Falta de produtividade atrasa o país. Como se acelera?

À medida que a economia nacional avança, a produtividade mantém a cadência lenta e teima em não avançar. O que justifica este fraco desempenho e como pode ser ultrapassado? O ECO foi saber.

Imagem de Lídia Leão.

O país está a atravessar um bom momento ao nível económico. Mas entre os indicadores melhorados — do défice ao emprego — e a quebra sucessiva de recordes — do turismo aos juros da dívida —, existem alguns “calcanhares de Aquiles” da economia que teimam em não avançar. A par da precariedade no trabalho, a produtividade surge como um dos principais entraves ao progresso da economia nacional. O ECO quis saber por que Portugal se mantém atrás nesta corrida e como saltar os obstáculos — da ótica das empresas até à dos trabalhadores.

A produtividade em Portugal tem tido uma evolução “desfavorável” nos últimos anos, descreve João Amador, professor na Nova SBE e investigador no Departamento de Estudos Económicos do Banco de Portugal (BdpP). Está muito abaixo de países como a Alemanha ou mesmo da vizinha Espanha. “A verdade é que o nível de partida da produtividade do trabalho em Portugal é bastante baixo em termos comparativos”, continua João Amador. Não temos avançado a passos mais curtos — desde 2000 até 2016 evoluímos 63% em comparação com os 45% da Alemanha — mas, em 2017, o Eurostat prevê que o país dê mesmo um passo atrás: a projeção é de um recuo de 0,6% no nível de produtividade. Um recuo que não é novidade, num percurso pautado por subidas modestas e outras descidas.

Produtividade Aparente do Trabalho (por hora trabalhada)

Uma baixa produtividade significa que, “para o nível de emprego que a economia portuguesa está a criar, o produto interno cresce pouco”, explica João Amador. Os dados no gráfico acima são mais rigorosos porque têm em consideração o número de horas de trabalho mas, geralmente, a produtividade é calculada apenas dividindo a riqueza produzida pelo número de trabalhadores usado para a conseguir, por ser uma fórmula mais simples. Isto tem algumas desvantagens: “Produzir mais é diferente de produzir algo que seja mais valorizado por quem compra“, tornando difícil a comparação entre setores, assinala Pedro Pita Barros, também professor na mesma instituição.

Produzir mais é diferente de produzir algo que seja mais valorizado por quem compra.

Pedro Pita Barros

Mas porquê?

Os motivos para a baixa produtividade das empresas portuguesas são vários e interligam-se. João Amador fala de um nível baixo de capital por trabalhador, em comparação com outros países mais avançados. “Quando um trabalhador não dispõe de maquinaria que incorpore o progresso tecnológico, é natural que a sua capacidade produtiva seja menor”, constata, apontando esta que é “uma questão estrutural” e que se agravou durante o período de crise, dado o baixo nível de investimento.

Pedro Pita Barros acrescenta que existem “decisões erradas de investimento em geral” pois “nem sempre o investimento é realizado nos projetos de maior retorno”. Aqui, culpa a “falta de capacidade de gestão”, que reconhece sobretudo nas pequenas e médias empresas, e, por vezes, a existência de apoios públicos que poderão servir de almofada a projetos menos promissores.

Para além dos problemas de investimento, o mercado de trabalho também causa algum atrito. Por um lado, existe ainda um baixo nível de escolaridade, sobretudo nas gerações mais velhas que, não só prejudica a qualidade da gestão como pode impedir os colaboradores de adotarem métodos mais avançados de trabalho.

Por outro lado, há um elevado peso de contratos a termo. “Contratos de curto prazo fazem com que a empresa não invista no trabalhador porque irá sair em breve, e o trabalhador não investe em ser produtivo na empresa porque estará a pensar no próximo emprego”, nota Pita Barros.

E agora, empresas?

“Não existem soluções rápidas e milagrosas”, avisa João Amador, mas acredita numa ação concertada e continuada nas diferentes áreas. “Várias pequenas reformas podem ter mais impacto do que uma grande reforma que levanta frequentemente grandes oposições”, afirma.

Pita Barros responde aos desafios, um a um. É preciso escolher melhor os projetos em que se investe, sendo os setores transacionáveis (ou seja, os que permitem exportações) a melhor aposta para aproveitar os “escassos recursos financeiros internos”. É urgente a recuperação financeira das empresas, através de um “reforço da solidez do sistema bancário e da sua capacidade de conceder crédito”, enquanto “a capacidade de atrair investimento estrangeiro deve ser encarada como prioritária“, defende ainda.

Em linha com estas preocupações, aconselha uma nova visão quanto à vida útil dos negócios. “[As empresas] ou crescem por si, ou se juntam a outras, ou desaparecem” — a cultura de “dar mais um jeitinho” tem tido um impacto negativo, diz.

Entre as paredes que constroem o tecido empresarial português, é necessário melhorar a qualidade da gestão, “sobretudo das pequenas e médias empresas”, acrescenta o professor. Sublinha, por fim, que é preciso manter o nível de investimento na educação.

Nas mãos dos trabalhadores

“Na atual conjuntura, e mais do que nunca, o crescimento das empresas depende do talento”: os trabalhadores vão moldando a sua carreira e, simultaneamente, o futuro da organização, nota Carla Marques, country manager da ManpowerGroup Portugal. O primeiro passo para estimular a produtividade é traçar objetivos claros, associados a um plano de incentivos e de carreira. “A produtividade poderá ser afetada se o trabalhador sentir que a empresa não tem planos para o mesmo, e objetivos difusos“, avança a recrutadora.

"Os portugueses são trabalhadores de excelência ,e prova disso é o sucesso que alcançam além-fronteiras, sempre que lhes é concedida essa oportunidade.”

Carla Marques

ManpowerGroup

Já a Randstad oferece uma mão cheia de bons motivos para se ser produtivo. “A produtividade aumenta, em qualquer setor, atividade ou função quando se gosta do local de trabalho e/ou da função que se desempenha“, garante Mariana Canto e Castro, diretora de recursos humanos da recrutadora em Portugal. Para que isto aconteça, é preciso um ambiente de trabalho de equipa, uma comunicação transparente e uma ética presente — “a empresa tem de demonstrar diariamente que cumpre com o que professa” — explica a Randstad. No fim do dia, é também importante o reconhecimento quando as metas são alcançadas e que seja veiculada uma visão positiva do futuro, de modo a fazer brilhar os olhos dos trabalhadores e os resultados do negócio.

O trabalhador português é produtivo?

Os portugueses são trabalhadores de excelência, e prova disso é o sucesso que alcançam além-fronteiras, sempre que lhes é concedida essa oportunidade“, vinca a representante da ManpowerGroup. Para a recrutadora, a reputação dos trabalhadores nacionais é o “toque final na derradeira decisão” de uma empresa estrangeira, quando esta decide instalar operações em Portugal.

A Randstad vê várias características que são comuns aos trabalhadores portugueses e que podem justificar a boa fama além-fronteiras, ao mesmo tempo que beneficiam a produtividade: a “boa qualidade técnica” é acompanhada pela capacidade de improviso, criatividade e resiliência. Entre os prós, ainda consta a “bondade natural” e o “não gostar de ser desconsiderado”.

Mas a produtividade é uma moeda que, para além desta coroa, tem uma cara “menos brilhante” que a desvaloriza. No geral, o trabalhador português não é orientado para resultados e é emocionalmente frágil, desmotivando com facilidade, diz a recrutadora. Reclama “colo em excesso” e, na maioria dos casos, não reconhece um espírito de equipa forte. Acaba por canalizar mal o sentimento de competitividade, acrescenta Mariana Canto e Castro.

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