Proprietários dizem que contrato de habitação vitalício “não vai ter adesão”
O presidente da Associação Lisbonense de Proprietários garante que "não houve ninguém que sentisse necessidade de uma figura" como a que o Governo acaba de criar.
O Governo aprovou, esta quinta-feira, um novo modelo de contrato de habitação, que permitirá aos moradores residirem numa mesma casa por um período vitalício. É uma medida que, segundo o Governo, procura alcançar um equilíbrio entre o regime de habitação própria e o regime de arrendamento. Mas parece não vir responder a qualquer reivindicação que tenha sido levantada quer por proprietários, quer por inquilinos. No fundo, “é uma iniciativa isolada do Governo, que parece saída completamente do vazio” e que não terá qualquer adesão, antecipa Luís Menezes Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP).
“É uma situação muito estranha. Não houve ninguém que sentisse necessidade de uma figura deste tipo, tal como é descrita, porque já existem figuras similares, como o usufruto, figura que está prevista no Código Civil”, diz o responsável, em declarações ao ECO.
Luís Menezes Leitão refere-se ao artigo 1439.º do Código Civil que prevê o “direito de gozar temporária e plenamente uma coisa ou direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância”. Este usufruto é, em alguns aspetos, semelhante à figura agora criada pelo Governo, mas apresenta também várias diferenças. Desde logo, pode ser constituído em favor de uma ou mais pessoas. Sendo constituído a favor de uma pessoa coletiva, o usufruto tem a duração máxima de trinta anos. Por outro lado, o usufrutuário pode trespassar o seu direito a outro, definitiva ou temporariamente, o que não acontece no novo modelo criado pelo Governo.
Seja como for, Luís Menezes Leitão não vê vantagens neste novo modelo, cujos detalhes ainda não são conhecidos, uma vez que o decreto-lei que define as suas regras não foi tornado público. “A maior parte das pessoas não quer que alguém crie um direito real sobre o seu imóvel que dure a vida toda. Para isso, mais facilmente o vendem. E se a pessoa que compra esse direito também fica a pagar a vida toda por esse bem, a verdade é que é muito mais fácil pedir um empréstimo ao banco e comprá-lo, já que ainda pode transmiti-lo aos herdeiros”, afirma.
Esta parece uma iniciativa completamente saída do vazio. O resultado é que não vai ter aplicação nenhuma, é inútil. Não terá nenhuma adesão.
“Não vemos necessidade nenhuma disso. Foi uma iniciativa isolada do Governo e sem ouvir ninguém. Esta parece uma iniciativa completamente saída do vazio. O resultado é que não vai ter aplicação nenhuma, é inútil. Não terá nenhuma adesão“, acrescenta.
Por outro lado, poderão levantar-se questões jurídicas. Desde logo, a possível “duplicação de um direito que já existe”, o do usufruto. Há ainda uma possível questão fiscal, que poderá, ou não, estar contemplada no decreto-lei. “A aquisição de direitos reais sobre os imóveis implica o pagamento de IMT. Não estou a ver como é que alguém coloca este modelo como alternativa em relação ao arrendamento, com os custos que existem neste tipo de situações”, conclui Menezes Leitão.
Inquilinos também não veem vantagens
Também os inquilinos rejeitam a eficácia desta nova medida. “O inquilino vai passar a ser o banqueiro do proprietário, vai financiar o proprietário”, afirma Romão Lavadinho, presidente da Associação dos Inquilinos Lisbonenses (AIL), em declarações à Lusa.
“A ter interesse, será para um nicho muito reduzido de inquilinos. Não serve os inquilinos, serve apenas o interesse de alguns proprietários”, acrescenta, admitindo também que é preferível investir na compra de casa própria do que celebrar um contrato desta natureza.
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