Adeus ao WhatsApp

A crescente integração com o Facebook torna a aplicação de conversa um perigo demasiado grande para merecer ser usada, especialmente porque existem boas alternativas.

Vou presumir que, como a imensa maioria dos portugueses, possui um smartphone e que usa o WhatsApp para comunicar. Agora faça você o favor de imaginar que todas as conversas, fotografias, vídeos e links que partilhou até hoje no WhatsApp estão a ser vistas por centenas de serviços comerciais em Portugal e no resto do mundo, que decidem que publicidade dirigir para o seu perfil.

Imagine também que esse “perfil publicitário” ficará agarrado às suas contas de Facebook e Instagram, arriscando violações de privacidade massivas caso ocorram – como inevitavelmente vão ocorrer – abusos e ataques. Agora, entenda que isto não um cenário de imaginação: é o que está a acontecer desde ontem em grande parte do mundo, devido à atualização dos termos de serviço do WhatsApp. Estes são os primeiros passos de uma integração definitiva com o Facebook (e também com o Instagram). A ideia de Mark Zuckerberg é recolher o máximo de dados privados e criar perfis unificados de informação para cada utilizador, o que passa necessariamente por reiterados abusos de privacidade.

A degradação do serviço começa aqui. Com esta partilha de dados vem a presença das marcas na rede de comunicações, que será rapidamente seguido pela publicidade e promoção aos produtos que melhor pagarem. Isto acarreta inevitavelmente a constante partilha de informação privada. Os algoritmos do Facebook analisam constantemente o comportamento dos seus utilizadores para fornecer aos anunciantes possibilidades de publicidade direcionada para possíveis consumidores dos seus produtos – e isso ocorre graças à devassa da informação privada que os utilizadores partilham com a expectativa de segurança.

Quando o Facebook comprou o WhatsApp, Mark Zuckerberg comprometeu-se a manter os produtos separados e a não procurar qualquer integração; mas essa foi apenas mais uma mentira de um dos maiores vigaristas corporativos do século XXI. Agora, está a concretizar-se o verdadeiro plano que ditou a compra da aplicação, que como de costume é tudo menos original. O empreendedor americano tem construído a sua muito bem sucedida carreira à conta da cópia e do roubo das melhores ideias da concorrência: copiou o MySpace, copiou o feed de notícias do Twitter, copiou o Snapchat e agora está a querer copiar a WeChat, a bem sucedida aplicação chinesa que integra comércio quotidiano e rede social. Para isso precisa de integrar completamente uma aplicação na outra, até que seja indistinto usar o Messenger ou o WhatsApp.

Não há qualquer benefício para o utilizador nesta partilha de informação. Antes pelo contrário. Só há problemas e riscos. É certo que na União Europeia o GDPR protege contra parte dos abusos a que utilizadores noutras partes do mundo estão sujeitos, mas não impede o uso malicioso e ilegal que as marcas de Zuckerberg têm repetidamente promovido contra os utilizadores. Países como a Alemanha e Brasil atrasaram mesmo esta atualização, mas a única coisa que poderá proteger os utilizadores é mesmo a não-utilização do produto. Aliás, continuar a usar qualquer produto do Facebook neste momento é simplesmente um risco demasiado grande. E uma aplicação tão simples como o WhatsApp simplesmente não justifica esse risco, até porque existem alternativas melhores e igualmente gratuitas.

A melhor de todas é o Signal, o produto mais fiável do mercado no que toca à privacidade – é gerido por uma entidade sem fins lucrativos, tendo até beneficiado do apoio de um dos fundadores do WhatsApp quando este deixou a empresa. Até o próprio Zuckerberg usa o Signal, como ficou já comprovado. A outra alternativa é o Telegram, uma rede de comunicações bastante semelhante com o WhatsApp que não tem uma encriptação tão completa mas que possui a imensa vantagem de não ter nem pretender vir a ter anunciantes a quem vender os dados dos utilizadores. Qualquer uma destas aplicações presta um serviço que é a partir de agora muito superior ao do WhatsApp. Todo o historial de roubos de informação do Facebook, bem como os seus constantes abusos de privacidade individual tornam o WhatsApp um produto que já é demasiado arriscado para continuar a merecer a confiança dos utilizadores. Já vai sendo altura de assumir o direito à privacidade.

Ler mais: April Falcon Doss trabalhou para a National Security Agency e é especialista em cibersegurança, o que lhe garante uma voz autorizada para explicar calmamente o que está em causa com a constante partilha de dados digitais. E é isso que faz este Cyber Privacy, saído no final do ano passado e que pode bem tirar o sono aos mais incautos. Mas é precisamente disso que necessitamos.

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