“Não há mesmo margem para mais medidas”. Os avisos do CFP à navegação em vésperas de eleições

Com o "mini ciclo" de excedentes a poder ter terminado e a despesa líquida a subir, Nazaré da Costa Cabral pede prudência e avisa que não há margem para mais medidas sem outras de compensação.

A margem que os Governos dispõem para medidas de política reduziu-se e está cada vez mais curta. É este o resumo dos alertas da presidente do Conselho das Finanças Públicas (CFP), instituição que defende a sustentabilidade orçamental e que evita imiscuir-se em decisões políticas, mas que pode servir de ómega para os candidatos a São Bento.

O CFP divulgou esta quinta-feira a atualização do cenário macroeconómico e orçamental, na qual prevê menos crescimento, deterioração de saldo orçamental e agravamento da despesa líquida, um risco para a meta assumida por Portugal com Bruxelas.

Eis os principais avisos à navegação do CFP, numa altura em que os partidos políticos começaram a divulgar os programas eleitorais dos partidos que concorrem às eleições legislativas de 18 de maio.

“Não há mesmo margem para fazer mais medidas de política”

A frase da presidente do CFP, Nazaré da Costa Cabral, durante a conferência de imprensa, espelha a apreensão que a instituição sente sobre a trajetória de despesa. O alerta já tinha sido deixado em entrevista ao ECO, no início de março, agora a responsável do CFP foi categórica. “Não há mesmo margem para fazer mais medidas de política sem medidas de compensação“, afirmou.

Está nas mãos dos decisores políticos as decisões que queiram tomar para uma eventual melhoria da situação“, disse, alertando quo país tem, assim, “menos margem orçamental para fazer face a uma inversão do ciclo económico“. Neste sentido, pediu prudência “daqui para a frente com as medidas que se anunciam“, nomeadamente no impacto orçamental.

Em março, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, considerou que há “margem para” o PSD propor “novas medidas que, há um ano, não eram possíveis”.

“Mini ciclo de excedentes orçamentais pode estar terminado”

Nazaré da Costa Cabral avisa que “os números indicam que o mini ciclo de excedentes orçamentais pode estar terminado“. O CFP prevê um saldo equilibrado este ano e um regresso aos défices a partir de 2026, depois de excedentes em 2023 (1,2%) e 2024 (0,7%).

A instituição projeta um défice de 1% do PIB em 2026. No próximo ano, o resultado é influenciado em mais de metade pelo impacto dos empréstimos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Descontando este efeito, o saldo orçamental ainda seria negativo em 0,4% devido às medidas de política. No Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), o Governo inscreveu um excedente orçamental de 0,3% este ano e de 0,1% em 2026.

O CFP torna-se, assim, a segunda instituição económica a prever défices. Em dezembro, o Banco de Portugal apontou para um défice de 0,1% este ano, de 1% em 2026 e de 0,9% em 2027.

O ministro da Economia, Pedro Reis, garantiu que “não vai haver défice em Portugal“. “Isso é claríssimo”, respondeu aos jornalistas em reação aos números do CFP. O tema das finanças públicas tem servido de arma de arremesso entre a AD (Aliança Democrática) e o PS, na pré-campanha para as legislativas de maio. No cenário orçamental do seu programa eleitoral, os socialistas apontam para um défice de 0,4% no próximo ano, o que levou a críticas do partido do Governo.

Nazaré da Costa Cabral, presidente do Conselho das Finanças Públicas.Hugo Amaral/ECO

“Crescimento médio da despesa liquida nos 4,4% está acima do que foi comprometido com Bruxelas”

O CFP alerta que Portugal poderá incumprir a meta acordada com a Comissão Europeia no plano orçamental estrutural de médio prazo. “A taxa de crescimento médio da despesa líquida nos 4,4% está acima do que foi comprometido com Bruxelas“, avisou Nazaré da Costa Cabral. No plano orçamental estrutural de médio prazo, Portugal inscreveu um crescimento médio de 3,6%.

Destacou ainda que os desvios anuais previstos para 2025 e 2027 estão também acima do que são “os desvios tolerados pelas regras europeias”.

“Perigo é podermos ter uma inflexão na trajetória da dívida pública”

A presidente do CFP alertou para o impacto que teria nas finanças públicas se os saldos primários, atualmente positivos, passarem a negativos. Isto porque têm servido para servido para a redução do rácio da dívida pública. “O perigo é de podermos ter uma inflexão na trajetória da dívida pública“, avisa, considerando que “isso é que seria preocupante”, uma vez que “significaria uma deteriorarão” da situação financeira do país.

No relatório a instituição, prevê uma redução do peso da dívida de 94,9% do PIB em 2024 para 91,8% em 2025, caindo progressivamente até 90,3% em 2026.

“Conjunto de medidas tiveram um objetivo: reforçar as políticas sociais”

Nazaré da Costa Cabral sublinhou que existiu “um conjunto de medidas” que contribuíram para a deterioração do saldo orçamental e que tiveram um objetivo”: “reforçar um conjunto de políticas sociais“, entre as quais a melhoria dos salários num conjunto de carreiras e o suplemento das pensões. “Houve uma opção política no sentido de valorizar estas funções sociais do Estado. É evidente que isto tem impacto no desempenho da despesa quer em termos de saldo, quer em termos de dívida”, disse.

“Estas medidas [que deterioram o saldo] foram adotadas por vários atores políticos, algumas pelo Governo e outras pelo parlamento, nomeadamente na discussão do Orçamento do Estado”, assinalou.

“Aumento da receita de impostos diretos de 1.167 milhões em 2025 por via da redução dos reembolsos”

Os reembolsos de IRS deverão reduzir-se em 1.167 milhões de euros em 2025 devido às alterações na retenção na fonte no ano passado, estima o CFP. O impacto será positivo na receita fiscal e, consequentemente, no saldo orçamental. “Há uma certa probabilidade de, em 2025, haver um pequeno excedente por força dos reembolsos”, disse a responsável do CFP.

“O efeito mecânico da aplicação das tabelas de retenção implicou que o Estado abdicasse de mais receita do que poderia obter se a medida não tivesse sido adotada”, o que “vai ter um impacto conjuntural em 2025 favorável”, explicou.

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