Brexit retirou perto 5000 milhões de euros ao seguro londrino em 2019
Sem contar custos de reestruturação pela perda dos “direitos de passaporte”, seguradoras de Londres perderam, só em 2019, mais de 4,5 mil milhões de libras esterlinas em prémios gerados na UE.
Quatro anos depois do referendo que decidiu a saída do Reino Unido da União Europeia, o impacto do Brexit nas seguradoras e resseguradoras que operam na praça londrina já surge contabilizado no mais recente relatório da associação que representa o mercado comercial de seguros de Londres (IUA).
Os montantes de prémios que eram anteriormente reportados diretamente como negócio consolidado em atividades de subscrição desenvolvidas em países da Europa continental, mas supervisionado e gerido através das operações em Londres, sofreram decréscimo significativo e deixam de ser considerados como receita direta.
A International Underwriting Association of London (IUA), associação que representa o setor segurador constituído pelas companhias – não Lloyd’s – que operam no mercado londrino de seguros e resseguro (incluindo delegações no resto do Reino Unido e subsidiárias no exterior), iniciou em 2011 a recolha e publicação de informação sobre prémios (até então não sistematizada). A recolha de dados passou a ser compilada e publicada anualmente no “London Company Market Statistics Report”.
O relatório estatístico da IUA relativo a 2019 foi divulgado no início de outubro de 2020 e revela o impacto que o Brexit teve na atividade das companhias (britânicas e estrangeiras) com operação centralizada na city (centro financeiro de Londres), mostrando também que o Lloyd’s of London, tradicional hub de referência do mercado internacional, tem perdido primazia, em certos ramos, como destino segurador daquela praça financeira internacional.
O London Company Market Report 2020 indica crescimento de 10% em volume de bruto de prémios do conjunto de associados, face a 2018, para 21,44 mil milhões de libras que, acrescidos de 6,2 mil milhões realizados através de delegações localizadas no resto mercado doméstico (fora de Londres), totalizaram 27,63 mil milhões de libras esterlinas (-2,8% face a 2018). Juntando o volume bruto de prémios que Lloyd’s of London divulga separadamente (35,9 mil milhões), a IUA calcula que o valor global do mercado londrino (alargado ao Lloyd’s) ascendeu a cerca de 63,54 mil milhões de libras esterlinas (70,18 mil milhões de euros) em 2019.
A alteração nas regras dos designados “direitos de passaporte” significou a necessidade de reestruturação para muitas companhias (sediadas no Reino Unido) que decidiram manter operações nos restantes países da UE. Essas operações passam a ser processadas como atividade de sucursais europeias, muitas criadas recentemente. Em consequência do Brexit, os dados compilados pela IUA (ao contrário do que acontece com a estatística reportada para a Lloyd’s) deixam de considerar os prémios gerados pelas sucursais europeias como sendo subscritos pelas companhias da City of London (centro financeiro londrino).
Abordando as reestruturações que o longo processo de Brexit já exigiu, a IUA indica que o volume global de prémios das operações supervisionadas e geridas em Londres diminuiu 30%, de 8,88 mil milhões em 2018, para 6,2 mil milhões de libras esterlinas em 2019. Mas o declínio foi ainda mais acentuado quando se rastreia a geografia do negócio: a receita líquida gerada pelas operações na Europa (excluindo Reino Unido e Irlanda) caiu 60%, de 4,9 mil milhões, em 2018, para 1,95 mil milhões de libras no ano seguinte, detalha a fonte.
Para aferir melhor o impacto do progressivo desligamento da economia britânica face à UE, a IUA aprofundou a análise, examinando as contas individuais reportadas pelas associadas. O detalhe do exercício mostra que, como resultado direto do Brexit, o setor já perdeu 4508 milhões de libras esterlinas em prémios (cerca de 4,98 mil milhões de euros).
Por outro lado, o London Company Market Statistics Report adianta que o Lloyd’s, tradicionalmente considerado destino principal do seguro marítimo e de aviação, está a perder o domínio nestas duas categorias. O Company Market, composto pelos membros da IUA, realizou 4234 milhões de libras nos dois ramos, praticamente a igualar os 4302 milhões do Lloyd’s.
No seguro automóvel, o Company Market ultrapassou os 1,05 mil milhões de libras de prémios anuais reportados pelo Lloyd’s. Nos ramos propriedade e acidentes, o Lloyd’s ainda se mantém como destino privilegiado. Por fim, no conjunto do mercado londrino, propriedade e responsabilidade civil mantêm-se como os ramos de maior peso.
Nesta 10ª edição do relatório anual destaca-se ainda a inclusão, pela primeira vez, de novas linhas de negócio: risco político (261 milhões de libras); seguro de crédito internacional (243 milhões) e ciber risco (253 milhões).
OCDE adverte para incertezas no setor financeiro
As perspetivas futuras para a economia britânica são “excecionalmente incertas” tendo em conta os desafios decorrentes da crise da covid-19 e a próxima saída do mercado único, sublinha um relatório que acaba de ser divulgado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE)
O Estudo Económico sobre o Reino Unido da organização sublinha que a saída deste país do mercado da União Europeia (UE) gera novos desafios e faz com que as decisões tomadas agora sobre a gestão da pandemia do novo coronavírus e as futuras relações comerciais com Bruxelas terão “impacto duradouro” na trajetória económica dos próximos anos. O antigo ministro português Álvaro Pereira, diretor de estudos de países do departamento económico da OCDE, realçou que a Covid-19 foi “o maior ‘choque’ económico de que há registo nas últimas décadas”, mas referiu-se igualmente ao Brexit, expressão que traduz o processo de saída do Reino Unido da União Europeia (UE), tem concretização efetiva prevista para o final de 2020.
Embora as negociações se tenham concentrado em manter a relação comercial de bens com um baixo nível de atrito, o comércio de serviços é “crucial” para uma economia como a do Reino Unido, adverte o documento da OCDE, recomendando a manutenção de baixas barreiras ao comércio e ao investimento com a UE e outros países “em particular em termos de acesso ao mercado para setores de serviços como o financeiro”.
O organismo internacional adverte que as instituições financeiras sediadas no Reino Unido perderão os seus “direitos de passaporte” e só a manutenção de relações estreitas com os seus parceiros da UE ajudará a limitar os custos.
Negociações demoradas
Em vésperas de uma cimeira sobre o assunto, Michel Barnier, o responsável da União Europeia (UE) para as negociações com o Reino Unido, admite que os trabalhos para um acordo justo entre os dois blocos podem levar semanas.
Michel Barnier, que acabava de participar na reunião do Conselho de Assuntos Gerais da UE, salientou, através de um post na sua página do Twitter, que os 27 irão prosseguir os trabalhos para fechar um acordo comercial justo com o Reino Unido “nos próximos dias e semanas”.
O Reino Unido abandonou formalmente o bloco europeu, em 31 de janeiro, mas os negociadores ainda tentam fechar um acordo comercial que entre em vigor no final do período de transição (o último dia de 2020).
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