“Drill, baby, drill”? Visão de Trump deverá sair ‘furada’ com preços baixos do petróleo
Os preços do petróleo não estão a suportar a intenção de expansão da produção norte-americana.
O presidente norte-americano, Donald Trump, reavivou como um objetivo da sua administração a máxima “Drill, baby, drill“, que se refere à expansão da produção de combustíveis fósseis nos Estados Unidos. No entanto, esta intenção aparece como “uma espécie de miragem”, já que os preços mais baixos do petróleo — consequência, também, das guerras comerciais promovidas por Trump — não são favoráveis a um aumento da produção do ‘ouro negro’ no território.
“Há uma contradição inerente à estratégia de política energética da administração Trump”, escreve Ben McWilliams, investigador do think tank Bruegel. Isto, tendo em conta que possui dois objetivos antagónicos: por um lado, pretende aumentar a produção de petróleo e gás. Em segundo lugar, quer reduzir preços ‘na bomba’ para os consumidores. “Ambos não são possíveis”, já que os produtores de petróleo precisam de preços elevados para aumentar a produção, o que ditaria preços mais elevados para os consumidores, explica o mesmo. “O ‘drill, baby drill’ tem sido sempre uma espécie de miragem”, ilustra, por seu lado, Romain Mouquet, analista Sénior na Allianz Global Investors (AllianzGI).
A Oddo BHF espera que a produção de petróleo nos Estados Unidos desacelere, sobretudo em 2026. O analista Ahmed Ben Salem aponta um crescimento de 440 mil barris por dia em 2025, reduzido a 180 mil barris diários em 2026. O Banco Carregosa concorda: “o atual nível de preços não é suficientemente alto para justificar uma nova vaga de perfuração intensiva”, conclui o economista sénior do Banco Carregosa, Paulo Rosa, que não espera um aumento da produção de petróleo nos EUA até ao final de 2025, e considera possível um ligeiro abrandamento. Mouquet prevê uma produção dos EUA “praticamente estável” este ano, já que a menor atividade de perfuração é compensada pelos ganhos de produtividade dos poços e pelo crescimento da produção offshore dos EUA.
Para um crescimento sustentado da produção, seria necessário um preço consistentemente acima dos 80 a 85 dólares por barril — patamar considerado rentável para a expansão do xisto, segundo fontes como a Reserva Federal de Dallas e a Rystad Energy, citadas pelo Banco Carregosa. A extração em áreas de areias betuminosas ou no Ártico, com maiores exigências técnicas e ambientais, pode necessitar de preços superiores a 80 ou mesmo 100 dólares por barril, enquanto no caso da perfuração offshore, os custos operacionais são mais elevados, exigindo normalmente preços entre os 60 e os 80 dólares. Apenas em regiões “altamente produtivas”, como a bacia do Permiano no Texas, esse valor pode descer até aos 40 dólares.
Os preços do barril cotado em Nova Iorque, o West Texas Intermediate, seguiam esta quinta-feira a cair 1,71% para os 60,52 dólares. A cotação já perdeu mais de 15% do valor desde o início do ano.
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Em paralelo, o economista do Banco Carregosa realça que os produtores norte-americanos têm adotado uma postura de maior disciplina financeira, privilegiando retornos para os acionistas em vez de expansão da produção. Também o analista sénior da AllianzGI vê uma mudança de postura das empresas de exploração e produção dos EUA, de “uma fase de crescimento agressivo” para um maior foco na rentabilidade e retorno. Aliás, estas empresas já começaram a reduzir a sua atividade para este ano, com várias delas a cortarem os planos de capital para 2025 devido à economia mais desafiante, assinala Mouquet.
Além da dificuldade de conciliar o objetivo de elevada produção com o de preços baixos para o consumidor, “é difícil que a política dos Estados Unidos influencie a produção doméstica”, que está dependente da decisão dos privados, ao contrário do que acontece em Estados como a Arábia Saudita, indica o Bruegel. A Allianz entende que, embora a Casa Branca possa aliviar parte da carga regulamentar, “a sua capacidade para influenciar diretamente as empresas americanas a aumentarem as suas atividades é limitada”.
Preços deverão continuar pressionados
A ActivTrades entende que o preço do petróleo deverá continuar sob pressão, podendo mesmo recuar abaixo dos 60 dólares por barril. Para a AllianzGi, o West Texas Intermediate (WTI), o barril negociado em Nova Iorque, deverá rondar os 61 dólares por barril, em média, até ao final de 2025. Já no próximo ano, a Oddo BHF conta que o preço do barril se coloque nos 65 dólares.
Do lado da oferta a nível global, “o mercado espera que a produção de petróleo aumente o ritmo, ultrapassando até os níveis do consumo”, indica Vítor Madeira, analista na XTB. A AllianzGI espera um “crescimento saudável” da oferta por parte de regiões não pertencentes à Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP) e não produtoras de xisto. A mesma casa de investimento prevê um forte crescimento da produção em projetos de águas profundas e offshore, em regiões como o Brasil, a Guiana, o Golfo dos EUA e o Cazaquistão.
Ao mesmo tempo, a AllianzGI espera o aumento da produção da OPEP, criando uma situação de excesso de oferta. Já na perspetiva da Oddo BHF, a Organização de Países Exportadores de Petróleo não deverá aumentar a respetiva produção, uma vez que apenas a Arábia Saudita terá a capacidade de o fazer. No entanto, a ActivTrades ressalva que uma eventual normalização das relações com o Irão — caso se confirme a expectativa de um acordo nuclear — poderá introduzir ainda mais oferta no mercado global.
Depois dos aumentos previstos para maio e junho, os países membros da OPEP+ estão a estudar um terceiro aumento consecutivo da produção de petróleo em julho, avançou esta quinta-feira a Bloomberg. A decisão será tomada na reunião da organização agendada para o dia 1 de junho.
Do lado da procura, “a palavra-chave continua a ser incerteza”, afirma a ActivTrades. O mesmo analista, Ricardo Evangelista, toma a pausa no conflito comercial entre a China e os Estados Unidos como “temporária”, sendo que o clima de tensão entre as duas maiores economias do mundo “continua a ensombrar as perspetivas de crescimento global, afetando negativamente as projeções de consumo de petróleo”.
“Um abrandamento mais acentuado ou uma eventual recessão, sobretudo nas principais economias consumidoras, poderá reduzir significativamente a procura por petróleo, pressionando os preços em baixa”, reforça Paulo Rosa. Já num cenário em que a economia global evita uma recessão e mantém um crescimento, ainda que moderado, os preços poderão estabilizar num intervalo entre os 60 e os 75 dólares barril ou até recuperar ligeiramente, dependendo da gestão da oferta, avalia Rosa.
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