Tenham medo, tenham muito medo
Se acham que o Twitter é mau, preparem-se para uma versão pior. Ela está a chegar em cima das eleições americanas e da crise social europeia.
O Twitter é uma rede social relativamente bem sucedida e que é usada regularmente por mais de 330 milhões de pessoas no mundo inteiro. Tem, acima de tudo, o mérito de não tentar ser o Facebook. Mas está carregado de problemas, a começar pelo discurso de ódio e também pelo atraso crónico na implementação de inovações. Isso tem limitado o seu crescimento e, apesar de ter começado a dar lucro há pouco tempo, a flutuação no mercado está longe de impressionar.
Por tudo isto ficou a jeito para ser comprado por um fundo de investimento detido por Paul Singer, um gestor de investimentos que é próximo de Donald Trump. O plano de Singer é despachar a atual administração e pôr a rede a dar lucro. Essa transformação vai criar uma versão ainda pior do Twitter. Uma versão em que tudo o que acontece lá é única e exclusivamente justificado pela ambição de crescimento imediato – e no, atual contexto, isso significa a transformação do Twitter numa gigantesca câmara de ressonância para Trump e quejandos.
A maneira mais rápida de fazer o Twitter crescer é promover a replicação de elementos que repetem o comportamento daquela que é, de longe, a sua maior estrela: Donald Trump. Isso implica satisfazer os seus seguidores, promover o seu discurso e proteger o grupo de fundamentalistas que o segue.
Implica também repetir a fórmula noutros países, promovendo a mensagem populista em nome do lucro imediato e sem preocupações com coisas comezinhas como a verdade, o rigor ou o equilíbrio social. Em ano de eleições, isto garante que os hackers russos não terão de se preocupar com o Twitter e poderão focar-se em disseminar desinformação nos outros meios.
É importante notar que este não é um problema do modelo capitalista e que permite, saudavelmente, que uma empresa que está no mercado satisfaça os desejos dos novos acionistas. O problema também não está no desejo de procurar o lucro que, à partida, fará a empresa crescer e criar mais emprego e dinamismo económico. O problema é outro.
Uma plataforma altamente influente junto de jornalistas, políticos e fazedores de opinião que se transforma subitamente num ninho de extremistas e populistas terá consequências assustadoras para o futuro do espaço público.
Já nem vale a pena falar dos EUA, que são uma nação irremediavelmente fraturada entre dois campos políticos. Imagine-se o efeito na Europa, um continente que está sob pressão de novos movimentos migratórios e que sofre com o limitado crescimento económico.
Agora que já não há dúvidas sobre o efeito megafone que certas plataformas dão aos populistas – como se vê e viu em Portugal no último ano – vale a pena começar a pensar na sua regulação. Regulamos (mal) a televisão, regulamos (mal) a imprensa, regulamos (mal) o discurso público… e optamos por não regular de todo as redes sociais? Há qualquer coisa que não faz sentido aqui.
Ler mais: Há um livro cujo conteúdo e título são apropriadamente adaptados a este contexto. Chama-se This is Why We Can´t Have Nice Things e explica o que são os trolls, o seu comportamento e as suas consequências. Em vez de adotar uma postura crítica, o livro defende-os e cauciona as suas atitudes, num discurso provocador que merece ser entendido.
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