Editorial

Costa voa baixinho… e Neeleman está aos comandos

O Estado tem 50% da TAP, como foi prometido por António Costa, por isso, manda na companhia de aviação, certo? Errado. Quem está aos comandos é David Neelman.

Quando António Costa assumiu funções como primeiro-ministro, uma das promessas mais vocalizadas foi a recuperação do controlo acionista da TAP, empresa que o governo de Passos tinha privatizado na maioria do capital. E cumpriu: o Estado passou dos 39% para os 50% da companhia e até nomeou o chairman. Mas como se percebe agora no momento de saída anunciada de Fernando Pinto, o que parece, não é. Quem manda na TAP é mesmo David Neeleman. Se alguém tinha dúvidas, desapareceram com a reconfiguração da gestão executiva.

A saída de Fernando Pinto da TAP era uma inevitabilidade. E o acionista brasileiro que, com Humberto Pedrosa, tem uma participação de 45% na TAP através da Atlantic Gatway, tinha desde o primeiro dia a intenção de mudar o presidente executivo. Pinto estava na TAP desde o ano 2000, curiosamente foi contratado pelo então ministro Jorge Coelho para fazer a privatização da empresa e acaba por ser essa operação, realizada 16 anos depois, que o leva à demissão. Mas havia uma dúvida (para alguns)… Quem é que manda na companhia? Se o Estado tem 50%, os trabalhadores 5% e o acionista privado 45%, a resposta correta é o Estado, certo? Errado.

Quando António Costa prometeu recuperar o controlo da TAP, pôs-se nas mãos da Atlantic Gatway e especialmente de Neeleman, que manda no consórcio. A retórica política serviu para enganar os eleitores, e os contribuintes. O Estado ficou pior do que estava naquele negócio, assumiu responsabilidades que já não tinha, especialmente as decorrentes da dívida da TAP, mas o governo pôde anunciar que cumpria uma promessa. Os portugueses voltavam a ser donos da sua companhia de bandeira. Mentira, que acabou por ser desfeita agora, com as mudanças na comissão executiva da empresa.

Fernando Pinto nunca foi uma escolha de Neeleman, foi protegido pelo Estado que queria ter alguém na gestão que viesse da TAP pública. E Pinto foi, na verdade, o gestor público com mais tempo em exercício de funções na mesma empresa do Estado: 17 anos, muitos primeiros-ministros e mais ainda ministros que tutelavam a empresa. Agora, numa equipa de três executivos, dois são de Neeleman, incluindo o novo presidente executivo, Antonoaldo Neves, e um é de Humberto Pedrosa. Nem um é do Estado.

O acionista Estado tem o chairman, sim, mas não risca nada nas decisões relevantes da empresa, menos ainda na gestão operacional, como percebeu Rui Moreira quando tentou envolver o governo na guerra pelos voos a partir do aeroporto do Porto. Agora, há uma configuração quase esquizofrénica, porque o Estado controla a companhia para efeitos políticos, assume responsabilidades que já não tinha, mas quem manda de facto é Neeleman. Como também se percebe pelos negócios em que a TAP serve de ‘garantia’ para outros acordos do empresário noutros mercados da aviação, nomeadamente no Brasil.

Atenção, o que está mal não é a privatização. E a entrada de um acionista que sabe do setor, como os resultados estão a mostrar. Fernando Pinto já o disse, a TAP salvou-se no dia em que a Atlantic Gatway meteu 250 milhões de euros na companhia. O que está mal é outra coisa, é a utilização da TAP para fazer política e que, na prática, serviu apenas para diminuir a força negocial do Estado. Como se vê.

O governo nacionalizou os riscos, mas manteve a gestão, na verdade, privada, apenas por razões puramente partidárias. Seria agora útil que António Costa e o ministro Pedro Marques nos explicassem o que o Estado ganhou com a alteração dos termos da privatização da TAP, quando os privados tinham 61% da empresa, mas também as respetivas responsabilidades na dívida da companhia. Afinal, António Costa voa baixinho…e David Neelman está aos comandos.

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