Preços negativos da eletricidade. Dos ‘porquês’ até à conta da luz

- Ana Batalha Oliveira
- 7 Abril 2025
Março e abril ficaram marcados por um ressurgimento dos preços negativos da eletricidade. Perceba melhor este fenómeno (que se espera cada vez mais frequente), dos motivos aos impactos.
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O que são "preços negativos da eletricidade"?
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Quando é que se registou um recorde nos preços negativos?
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Porque é que os preços desceram a terreno negativo?
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Foi a primeira vez? Quão frequente tem sido?
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Devemos ter mais episódios este ano?
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Os preços negativos vieram para ficar?
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Vai-se sentir esta descida nos preços na fatura da luz?
Preços negativos da eletricidade. Dos ‘porquês’ até à conta da luz

- Ana Batalha Oliveira
- 7 Abril 2025
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O que são "preços negativos da eletricidade"?
Os produtores de eletricidade vendem-na no chamado “mercado grossista” aos comercializadores (e, por vezes, diretamente a grandes consumidores, como indústrias).
Neste mercado, que na Península Ibérica se chama Mibel e funciona como outros no resto da Europa, o preço a que a eletricidade é vendida é definido consoante a oferta (produção) e procura (consumo) para determinado dia. Este encontro entre as duas variáveis é feito diariamente, para cada hora do dia seguinte. É neste contexto que podem ser definidos preços negativos da eletricidade, perante circunstâncias específicas que explicamos nas próximas respostas.
Proxima Pergunta: Quando é que se registou um recorde nos preços negativos?
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Quando é que se registou um recorde nos preços negativos?
No domingo, dia 30 de março, registou-se um recorde de preços negativos no mercado ibérico, com -5,21 euros por megawatt-hora em Espanha e -4 euros por megawatt-hora em Portugal, identifica a Selectra, acrescentando que desde 1 de abril têm voltado a ocorrer novos períodos de preços negativos em diferentes dias.
Ainda este fim de semana, no domingo, Portugal e Espanha registaram preços negativos na ordem dos -2 euros por megawatts-hora, depois de terem descido aos -1,5 euros por megawatt-hora no sábado.
Proxima Pergunta: Porque é que os preços desceram a terreno negativo?
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Porque é que os preços desceram a terreno negativo?
Os preços são negativos nas horas em que há excesso de produção face ao consumo, explica António Vidigal, consultor na área de energia.
Num “típico cenário para um fim de semana de primavera”, no domingo, 30 de março, quando se registou o mínimo recorde para a Península Ibérica, a procura de eletricidade estava “particularmente baixa”, descreve a Aleasoft Energy Forecasting, empresa espanhola que se dedica à análise dos mercados energéticos. Algo que coincidiu com um pico na produção de energia solar, geração eólica abundante e produção hidroelétrica alta.
Quando existem meios de produção cuja geração não é necessária mas têm um custo elevado para se desligar, podem então ocorrer estes episódios de preços negativos, continua Vidigal, que, neste sentido, considera que “os preços negativos são uma medida da falta de flexibilidade de um sistema”.
Além disso, as centrais com tarifas garantidas também podem contribuir para a ocorrência de preços negativos, no caso de continuarem a ser pagas para gerar eletricidade apesar de ela não estar a ser necessária ao sistema.
Proxima Pergunta: Foi a primeira vez? Quão frequente tem sido?
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Foi a primeira vez? Quão frequente tem sido?
Não, não foi a primeira vez que os preços grossistas da eletricidade desceram a terreno negativo, apesar de ter sido neste final de março que se registaram os preços mais negativos de sempre.
Estes preços verificaram-se pela primeira vez em Portugal em abril de 2024, e têm-se repetido várias vezes desde então. De acordo com o levantamento feito por António Vidigal, em 2024 registaram-se 156 horas que marcaram preços negativos e em 2025, até à semana passada, já se contavam outras 64 horas. “Esta situação é relativamente comum durante a primavera na Península Ibérica”, considera a Aleasoft.
Proxima Pergunta: Devemos ter mais episódios este ano?
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Devemos ter mais episódios este ano?
Este ano, os preços negativos começaram em março e “é natural” que haja um número superior de horas negativas em comparação com 2024, afirma Vidigal, já que há mais potência fotovoltaica instalada em Espanha e Portugal e a hidraulicidade tem sido elevada, em comparação com o ano anterior.
Proxima Pergunta: Os preços negativos vieram para ficar?
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Os preços negativos vieram para ficar?
A resposta é “depende”.
“No curto a médio prazo, os preços negativos podem continuar a ocorrer quando a procura é baixa e a geração renovável é alta”, algo mais típico da primavera, assinala a Aleasoft. Contudo, no longo prazo, “vários fatores deverão ajudar a reduzir a probabilidade de preços negativos”, como é o caso do desenvolvimento de soluções de armazenamento, o aumento de procura de energia por parte de centros de dados, veículos elétricos, eletrificação do geral dos consumos e reforço de interconexões com a restante Europa.
António Vidigal acrescenta que, para evitar os preços negativos é importante aumentar a flexibilidade do sistema, deslocando consumos para as horas em que a eletricidade é abundante e por isso barata.
Proxima Pergunta: Vai-se sentir esta descida nos preços na fatura da luz?
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Vai-se sentir esta descida nos preços na fatura da luz?
Os preços negativos no mercado grossista não se refletem diretamente na conta da luz dos consumidores, embora nalguns tarifários – os indexados – se sinta o efeito mais diretamente. A baixa de preços no mercado grossista incita a redução dos preços dos mercados futuros, pelo que “influenciará os preços da luz dos clientes cujo contrato está indexado aos preços do mercado spot [diário] ou do mercado futuro”, indica a Aleasoft. Este tipo de contrato, o indexado, é mais comum no mundo empresarial, mas também está disponível para consumidores domésticos.
Já no que toca às tarifas com preços fixos, as mais comuns entre os consumidores domésticos, também deverão ver refletida a descida dos preços do mercado grossista, já que este é uma referência, mas “quando e quanto dependerá das características de cada contrato”, explica a mesma empresa.