As reformas estruturais devem ser o foco da campanha

Através de reformas no Estado, sistema político, Justiça, Saúde, Educação e Ensino Superior, Habitação e Especialização da economia, traço um rumo para uma economia mais dinâmica e inclusiva

Este artigo visa contribuir para o debate de ideias e opções políticas que deve pautar a campanha eleitoral das (novas) legislativas antecipadas, para que não sejam o prolongamento das cenas lamentáveis de ‘passa culpas’ da moção de confiança rejeitada, que conduziu à necessidade de um novo sufrágio de resultado incerto. O país voltará a ficar novamente com um governo de gestão alguns meses e arriscamo-nos a ficar na mesma com uma governabilidade reduzida, o que é um péssimo sinal para os investidores, em particular se houver reversão de políticas que coloquem em causa pressupostos essenciais.

O artigo é uma compilação de reformas e medidas – com algum detalhe, mas sem ser exaustivo – que tenho vindo a defender neste espaço de opinião e noutros, suportadas num diagnóstico prévio.

Diagnóstico e objetivo ambicioso, mas possível

Entre 1999 e 2024, a economia portuguesa registou um crescimento médio anual de 1,0%, o 3º mais baixo ente os atuais países da União Europeia (UE), onde a progressão foi de 1,5% ao ano. A inversão destas dinâmicas no período mais recente, de 1999 a 2024 (subida de 1,6% ao ano, a 12ª maior da UE, cujo valor baixou para 1,1%) reflete choques assimétricos, cujo fim esperado fará retomar as tendências anteriores.

Com efeito, nos anos mais recentes Portugal tem sido bafejado pelo forte impulso do turismo após a pandemia – mais do que compensando a queda inicial do setor com o distanciamento social na pandemia, que nos permitiu depois receber um generoso pacote do PRR, em execução até 2026 –, beneficiando da imagem de país bonito e seguro, longe da guerra na Ucrânia, que por sua vez levou ao fim do gás barato da Rússia e afundou a economia alemã, bem como o crescimento médio da UE, tendo os países de Leste sido também prejudicados pela guerra, mas mesmo assim a maioria continuou a crescer acima de Portugal, tanto que as últimas projeções da Comissão Europeia apontam para que, em 2026, Portugal seja ultrapassado em nível de vida pela Roménia, até há poucos anos um dos países mais pobres da União. O desejado fim da guerra e os sinais de um regresso da Alemanha a dias melhores deverão fazer ressurgir a dinâmica de crescimento da UE, enquanto o fim do surto de turismo e do PRR farão regressar a nossa tendência de fraco crescimento: 1% na década até 2033, prevê o Ageing Report de 2024 da Comissão Europeia, com o crescimento potencial da nossa economia a cair a pique após 2026, ano em que finda o PRR, mostrando a insustentabilidade da nossa dinâmica económica atual, escondida no discurso político.

Portugal precisa de reformas para colocar a economia a crescer na casa dos 3% ao ano e conseguir atingir a metade de países de maior nível de vida da UE numa década, como mostrou um estudo da FEP – Faculdade de Economia da Universidade do Porto. Tal implica que o País crie condições para acolher e integrar um fluxo anual de imigrantes maior, sem o qual esse ritmo de crescimento não será possível. Promover a participação política dos imigrantes pode reforçar a integração e ajudar a debelar populismos. Ritmos de crescimento dessa magnitude foram conseguidos nas décadas de 1980 e 1990, após reformas económicas. Precisamos agora de reformas igualmente impactantes adaptadas ao contexto atual.

Algumas propostas de reforma em áreas cruciais

Segue-se um conjunto de propostas de reforma que venho a defender.

1. Reforma do Estado: administração, sistema fiscal e sistema de pensões

1.1. Reforma administrativa

1.1.1 Reforma administrativa territorial

Eliminar o nível administrativo das freguesias e criar o regional, uma solução mais europeia e eficiente: uma verdadeira reforma administrativa exige uma descentralização mais profunda, o que passa não por mais freguesias (um erro que o Pais e o contribuinte irá pagar), mas pela eliminação desse nível de administração – concentrando-o nos municípios, alguns dos quais deveriam ser fundidos – e pela criação de regiões administrativas, alinhando Portugal com os países europeus mais avançados e promovendo uma gestão mais eficiente e territorialmente equitativa, como mostrou uma análise recente da FEP.

1.1.2. Gestão mais eficiente da Administração Pública: menos despesa corrente e mais investimento

Princípios: descentralização, autonomia e responsabilização nos serviços públicos e no Estado em geral – em coerência e articulação com a reforma territorial proposta –, com eliminação de desperdícios e redundâncias, e o redireccionamento do foco para os cidadãos e empresas (i.e., os ‘clientes’ dos serviços públicos), passando de uma lógica de oferta para uma de procura, e do ‘BackOffice’ para o ‘FrontOffice’.

Política de recursos humanos e digitalização: nesse modelo é instrumental uma reforma da gestão de recursos humanos, visando a captação e preservação de talento para ganhos de eficiência e aumentos de produtividade. Tal passa pelo reforço da meritocracia e o uso cada vez maior e transversal das ferramentas digitais no Estado – com realce para o uso responsável da Inteligência Artificial (IA), capitalizando as vantagens e minimizando riscos –, promovendo a inovação permanente da organização e prestação dos serviços públicos, para que possam ter uma abordagem digital mais eficiente e sejam acessíveis online (o mais possível), em benefício da conveniência dos utentes e do ambiente (redução da pegada carbónica). A maior eficiência deverá permitir um rácio de entradas por cada saída de funcionários abaixo de 1.

O aumento da eficiência de gestão deverá refletir-se em menos despesa corrente, abrindo margem para mais investimento público – para reverter anos a fio de desinvestimento, refletidos na degradação dos serviços, e compensar a queda de apoios da UE após 2026 –, e baixa de impostos para reforço da nossa competitividade (ver 1.2.1).

1.1.3. Reforçar a capacidade administrativa de gestão de fundos da UE e acelerar a sua execução: trata-se de uma das recomendações específicas da Comissão Europeia a Portugal, visando acelerar a execução do PRR, mas também aumentar de forma estrutural a capacidade de absorção de fundos europeus, até porque o Portugal 2030 está também muito atrasado (ainda que, em parte, por causa do PRR, que concorre nos recursos disponíveis às empresas, tanto capital como trabalhadores), embora que o horizonte de execução seja muito maior.

1.1.4. Regulação e concorrência

Um position paper da FEP em que sou co-autor aponta um vasto conjunto de medidas que Portugal pode adotar para melhorar o ambiente de negócios de termos de desregulação e promoção da concorrência, de modo a melhorar a nossa posição no índice Product Market Regulation da OCDE.

1.2. Sistema fiscal

1.2.1. Reforma da fiscalidade: menos carga fiscal, sobretudo no IRC

Portugal parecia de reduzir a carga fiscal para baixar o elevado esforço fiscal (dos maiores da UE), enquanto não melhorar de forma estrutural na produtividade e noutros fatores de competitividade.

Se o IRS já tem vindo a ser reduzido, o que deve prosseguir, a prioridade deve ser agora baixar o IRC para elevar a nossa competitividade, atrair investimento e impulsionar o crescimento, como detalho a seguir.

Baixa do IRC, a começar pela derrama estadual, e revisão dos benefícios fiscais associados: Portugal tem a 2ª maior taxa efetiva de IRC da UE, em grande medida porque temos uma derrama estadual elevada e progressiva, sem paralelo noutros países. Precisamos de reduzir a taxa de IRC começando precisamente por eliminar a derrama estadual, de modo a reforçar a capacidade de atrair grandes investimentos estruturantes, como uma ‘nova Autoeuropa, e recorrer menos ao mecanismo pouco transparente do regime contratual de investimento. Ao mesmo tempo, procurando mitigar o efeito da elevada taxa de IRC, Portugal tem o 6º maior efeito de benefícios fiscais em IRC da UE, tornando a fiscalidade das empresas mais complexa, mas também injusta, pois são sobretudo as maiores que conseguem aproveitar os benefícios. É, por isso, preciso uma redução dos benefícios fiscais injustificados (abrindo espaço orçamental para menores taxas de IRC), nomeadamente concentrando mais os generosos benefícios à I&D – onde Portugal compara bem na UE – nas empresas de pequena e média dimensão, onde temos uma falha de mercado, já que as empresas maiores têm mais recursos e incentivo de mercado para conduzirem processos de inovação, requerendo relativamente menos apoio, sendo que, em compensação, seriam beneficiadas pela baixa da derrama estadual, introduzindo maior lógica no sistema.

1.2.2. Racionalização e eliminação de benefícios fiscais injustificados em geral

Conforme salientado no estudo de 2019 “Os Benefícios Fiscais em Portugal”, elaborado pelo Grupo de Trabalho criado para o efeito (encomendado por um anterior governo PS), os benefícios fiscais (BF) são um importante instrumento de políticas públicas – nomeadamente para corrigir falhas de mercado –, mas a sua proliferação e exagero, por falta de controlo, pode trazer problemas, como a complexificação do sistema fiscal; o avolumar da despesa fiscal; a criação de distorções (se mal desenhados); e desigualdades (por serem aproveitados sobretudo por quem tem mais recursos e informação).

O seu volume é substancial, segundo o estudo – as receitas fiscais cessantes correspondiam, na altura, a 6% do PIB incluindo as taxas preferenciais de IVA e 2% sem essas taxas –, exigindo uma gestão rigorosa.

O estudo é valioso e deve ser atualizado, aprofundado e consensualizado para permitir uma revisão efetiva e sistemática dos BF. O GT propõe “uma metodologia para a criação, monitorização e avaliação dos BF” que poderá ser um importante ponto de partida para uma necessária reforma a este nível, inserida dentro de uma reforma abrangente do Estado como a que aqui proponho.

1.2.3. Revisão e uniformização dos mecanismos de atração e retenção de talento

Substituição do IRS Jovem, a par com os programas Regressar (benefício fiscal ao regresso de emigrantes) e IFICI+ (reforço do Incentivo fiscal à investigação científica e inovação criado no OE 2024, em lugar do Regime do Residente Não Habitual, RRNH, mais abrangente) – não acessíveis a todos os contribuintes –, pelo regime IRS Novo Talento (mais ou menos jovem), com deduções em IRS nos anos imediatamente após novas qualificações superiores, tanto maiores quanto maior o grau académico. Trata-se de uma proposta com impacto transversal e estruturante na economia, sendo mais focada do que o IRS Jovem na retenção de talento jovem, mas indo muito mais além, pois aplica-se ainda à criação de novo talento menos jovem, ao regresso de emigrantes qualificados e à atração de estudantes estrangeiros e imigrantes qualificados, tornando o regime fiscal mais simples e justo, sem suscitar questões de constitucionalidade. A medida permitiria posicionar Portugal como um ‘viveiro de talento’, aumentando a nossa atratividade.

1.2.4. Outras medidas para aumento da eficácia do sistema fiscal: redução de interações entre a Administração fiscal e os contribuintes (empresas e cidadãos), eliminando encargos administrativos desnecessários, e fortalecimento de meios da administração fiscal, incluindo ao nível dos recursos humanos, seguindo uma das recomendações específicas da Comissão Europeia a Portugal.

1.3. Reforma do sistema de pensões: a Comissão Europeia alerta ainda que é preciso garantir a sustentabilidade do nosso sistema de pensões, considerando a previsão de subida significativa das despesas com pensões, devido ao envelhecimento e à melhoria prevista da esperança de vida, que irá ainda elevar bastante o rácio de idosos por ativo e baixar para menos de metade o rácio de contribuintes por pensionista (de quase três em 2022, para menos de 1,5 até 2050). Isto porque se prevê que a população portuguesa em idade ativa diminua em cerca de um milhão a médio prazo, sobretudo devido às baixas taxas de fertilidade e à redução da migração líquida. Esta evolução demográfica ameaça a sustentabilidade do sistema de pensões. Nos últimos anos, Portugal implementou reformas destinadas a melhorar a sustentabilidade do sistema de pensões – indexando a idade legal de reforma à esperança média de vida –, mas ela é ameaçada, nomeadamente, por regimes de reforma antecipada e diferentes taxas contributivas (incluindo os trabalhadores independentes), refere a Comissão.

2. Reforma do sistema político: política como serviço público e não profissão; maior transparência

No meu último artigo neste mesmo espaço elenquei algumas medidas no âmbito da reforma do sistema político, além da introdução de círculos uninominais – com a qual tendo a concordar, por visar uma maior ligação entre representantes e representados –, visando uma cultura política de serviço público inspirada na Suécia: reforçar a meritocracia nos processos de recrutamento; aumentar a capacidade dos órgãos de supervisão (MENAC – Mecanismo Nacional Anticorrupção; Tribunal de Contas e Provedoria de Justiça); promover uma cultura robusta de serviço público, transparência e acesso à informação (incluindo a adoção de medidas anticorrupção como a criminalização do enriquecimento ilícito nos setor público e setor privado ou figura semelhante); reduzir a dois o número máximo de mandatos sucessivos em quaisquer cargos políticos; proceder à reforma 1.1.1 (por reduzir o número de cargos autárquicos e em termos globais); e reforço voluntário da democraticidade interna dos partidos (abertura à sociedade civil e promoção da política como serviço público e não como carreira), que será bem visto pelos eleitores. As medidas de combate à corrupção são ainda relevantes para reduzir o peso da economia paralela, que atingiu quase 35% do PIB, segundo um estudo da FEP, entretanto publicado numa revista científica.

3. Reforma da Justiça

Uma Justiça funcional é um pré-requisito da sã concorrência, atração de investimento e competitividade. Reduzir a permissividade do nosso sistema judicial a manobras dilatórias e reverter a valorização excessiva da forma sobre a substância são alguns aspetos a melhorar. A digitalização, incluindo o uso da IA, será fulcral para a redução da burocracia e a aceleração dos processos, assim haja vontade política.

4. Reforma da Saúde

O SNS enfrenta problemas de gestão, pouco investimento e dificuldades de atração e retenção de médicos. Uma solução possível é um modelo de parcerias público-privadas – reconhecido pelo Tribunal de Contas como tendo gerado bons resultados – nos hospitais e mesmo centros de saúde, mas desde que seja salvaguardada a qualidade dos serviços e o contribuinte, através de uma negociação cuidadosa dos contratos de concessão liderada por pessoas altamente qualificadas. Um estudo da FEP propôs um imposto sobre aditivos nocivos para a saúde incluídos nos alimentos, com consignação da receita à prevenção em saúde – que deve ser uma forte aposta – e investimento na qualidade do serviço do SNS.

5. Reforma da Educação e do Ensino superior, e ligação ao mercado de trabalho

Educação: um estudo da Edulog mostra que as escolas terão falta de professores (do ensino pré-escolar ao secundário) habilitados a praticamente todas as disciplinas dentro de seis anos, caso não sejam tomadas medidas estruturais, sendo crucial aumentar o número de vagas nos cursos de formação de professores, especialmente em áreas críticas (como História, Matemática e Informática), bem como aumentar a atratividade da profissão de professor – a este respeito, considero que deveria ser estudado um modelo descentralizado de contratação como há na Alemanha, Holanda e Suécia, pois termos professores deslocados é desumano, perturbando a sua vida profissional e familiar, e penaliza os alunos.

Ensino Superior (ES): descongelamento das propinas (pelo menos em 20%, para repor o seu valor real), essencial na lógica de autonomia das instituições de ES públicas, e fim do prémio de devolução de propinas em IRS, que não funciona como incentivo à retenção de talento. Implementação referida do IRS Novo Talento e reforço das bolsas de ação social. Introdução de um Contrato de Confiança entre o Estado e o Aluno do ES Público, prevendo várias formas possíveis, flexíveis (respeitadoras da liberdade individual) e tipificadas para este devolver parte do investimento feito pelo país e os contribuintes na sua educação, sendo desonerado das mesmas se o Estado não cumprir a sua parte. Em contrapartida, o Estado comprometer-se-ia em assegurar melhores condições aos estudantes em articulação com a instituição do ES em causa (representante do Estado), por exemplo através do instrumento do contrato-programa, com a atribuição de meios e objetivos à instituição de IES. Este contrato de confiança seria um instrumento potenciador da retenção de talento complementar ao mecanismo fiscal do IRS Novo Talento já referido.

Considero que o principal desafio atual no ES é a utilização alargada e responsável da IA na transformação do Ensino e da Investigação, podendo ser crucial para fortalecer a ligação entre a Academia e a Indústria, ao potenciar a colaboração em projetos de I&D. É fundamental manter a interação humana no processo educativo no ES e nos demais níveis de ensino, garantindo que a tecnologia complementa, e não substitui, as relações interpessoais essenciais para a formação integral dos Estudantes. Isso ajudará ainda a que o foco na natureza complementar da tecnologia se propague também nas várias organizações, tornando-se um fator de promoção da produtividade ao libertar os trabalhadores para atividades de maior valor e facilitar uma melhor compatibilização com a vida pessoal. Esta abordagem deve ser potenciada nas políticas públicas de enquadramento da IA, Educação e Ensino Superior, e mercado de trabalho. A formação contínua em competências digitais e na IA em particular – com realce para a requalificação das gerações no ativo com menores qualificações – é crucial para que a IA seja um complemento e não um substituto das competências humanas, de modo que ninguém seja deixado para trás.

6. Reformas para uma habitação acessível e a relação com o mercado de trabalho e a descentralização

É crucial enfrentar a tendência de aumento dos preços da habitação acima da evolução dos rendimentos do trabalho, exigindo medidas abrangentes no mercado imobiliário e de caráter mais transversal para melhorar o acesso à habitação. O governo cessante adotou medidas que podem ter efeitos positivos nalguns níveis, mas não resolvem a urgência dos problemas a curto nem a médio prazo (pelo menos), sendo precisas políticas adicionais, mais inovadoras e abrangentes para alcançar resultados mais eficazes e rápidos em matéria de acessibilidade à habitação. O contributo da Academia pode ser determinante para debelar este flagelo, que agrava as desigualdades. O problema da habitação é complexo e transversal a muitos países, mas no nosso caso está também relacionado com a rigidez do mercado de trabalho e a distribuição de oportunidades pelo país. Sem um mercado de arrendamento mais alargado e dinâmico em Portugal, é complicado que os desempregados se desloquem para os pontos do país (relativamente pequeno) onde há mais oportunidades de emprego a cada momento. Precisamos, por isso, de medidas mais efetivas para melhorar o mercado de arrendamento. De forma relacionada, a descentralização acima proposta é crucial para termos uma maior coesão territorial e distribuir melhor as oportunidades de emprego pelo território, reduzindo pressões de habitação nos grandes centros urbanos e ajudando a baixar de forma estrutural a nossa taxa de desemprego, que é das mais altas da UE ao longo do tempo.

6. Elevação do perfil de especialização da economia para setores mais intensivos em conhecimento

É preciso um enquadramento favorável a uma maior penetração na atividade económica e nas exportações dos setores mais avançados, incluindo o apoio à reindustrialização, mas sem a tentação dirigista de “escolher setores”, que já deu maus resultados no passado, para quem tem alguma memória (bastará lembrar os investimentos desastrosos de grandes empresas públicas e privadas no Brasil, patrocinados pelos governos de José Sócrates). Se dúvidas houvesse, as grandes áreas e setores já estão “escolhidos” pelos critérios de investimento e orientações europeias de aplicação dos fundos estruturais.

Por exemplo, entre as recomendações específicas da Comissão Europeia a Portugal está acelerar a execução dos programas de coesão (Portugal 2030), aproveitando as oportunidades da Plataforma de Tecnologias Estratégicas para a Europa, de modo a melhorar a competitividade e apoiar a transformação industrial – realce para o fabrico avançado e eficiente, transportes sustentáveis, biomedicina, biotecnologia e tecnologias limpas –, a par com o investimento em competências e qualificações para satisfazer a procura associada de mão de obra.

O desenvolvimento da indústria de defesa, intensiva em I&D, e o acordo UE-Mercosul são outras oportunidades europeias a explorar. Outras medidas que defendo: eliminação referida da derrama estadual (crucial para atrair projetos industriais estruturantes, com capacidade de arrastamento e criação de novas fileiras e muitos postos de trabalho); rever os critérios de concessão de apoios do PT 2030 para apostar em projetos com forte geração e incremento de VAB, produtividade e Valor Acrescentado Nacional (e europeu), melhorando a nossa especialização dentro do quadro europeu sem escolher setores; e promover a aproximação entre a Academia e Indústria, incluindo a integração de quadros muito qualificados nas empresas (doutorados).

Quanto ao turismo, o peso direto e indireto do turismo já representa quase 13% da economia, gerando grande dependência deste setor com procura volátil, que deve evoluir em qualificação e valor acrescentado – menos turistas, mas com maior valor médio por turista –, pois o turismo de massas não é sustentável, gerando efeitos negativos sobre as infraestruturas, incluindo a habitação, e sobre o ambiente. O peso do setor até poderá manter-se, mas consumindo menos recursos (trabalho e capital) – o que significaria um aumento relativo da produtividade –, alocados com vantagem a setores mais produtivos, o que potenciaria o crescimento da economia. Precisamos de melhor turismo e de um peso acrescido de setores intensivos em tecnologia e conhecimento, de modo a elevar os níveis salariais e reter/atrair talento jovem.

Conclusão

Este artigo apresenta propostas concretas para enfrentar os desafios estruturais de Portugal. Através de reformas nas áreas do Estado (Administração, sistema fiscal e sistema de pensões), sistema político, Justiça, Saúde, Educação e Ensino Superior; Habitação; e Especialização, traço um rumo para uma economia mais dinâmica e inclusiva, que nos coloque, a prazo, no pelotão da frente da UE. Para garantir esse futuro próspero e sustentável, são precisas medidas eficazes, com visão de longo prazo e comprometidas com a melhoria das condições de vida dos cidadãos. É preciso ultrapassar atavismos seculares e abraçar novas soluções – umas conhecidas, mas nunca implementadas, e outras inovadoras.

  • Diretor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, Professor Catedrático e sócio fundador do OBEGEF

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

As reformas estruturais devem ser o foco da campanha

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião