Editorial

Um regulador das telecoms que quer ser um agente de mercado

Um regulador de mercado deve promover uma concorrência saudável, não deve ser um ator que participa no próprio mercado, mas é o que temos hoje com Cadete de Matos e a Anacom.

Para que serve um regulador de mercado? Entre outros pontos, para criar uma concorrência saudável, as mesmas condições entre os agentes de mercado, ou, se quiserem, um idêntico ‘level playing field’, para evitar as tentações monopolistas que todas as empresas têm, e para proteger os consumidores dessas tentações. Mas um regulador não serve para ser um ator do mercado ou, pior, para ser um trampolim profissional do próprio presidente da entidade reguladora. Pois, é o que parece ser a ação atual da Anacom, o regulador do mercado das telecomunicações.

Decorreu na semana passada o encontro anual da APDC, um estado da nação das telecomunicações e media. É já um encontro que marca a agenda de todos os que querem seguir o que se passa nestes setores. Particularmente devido à competência, e resiliência, do seu presidente, Rogério Carapuça, que transformou a associação num fórum de reflexão que agrega já outros setores e outros interesses. E nem precisa de estar sentado na concertação social para ser útil e relevante. Um dos encontros, já é uma tradição, é o que senta no mesmo palco os presidentes das empresas de telecomunicações. A Altice, a NOS, a Vodafone e os CTT (faltou a Nowo, e não sei se foi convidada, mas deveria, ou se recusou a presença). No ano passado, surpreendentemente e pela primeira vez, Cadete de Matos, o presidente da Anacom, também se juntou ao debate. Este ano, não.

O que disse Cadete de Matos? Que os operadores não queriam discutir com o regulador. O debate, em si mesmo, não é problema nenhum, embora seja estranho, para não dizer outra coisa, pôr no mesmo patamar uns e outros. Porque a natureza da relação entre os regulados e o regulador impede uma discussão no mesmo plano, como deveria ser evidente para o presidente da Anacom.

Em Portugal, é difícil acertar nos reguladores. Não queremos reguladores dependentes do poder político, direções-gerais com outro estatuto, como temos hoje na energia. Mas também não queremos reguladores que são agentes de mercado, e que têm uma intervenção tão intrusiva que passam a ser, eles próprios, uma fonte de distorção. Quaisquer que sejam as razões, boas ou más. Porque isso não beneficia o consumidor, prejudica-o no preço e/ou no serviço.

É o que temos na Anacom. Um exemplo? A conferência de Imprensa de Cadete de Matos sobre os tarifários que não respeitariam os princípios do fim do roaming e da neutralidade da internet. Uma posição tomada sem aviso prévio aos operadores. Os episódios não faltam, basta ‘googlar’…

Os reguladores têm de ter uma relação de tensão com as empresas que regulam, sim, mas a Anacom conseguiu o que parecia impossível, a união de operadores desavindos, até pessoalmente. A Altice, a NOS e a Vodafone juntas na mesma estratégia contra a intervenção da Anacom deveria querer dizer alguma coisa a Cadete de Matos. “O regulador está claramente contra os operadores”, disse Miguel Almeida, da NOS. “O sector das comunicações é muito mais do que a regulação”, atirou Mário Vaz, da Vodafone. E Alexandre Fonseca, presidente da Altice Portugal? O setor das telecomunicações “não é uma feira das vaidades”. Pelos vistos, é, não é João Cadete de Matos?

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Um regulador das telecoms que quer ser um agente de mercado

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião