Editorial

Novo Banco, mentiras e um video

Os prejuízos do Novo Banco em 2018 exigem mais do que auditorias passadas, exigem explicações presentes e medidas novas para o futuro.

Vem aí uma auditoria aos créditos do BES e que levaram cinco (!?) anos a serem assumidos nas contas como o que eram, financiamentos sem risco… de serem recuperados. Uma auditoria ao Novo Banco que é em tudo igual à realizada pelo EY à Caixa Geral de Depósitos, que serve os propósitos políticos de Mário Centeno e, em simultâneo, a exigência de transparência sobre os buracos que os fundos públicos estão a tapar. Mas os prejuízos do Novo Banco em 2018, de 1.412 milhões de euros, e o pedido de capital de 1.149 milhões ao Fundo de Resolução (que é financiado pelos bancos, mas precisa de empréstimos dos contribuintes e pesa nas contas públicas) exigem mais do que auditorias passadas, exigem explicações presentes e medidas novas para o futuro.

  1. Quando, em outubro 2017, o Governo assumiu a responsabilidade de decidir a venda do Novo Banco ao único comprador na corrida, o fundo Lone Star, assinou um acordo que previa a existência de um mecanismo de capital contingente – uma garantia pública de 3,89 mil milhões de euros, com um prazo de validade de oito anos, que servia para cobrir os riscos de determinados ativos maus, isto é, financiamentos sem garantias ou com um risco de se transformarem em malparado. Entre a nacionalização e a venda com uma garantia, o que era preferível? Esta venda. Mas, portanto, se este montante foi inscrito no contrato, qual é a dúvida? Esperava-se que o Lone Star não usasse aquele montante? Das duas, uma: Ou há uma grande hipocrisia nos discursos surpreendidos, por exemplo nos que decorrem da decisão de Mário Centene de pedir uma auditoria, ou o ministro das Finanças foi enganado. E por quem?
  2. Como alguns se lembrarão, a Comissão Europeia considerava que os 3,89 mil milhões de euros não chegariam para tapar os buracos do Novo Banco e no contrato de venda à Lone Star, exigiu que o Estado assumisse, no contrato, os custos de uma liquidação se o banco não fosse viável.
  3. Há mecanismos de controlo nos pedidos do Novo Banco ao Fundo de Resolução. Em primeiro lugar, os ativos que estão debaixo da proteção daquela garantia são conhecidos e identificados. Depois, há pelo menos três etapas que o Lone Star e a gestão do Novo Banco têm de passar até aquele pedido ser aceite. Da Oliver Whyman, de três personalidades independentes (José Rodrigues Jesus, Athayde Marques e Bracinha Vieira) e do próprio Fundo de Resolução, presidido por Máximo dos Santos, que tem o poder de dizer ‘sim’ ou não’. Estas três entidades têm de (se) explicar publicamente sobre o processo da validação das contas que justificam mais 1.149 milhões de euros de fundos públicos.
  4. Há um conflito de interesses insanável no modelo de supervisão, que também se reflete aqui. O BCE e o Banco de Portugal estão a pressionar os bancos portugueses a venderem os seus ativos, a venderem as carteiras de malparado, e elas estão a ser vendidas a um ritmo acelerado. Com perdas relevantes, apesar do bom momento da economia. O Novo Banco fez, aliás, as maiores operações de sempre em Portugal, por exemplo com o projeto ‘Nata’, com a venda de mais de dois mil milhões de euros de créditos por um valor de desconto. Qual foi esse desconto? E qual será a rendibilidade dos fundos que compraram estes ativos a desconto? Provavelmente acima dos dois dígitos, portanto, são mesmo os contribuintes a financiarem os lucros daqueles fundos. Mas se o Banco de Portugal manda vender, e há uma garantia pública a cobrir as perdas… Qual é o conflito de interesse? O Banco de Portugal, enquanto entidade de resolução, valida os pedidos de capital do Novo Banco, portanto, dificilmente dirá ‘não’ num dia ao que está a exigir no outro.
  5. ‘O BES mau’ criado no quadro da resolução e do nascimento do Novo Banco era o banco da família, os negócios familiares. Agora, temos um ‘Novo Banco mau’, uma espécie de banco que financiava os amigos. E finalmente temos um Novo Banco (vamos ver se é desta). Só que há outra explicação a dar por parte da gestão. Estes créditos, que são classificados de ‘legacy’, portanto, contratados quando Ricardo Salgado era presidente, foram renovados? Em que condições? E quantas vezes? Não há bancos que estejam a contratualizar contratos de financiamento a dois/três ou quatro anos. O Novo Banco tem cinco anos, portanto, só agora, em 2018, se percebeu que aqueles créditos seriam irrecuperáveis?
  6. A gestão do Novo Banco está a fazer o que o acionista lhe exige e o que o banco precisa para ter alguma possibilidade de ser viável a prazo (com outro dono, como é evidente, porque o Lone Star vai realizar as respetivas mais valias e vai embora). Qual seria o gestor que, nas mesmas circunstâncias, faria de forma diferente daquela que António Ramalho está a fazer? Está a limpar um banco, e até já antecipa que vai voltar a pedir mais dinheiro ao Fundo de Resolução em 2020. Já pediu metade do que está previsto, podemos antecipar que vai usar a totalidade dos 3,89 mil milhões de euros e, por este andar, não vai precisar dos oito anos. Por isso…
  7. …é um vídeo que todos devem ver (incluindo os deputados que querem ouvir Mário Centeno). Com as garantias do ministro das Finanças e do primeiro-ministro no dia em que anunciaram ao país a venda do Novo Banco. Repetiram, ambos, que os contribuintes não seriam chamados nem direta nem indiretamente, e que as “necessidades eventuais” seriam cobertas pelas contribuições dos bancos para o Fundo de Resolução. Tendo em conta a prontidão com que o governo anunciou a auditoria, já terão, ambos, mudado de opinião.

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