectual onde tudo é possível e tudo é discutido na retórica, na demagogia.

Não há razões para haver eleições?

Na nossa perspetiva, não há razões para haver eleições. Há razões para o escrutínio. Nós não cedemos ao escrutínio e achamos que o escrutínio é uma regra importante da democracia. Mas não nos parece que essa necessidade de escrutínio tenha que deitar o país abaixo, e eleições.

Armindo Monteiro, presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, em entrevista ao programa/podcast "O Mistério das Finanças" Henrique Casinhas/ECO

Acredita que ainda se podem evitar estas eleições?

Acreditamos que sim. E aquilo que tem sido a nossa ação é exatamente nesse sentido, procurar o interesse comum, e o interesse comum é evitar a todo o custo que haja eleições… Não é a todo o custo, não é com prejuízo do escrutínio. O mundo está em grande convulsão, basta olhar lá para fora. Há desafios para as empresas que exportam, sobre as empresas que importam.

O que está a fazer em concreto? Falou com o Presidente da República, com o primeiro-ministro e o líder do PS?

O que estamos a tentar é junto das partes, para que haja um entendimento em relação ao muito que une e não ao pouco que separa. Significa que é importante que as partes conversem e que consigam, volto a dizer, sem prejuízo do escrutínio que tiver que ser feito, mas que não leve a uma rejeição, como neste momento está a acontecer dos portugueses e das empresas. Ir para eleições nesta altura é uma rejeição dos portugueses e das empresas. Neste momento, já temos uma situação difícil o suficiente para estarmos nestes jogos florais, para inventar uma uma ‘crisezinha’. Não faz sentido…

…Está a oferecer-se como mediador?

É importante nestas questões, que sejamos sensatos nas palavras. Mas é importante dizer isto: A CIP entende-se como parte deste entendimento da sociedade civil que deve pedir às organizações político-partidárias que façam um esforço no sentido de se conseguir evitar uma crise. Ainda vamos a tempo. A crise está prenunciada para terça-feira, significa que até terça-feira é possível ainda evitar uma crise? Não é impossível. Pode passar por um entendimento em que haja efetivamente uma confirmação da capacidade do Governo de poder executar o seu programa e pode passar por uma confirmação de que, do lado do maior partido da oposição, haja uma satisfação com o esclarecimento que solicita.

Mas sem Comissão Parlamentar de Inquérito?

A Comissão Parlamentar de Inquérito é apenas, e este apenas entre aspas, um instrumento. Significa que as pessoas que quiserem ser esclarecidas tanto podem ser esclarecidas numa tarde, ou numa manhã, ou num dia, ou num arrastar de seis meses. É tudo uma questão de taticismo.

Se o primeiro-ministro esclarecesse as dúvidas do PS, não seria necessária uma comissão de inquérito.

Eu gostava de perceber o ilícito. Antes de mais, o que aconteceu? Eu percebo que há questões que, porventura, até o próprio porventura não teria feito da mesma maneira. Isso é uma questão. Outra questão é o ilícito. Há um filme, o “Minority Report”, relatório minoritário, em que, no fundo, se prevenia o crime antes de acontecer. Ora aqui, parece me que há uma suspeição sobre um suposto benefício que poderia acontecer em dezembro, quando houvesse [a renovação da concessão. Eu pergunto: Então, se for em dezembro, não vamos ainda a tempo de prevenir alguma ilícito? Isso foi o que eu percebi de todos, esta confusão que aconteceu.

É mais do que isso. O primeiro-ministro beneficiava de rendimentos familiares, não diretos, familiares, através de uma empresa criada [que sucedeu a uma sociedade de advogados]. O primeiro-ministro é idóneo?

O que está em causa é uma qualquer ligação a uma empresa, um nível de suspeição grande em Portugal a qualquer ligação a uma empresa, seja ela que empresa for. Estivessem em causa serviços de natureza jurídica prestada pelo próprio, e eu diria “tem toda a razão”. Mas daquilo que percebi, não me parece. Não me parece, à luz da informação que está disponível…

Portanto, pergunto outra vez: Para a CIP, o primeiro-ministro é idóneo, tem idoneidade para continuar a liderar o país?

Creio que [o primeiro-ministro] foi temerário, mas creio que a sua integridade enquanto gestor da coisa pública não está em causa. Dito de outra maneira, se cometeu algum ato de corrupção, de peculato, objetivamente não temos dados neste momento que nos permitam dizer que cometeu… Então, se não cometeu, a alternativa não é um ‘nim’, é sim ou não. Cometeu algum ilícito ou não cometeu. Se cometeu, é uma conclusão, se não cometeu, [é] outra, mas pode vir a cometer. Bom, então já entramos dentro de uma esfera que é a política.

O que é que os empresários lhe dizem. Deixou já aqui bastante claro que é contra eleições antecipadas e entendo que há caminho para evitá-las daqui até terça feira. O que é que os empresários lhe transmitem?

É uma preocupação com o momento que estamos a viver. Hoje não sabemos o que são aliados, porque quando temos os Estados Unidos numa guerra com o Canadá, ou quase a declarar guerra à Dinamarca ou à Europa…

—uma guerra comercial.

Uma guerra comercial. Ficamos um bocadinho com dúvida. Afinal, o que significa a palavra aliado?

Creio que [o primeiro-ministro] foi temerário, mas creio que a sua integridade enquanto gestor da coisa pública não está em causa. Dito de outra maneira, se cometeu algum ato de corrupção, de peculato, objetivamente não temos dados neste momento que nos permitam dizer que cometeu… Então, se não cometeu, a alternativa não é um ‘nim’, é sim ou não. Cometeu algum ilícito ou não cometeu. Se cometeu, é uma conclusão, se não cometeu, [é] outra, mas pode vir a cometer. Bom, então já entramos dentro de uma esfera que é a política.

Armindo Monteiro

Citando as palavras do primeiro-ministro, dois meses de suspensão da governação põe em causa a economia, o investimento, as empresas?

Já está em causa. Ou seja, a ideia é agravar. Se realmente tivéssemos uma situação fabulosa, tínhamos margem, latitude, para segurar esses dois meses. Mas estamos bem? As nossas exportações estão bem? O nosso investimento público privado está bem? A economia está a crescer? Há risco ou não de uma recessão? Esta é a questão. Estes dois meses beneficiam ou não beneficiam? Estes dois meses são determinantes… e já nem sequer vou falar do PRR…

Já cansa um bocadinho…

Não cansa!? Já cansa porque o PRR passou a ser um bocadinho aquela pólo de atração. Tudo se condensa no PRR. Vamos ser claros: o investimento é mais do que isso, o investimento público é mais do que isso, o investimento privado deve ser mais do que isso. Concerteza, é preciso criar condições para efetivamente transformar a nossa economia. Nós comprometemo-nos a aumentar o salário nos próximos quatro anos em quase 20%, mas para isso é preciso que também a economia cresça em igual montante. Se isso não acontecer, é possível…

Quais são as consequências, além do PRR?

Todo o investimento público e todo o investimento privado durante os dois meses. São estratégias de internacionalização que ficam hesitantes. Vamos para onde? Qual a estratégia?

O acordo de concertação social fica em causa?

É difícil construir quando há um compromisso de aumentar salários em 20% nos próximos quatro anos… Não é coisa pouca quando, para isso, temos que alterar o paradigma da nossa economia. Temos que criar um modelo de sofisticação de negócios muito maior. Então, não fica em causa? E não são só estes dois meses, não sabemos qual será o resultado eleitoral que vai surgir. Vamos imaginar que, daqui a dois meses, o resultado eleitoral é de uma maioria ainda mais instável do que esta que agora já temos.

Percebemos que está a falar com as várias partes. Está a falar que o PS, está a falar com o PSD, está a falar com Presidente da República.

Estamos a falar com as partes interessadas e as partes interessadas, naturalmente, terão a última palavra. Nós, enquanto sociedade civil, apenas podemos apelar e fazemo-lo com o bom senso de uma confederação empresarial. Há territórios que não devemos habitar, [mas] entendemos que isto não é política, não é política e muito menos política partidária, é o interesse do país está em causa. Quando estiver em causa o interesse do país, a Confederação estará presente, sendo sempre parte da solução e nunca parte do problema.

Com os dados que tem hoje [sexta-feira] e até terça feira, vê uma evolução positiva das “partes interessadas”, como disse?

Eu acho que vamos a tempo. Eu acho que vamos a tempo. Temos uma crise pré-anunciada para terça-feira, hoje é sexta. Muita coisa pode acontecer e se houver vontade das partes, é possível que de facto se olhe para o país.

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